Publicidade
Publicidade
03/10/2005
-
07h12
DANIELA LORETO
da Folha Online
A reunificação alemã significou um extraordinário passo político, mas causou graves conseqüências econômicas, segundo o especialista política alemã Christian Lohbauer, membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (Gacint), da USP.
"A negociação da reunificação alemã, do ponto de vista político, é um dos maiores fenômenos do século 20", afirma Lohbauer. "Se em outubro de 1989 você imaginasse que o Muro de Berlim iria cair, e que a Alemanha seria reunificada em menos de um ano, ninguém acreditaria, ainda mais que seria uma unificação sem conflitos".
No entanto, de acordo com o especialista, a medida trouxe prejuízos para a economia. "A reunificação teve um custo que a Alemanha pagou e ainda está pagando. Ela não era tão simples quanto se imaginava mas, ainda assim, foi um grande sucesso".
Ele diz ainda que atualmente Berlim é a capital da Europa e a Alemanha é um dos maiores investidores no Leste Europeu, e que só isso já representa um grande sucesso.
Mudanças
Para Lohbauer, a reunificação foi um evento sem precedentes na história. Ele afirma que a humanidade não conhecia uma unificação de duas sociedades na qual uma delas teve 40 anos de comunismo duro.
O especialista diz que uma parte da população ainda não incorporou o princípio da produtividade, da tecnologia e de todos os fatores que fazem com que a Alemanha seja um país tão avançado.
"Há uma parte do país que sente saudades daquele Estado social do passado. É daí que vem os 8% de vitória do comunismo nas eleições [legislativas, ocorridas no último dia 18]."
Segundo Lohbauer, a população da ex-Alemanha Oriental acima de 35 anos --que forma mais da metade da população do país-- ainda é 40% menos produtiva que a ocidental.
Custos
A reunificação significou para a Alemanha Ocidental um aumento de um terço de território, um quarto de população e um sexto de PIB (Produto Interno Bruto), segundo Lohbauer.
O professor explica que o processo implicou em custos altos, que não foram totalmente previstos.
"Logo após a reunificação, o governo de [Helmut] Kohl (1982-1998, democrata-cristão) criou o imposto da solidariedade, que arrecadou US$ 1 trilhão em uma década, valor que foi revertido para a transformação da Alemanha Oriental em Ocidental", diz.
"Mesmo assim, os custos eram muito maiores. As empresas da Alemanha Oriental não eram produtivas e havia um estrago ambiental que os alemães orientais haviam camuflado. Adequar as empresas aos padrões ambientais da Alemanha Ocidental também causou gastos muito maiores do que se imaginava", acrescenta.
Para o especialista, houve uma mistura de erros de cálculo e de custos da reconstrução da Alemanha Oriental que não tinham sido previstos.
Reformas
Lohbauer diz que a reunificação gerou a necessidade de implementação de amplas reformas na Alemanha --que ainda não foram realizadas.
Ele explica que, até 1990, a Alemanha era um país totalmente viável e riquíssimo, como ainda é, mas que o choque da unificação exigiu mudanças que nunca foram realizadas porque a sociedade não permitiu.
"Existe uma tensão na sociedade alemã a respeito de como fazer estas reformas com tantos direitos e benefícios que foram adquiridos durante todos estes anos, e que a unificação transformou em benefícios inviáveis."
Na opinião do professor, as eleições do último dia 18 apontam o quadro de paralisação vivido atualmente pela Alemanha. "As eleições mostram a paralisação real, está impossível se configurar um governo".
De acordo com Lohbauer, é bastante provável que haja novas eleições em 2006. "Se em 20 dias um governo não for fechado, Schröder [Gerhard, atual chanceler] terá de montar um governo de minoria --que seriam os democratas cristãos com os liberais, os verdes com os sociais democratas-- ou convocar novas eleições. Acredito que ele convocará novas eleições."
Para ele, o desemprego é uma das conseqüências da paralisação do Estado alemão. "O Estado social é muito farto, o trabalhador recebe seguro-desemprego durante um ano e a ajuda na área de saúde também é bastante vasta. Toda a educação alemã é pública. Esses benefícios representam custos para a sociedade".
Lohbauer alerta que a situação alemã pode trazer conseqüências para a Europa. Para ele, ou a Alemanha realiza uma reforma que implicará em cortes de benefícios adquiridos historicamente ou ela tenta manter esses benefícios impagáveis, o que irá paralisar não só a Alemanha como também o resto da Europa.'
