Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
15/08/2004 - 03h45

Vitória apertada é pesadelo venezuelano

Publicidade

FABIANO MAISONNAVE
enviado especial da Folha de S.Paulo a Caracas

Divididos pela intensa polarização política do país, os eleitores venezuelanos vão às urnas hoje para decidir se o presidente Hugo Chávez deve ou não permanecer no poder. Em meio a essa definição crucial, o ar venezuelano impregnado de boatos e do medo de uma nova onda de violência política, como as que, desde 2002, já provocaram dezenas de mortos.

Para a maioria dos analistas ouvidos pela Folha, a principal apreensão é com um resultado apertado no plebiscito, independentemente do vencedor.

"Uma vitória apertada é definitivamente o pior resultado possível. O lado que perder num resultado com pequena margem se sentirá enganado e poderá apelar para a violência", disse o cientista político americano David Myers, da Universidade Estadual da Pensilvânia e um dos mais respeitados especialistas em Venezuela.

Parte dessa ameaça é alimentada pela troca de acusações de planos de fraude eleitoral entre os lados até as vésperas do plebiscito.

Aliados de Chávez acusam a empresa de telefonia Cantv de planejar transmitir dados falsos das máquinas eleitorais eletrônicas para a central de apuração eleitoral. Já a oposição acusa o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) de ser controlado pelos chavistas e diz haver uma "operação passo lento" para atrapalhar o fluxo de eleitores, como a troca de domicílio eleitoral de milhares de oposicionistas sem aviso prévio.

Apesar das denúncias, no entanto, observadores internacionais, como a OEA (Organização dos Estados Americanos), dizem que o sistema é imune a fraudes e que o voto secreto está garantido.

No encerramento oficial da campanha, os dois lados cantaram vitória. Para Chávez, sua permanência "é inevitável". "Somos a maioria, com certeza", retrucou o governador Enrique Mendoza, líder da coalizão oposicionista.

O historiador Jorge Olavara disse ao "Financial Times" que "a paz do país está em jogo no fim de semana". Um resultado ambíguo levaria "a um terremoto político".

Até agora, pesquisas mostram que Chávez vencerá com alguma folga -os últimos levantamentos apontam vantagem de 11% a 25% dos votos válidos a seu favor.

Mas na avaliação da cientista política britânica Julia Buxton, da Universidade Kingston e autora de "O Fracasso da Reforma Política na Venezuela", nem uma vantagem maior garantirá a paz. "Uma grande vitória para um lado pode levá-lo a ser bastante repressivos com o outro. Já uma vitória apertada pode piorar a polarização", disse.

A única análise positiva é do americano Daniel Hellinger, da Universidade Webster, que esteve na semana passada em Caracas: "Foi uma grata surpresa. Mudei de idéia sobre o plebiscito. Ele abriu espaço para as forças mais moderadas de ambos os lados".

Rotina de violência

Embora o estilo populista de Chávez e as ações golpistas da oposição tenham contribuído para a polarização do país, a recente onda de violência política se iniciou em 1989, no governo de Carlos Andrés Perez (1989-93), quando uma revolta contra o aumento de preços públicos resultou em centenas de mortos ("Caracazo"). Em 1992, Chávez, então tenente-coronel do Exército, liderou um golpe fracassado e ficou dois anos preso, até ser solto pelo presidente Rafael Caldera (1993-8).

Em 1998, Chávez foi eleito presidente, interrompendo um ciclo de bipartidarismo conhecido como "democracia Puntofijo", iniciado há 40 anos, e impôs uma ampla agenda de reformas --entre elas, uma nova Constituição.

Em 11 de abril de 2002, Chávez enfrentou um golpe de Estado da oposição com apoio da mídia. Dois dias depois, apoiado por militares legalistas, voltou ao poder.

Em 2 dezembro de 2002, a oposição convocou uma greve geral que durou 63 dias e parou a produção de petróleo, maior fonte de renda venezuelana --dono da quinta reserva mundial, o país fornece 15% do óleo usado nos EUA. Como resultado, a economia sofreu uma retração recorde de 18% entre 2002 e 2003.

A partir de meados do ano passado, no entanto, a retomada da produção petroleira e a escalada de preços do produto impulsionaram uma rápida recuperação. Boa parte desse dinheiro vem financiando diversos programas sociais chavistas. O presidente também tem aliados em todos os postos-chave da PDVSA, a megaestatal petroleira. Para analistas, é esse dinheiro que financiará a possível vitória chavista hoje.

Grupo de Amigos

Em comunicado distribuído ontem pelo Itamaraty, o Grupo de Amigos da Venezuela (Brasil, Chile, Espanha, EUA, México e Portugal) diz que o plebiscito é uma "etapa fundamental para a solução desse processo político" e volta a apoiar "o importante papel da OEA e do Centro Carter como observadores do processo".

O dia de ontem foi marcado por encontros entre o CNE, os observadores internacionais, governo e oposição. De manhã, o ex-presidente americano Jimmy Carter e o secretário-geral da OEA, César Gaviria, que chefiam as principais delegações de observadores, se reuniram com Chávez.

Ontem à tarde, os dois concederam entrevista coletiva em que afirmaram que o plebiscito será tranquilo. "Será mais satisfatório do que foram as eleições na Flórida, em 2000", disse Carter, referindo-se à eleição presidencial americana que elegeu George W. Bush.

Leia mais
  • Fiasco neoliberal produziu Chávez, diz Hobsbawm
  • Para americano, "Chávez não é ditador, ainda"
  • Empresas prevêem "violência moderada" em eleição venezuelana

    Especial
  • Saiba mais sobre o referendo na Venezuela
  • Arquivo: veja o que já foi publicado sobre Hugo Chávez

  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página