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03/10/2005 - 10h14

Brasileira diz que queda do muro era algo "impossível" aos alemães

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EMILIA BERTOLLI
da Folha Online

A brasileira Simone Pimentel Lechthoff, 40, presenciou um momento da história da Alemanha que marcou não somente o país, como todo o mundo: em 9 de novembro de 1989, o Muro de Berlim --símbolo máximo da Guerra Fria, que dividiu o território alemão--, tinha sido derrubado pelos próprios berlinenses. Mas o que aconteceria nos anos após a unificação foi, para ela, um processo de "desconstrução".

Arquivo pessoal
Simone Pimentel Lechthoff e sua filha Leila
"A cidade que era de papel [Berlim Oriental] invadiu a cidade moderna cosmopolita [Berlim Ocidental]", disse a brasileira, em entrevista à Folha Online.

Lechthoff morou pela primeira vez na Alemanha entre março de 1989 e janeiro de 1992 --período em que viveu em Berlim Ocidental--, retornou para o Brasil, por onde ficou dez anos, até que novamente partiu para o país europeu, em 2002. Atualmente está em Bielefeld, onde dá aulas de português e é cantora de um grupo de música popular brasileira.

Quando o muro caiu, a brasileira estava trabalhando em um metrô de Berlim Ocidental, onde tocava violão e cantava durante todo o dia com a amiga brasileira Teresa Cavagnac, que mora atualmente em Brasília. "Todo mundo comentava [a queda do muro]. Quando cheguei em casa, naquele dia, falei ao Peter [Lechthoff, seu marido] que isso [o muro] um dia ia cair", afirmou.

"Como todos os alemães, Peter achou que isso nunca iria acontecer", conta ela, ao lembrar-se de como o marido, que é alemão, encarava a situação política do país, que havia sido dividido.

Desconstrução

Entre o final de 1989 e 1990 --já depois da queda do muro--, Lechthoff conta que a vida na Alemanha Ocidental era "extremamente difícil". A abertura política de vários países do leste europeu e a chegada dos alemães orientais ao lado ocidental, fez com que Berlim se "descontruísse".

"Berlim Ocidental, na época, era um sonho de consumo para os europeus dos países do Leste da Europa e para os moradores de Berlim Oriental. Era muito difícil encontrar um apartamento na cidade: não havia imóveis para alugar e os que estavam disponíveis, ficavam vagos por apenas um, dois meses, porque pertenciam a pessoas que iam viajar, e alugavam suas casas por um curto período de tempo", diz Lechthoff.

A cidade, na época, abrigava um grande número de pessoas, segundo a brasileira, e já não havia empregos para todos. Ela fora proibida de tocar no metrô, porque muitos imigrantes de países do leste iam para as estações pedir esmolas e a polícia acabou proibindo que os músicos continuassem a trabalhar no metrô.

Logo depois da queda do muro, lembra a brasileira, os alemães orientais iam para o lado ocidental da cidade comprar refrigerantes e outros bens de consumo que não estavam disponíveis em Berlim Oriental. "Todos queriam ter antenas de TV em casa."

Mas, depois da reunificação, "tudo ficou lindo e moderno", afirma Lechthoff. Os bairros que eram considerados os mais pobres de Berlim Oriental são, hoje, áreas nobres da cidade, conta ela.

Revista

Em um dos episódios mais marcantes para a brasileira, ocorrido quando ainda havia a separação entre as duas cidades, ela foi revistada --e teve até mesmo que se despir-- em um posto de controle de Berlim Oriental, antes de voltar para o lado ocidental da cidade.

A revista rigorosa era prática comum dos soldados e policiais que vigiavam o muro. Todas as vezes que um morador da Alemanha Ocidental entrava na Alemanha Oriental, tinha que passar pelos postos de controle --que estavam em toda a fronteira entre os dois países--, inclusive em Berlim, onde o controle era muito mais extensivo.

Durante sua primeira estadia na Alemanha, Lechthoff visitou, em julho de 1989, a "Ost-Berlin" (Berlim Oriental, em alemão) para comprar uma câmera fotográfica, muito mais barata no lado socialista da cidade. "Atravessei com uma bolsinha cheia de moedas de marcos alemães orientais, que os passageiros do metrô às vezes nos davam como gorjeta. Dentro do sapato, eu levava comigo mais 2.000 marcos", lembra.

A brasileira teve que esconder a alta quantia de dinheiro porque as autoridades da Alemanha Oriental proibiam que os turistas comprassem marcos orientais no Ocidente. A venda da moeda era feita apenas na casa de câmbio oficial do país.

Ao mostrar as moedas para a polícia fronteiriça, conseguiu passar pelo controle e entrar em Berlim Oriental. No mesmo dia, ao retornar para o lado ocidental, a brasileira teve que, novamente, passar pela revista. "Eu tinha comprado a câmera fotográfica e estava carregando em uma bolsa que levava no ombro esquerdo, bem presa ao corpo. Mas tinha tantas coisas que o policial pediu para olhar o pacote", conta.

Lechthoff foi orientada, então, a ir com uma policial a uma sala separada do posto fronteiriço. Lá, ela teve que se despir totalmente e ajoelhar-se no chão para que a agente visse que ela não carregava nada entre as pernas. "Foi constrangedor. Voltei para casa sem máquina e arrasada pela humilhação", disse.

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