Propostas
De acordo com o especialista, houve tentativas de reforma que não foram bem-sucedidas. "Durante os governos Kohl, foram propostas reformas que ainda precisam ser feitas, como as do sistema previdenciário, tributário e também administrativas e patrimoniais", diz.
Ele explica que as reformas foram propostas porque Kohl percebeu que a Alemanha não daria conta dos custos e que o Estado teria de ser reformado. "Quem bloqueava as reformas propostas eram os social-democratas [do SPD, partido de Schröder], que tinham maioria no Senado".
Segundo o professor, em 1998, ao se tornar chanceler, Schröder não propôs mudanças porque sua campanha não previa reformas radicais no sistema social. "Ele 'empurrou com a barriga' até onde pôde, e a Alemanha começou a parar de crescer."
"Quando viram que teriam mesmo que fazer reformas, os social-democratas fizeram propostas que não foram aprovadas por questões políticas, porque foram bloqueadas pelos democrata-cristãos", afirma.
Soberania
Segundo Louhbauer, em relação à política externa, a reunificação também trouxe independência e soberania para o Estado alemão.
"Em 1990, a Alemanha se tornou um país soberano, o que não era antes da reunificação. O país se tornou livre, autônomo e com uma política externa, em tese, independente. Claro que a Alemanha é muito vinculada à União Européia (UE), mas ganhou o status de país soberano."
O professor afirma que, após a conquista da soberania, o país pôde passar a expressar pontos de vista divergentes nas relações com outros países.
"Na questão da Guerra do Iraque, por exemplo, Alemanha, França e Rússia se colocaram contra os Estados Unidos, algo impensável há dez anos, quanto mais há 15 anos. A reunificação trouxe essa soberania, que havia sido perdida com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945)."
Leia mais
Brasileira diz que queda do muro era algo "impossível" aos alemães
Reunificação é um dos maiores fenômenos do século 20, diz professor
Especial
Leia cobertura sobre os 15 anos da reunificação alemã
Veja galeria de imagens sobre a reunificação alemã
Leia o que já foi publicado sobre o Muro de Berlim
Reunificação é um dos maiores fenômenos do século 20, diz professor
Publicidade
da Folha Online
A reunificação alemã significou um extraordinário passo político, mas causou graves conseqüências econômicas, segundo o especialista política alemã Christian Lohbauer, membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (Gacint), da USP.
"A negociação da reunificação alemã, do ponto de vista político, é um dos maiores fenômenos do século 20", afirma Lohbauer. "Se em outubro de 1989 você imaginasse que o Muro de Berlim iria cair, e que a Alemanha seria reunificada em menos de um ano, ninguém acreditaria, ainda mais que seria uma unificação sem conflitos".
No entanto, de acordo com o especialista, a medida trouxe prejuízos para a economia. "A reunificação teve um custo que a Alemanha pagou e ainda está pagando. Ela não era tão simples quanto se imaginava mas, ainda assim, foi um grande sucesso".
Ele diz ainda que atualmente Berlim é a capital da Europa e a Alemanha é um dos maiores investidores no Leste Europeu, e que só isso já representa um grande sucesso.
Mudanças
Para Lohbauer, a reunificação foi um evento sem precedentes na história. Ele afirma que a humanidade não conhecia uma unificação de duas sociedades na qual uma delas teve 40 anos de comunismo duro.
O especialista diz que uma parte da população ainda não incorporou o princípio da produtividade, da tecnologia e de todos os fatores que fazem com que a Alemanha seja um país tão avançado.
"Há uma parte do país que sente saudades daquele Estado social do passado. É daí que vem os 8% de vitória do comunismo nas eleições [legislativas, ocorridas no último dia 18]."
Segundo Lohbauer, a população da ex-Alemanha Oriental acima de 35 anos --que forma mais da metade da população do país-- ainda é 40% menos produtiva que a ocidental.
Custos
A reunificação significou para a Alemanha Ocidental um aumento de um terço de território, um quarto de população e um sexto de PIB (Produto Interno Bruto), segundo Lohbauer.
O professor explica que o processo implicou em custos altos, que não foram totalmente previstos.
"Logo após a reunificação, o governo de [Helmut] Kohl (1982-1998, democrata-cristão) criou o imposto da solidariedade, que arrecadou US$ 1 trilhão em uma década, valor que foi revertido para a transformação da Alemanha Oriental em Ocidental", diz.
"Mesmo assim, os custos eram muito maiores. As empresas da Alemanha Oriental não eram produtivas e havia um estrago ambiental que os alemães orientais haviam camuflado. Adequar as empresas aos padrões ambientais da Alemanha Ocidental também causou gastos muito maiores do que se imaginava", acrescenta.
Para o especialista, houve uma mistura de erros de cálculo e de custos da reconstrução da Alemanha Oriental que não tinham sido previstos.
Reformas
Lohbauer diz que a reunificação gerou a necessidade de implementação de amplas reformas na Alemanha --que ainda não foram realizadas.
Ele explica que, até 1990, a Alemanha era um país totalmente viável e riquíssimo, como ainda é, mas que o choque da unificação exigiu mudanças que nunca foram realizadas porque a sociedade não permitiu.
"Existe uma tensão na sociedade alemã a respeito de como fazer estas reformas com tantos direitos e benefícios que foram adquiridos durante todos estes anos, e que a unificação transformou em benefícios inviáveis."
Na opinião do professor, as eleições do último dia 18 apontam o quadro de paralisação vivido atualmente pela Alemanha. "As eleições mostram a paralisação real, está impossível se configurar um governo".
De acordo com Lohbauer, é bastante provável que haja novas eleições em 2006. "Se em 20 dias um governo não for fechado, Schröder [Gerhard, atual chanceler] terá de montar um governo de minoria --que seriam os democratas cristãos com os liberais, os verdes com os sociais democratas-- ou convocar novas eleições. Acredito que ele convocará novas eleições."
Para ele, o desemprego é uma das conseqüências da paralisação do Estado alemão. "O Estado social é muito farto, o trabalhador recebe seguro-desemprego durante um ano e a ajuda na área de saúde também é bastante vasta. Toda a educação alemã é pública. Esses benefícios representam custos para a sociedade".
Lohbauer alerta que a situação alemã pode trazer conseqüências para a Europa. Para ele, ou a Alemanha realiza uma reforma que implicará em cortes de benefícios adquiridos historicamente ou ela tenta manter esses benefícios impagáveis, o que irá paralisar não só a Alemanha como também o resto da Europa.'
Propostas
De acordo com o especialista, houve tentativas de reforma que não foram bem-sucedidas. "Durante os governos Kohl, foram propostas reformas que ainda precisam ser feitas, como as do sistema previdenciário, tributário e também administrativas e patrimoniais", diz.
Ele explica que as reformas foram propostas porque Kohl percebeu que a Alemanha não daria conta dos custos e que o Estado teria de ser reformado. "Quem bloqueava as reformas propostas eram os social-democratas [do SPD, partido de Schröder], que tinham maioria no Senado".
Segundo o professor, em 1998, ao se tornar chanceler, Schröder não propôs mudanças porque sua campanha não previa reformas radicais no sistema social. "Ele 'empurrou com a barriga' até onde pôde, e a Alemanha começou a parar de crescer."
"Quando viram que teriam mesmo que fazer reformas, os social-democratas fizeram propostas que não foram aprovadas por questões políticas, porque foram bloqueadas pelos democrata-cristãos", afirma.
Soberania
Segundo Louhbauer, em relação à política externa, a reunificação também trouxe independência e soberania para o Estado alemão.
"Em 1990, a Alemanha se tornou um país soberano, o que não era antes da reunificação. O país se tornou livre, autônomo e com uma política externa, em tese, independente. Claro que a Alemanha é muito vinculada à União Européia (UE), mas ganhou o status de país soberano."
O professor afirma que, após a conquista da soberania, o país pôde passar a expressar pontos de vista divergentes nas relações com outros países.
"Na questão da Guerra do Iraque, por exemplo, Alemanha, França e Rússia se colocaram contra os Estados Unidos, algo impensável há dez anos, quanto mais há 15 anos. A reunificação trouxe essa soberania, que havia sido perdida com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945)."
Leia mais
Especial
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Alvo de piadas, Barron Trump se adapta à vida de filho do presidente
- Facções terroristas recrutam jovens em campos de refugiados
- Trabalhadores impulsionam oposição do setor de tecnologia a Donald Trump
- Atentado contra Suprema Corte do Afeganistão mata 19 e fere 41
- Regime sírio enforcou até 13 mil oponentes em prisão, diz ONG
+ Comentadas
- Parlamento de Israel regulariza assentamentos ilegais na Cisjordânia
- Após difamação por foto com Merkel, refugiado sírio processa Facebook
+ EnviadasÍndice