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07/05/2006 - 10h00

Terror se fragmenta porque "todos" querem ser Bin Laden, diz pesquisador

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DANIELA LORETO
da Folha Online

O líder da rede terrorista Al Qaeda, Osama bin Laden, ainda assusta, mas seu poder se fragmentou e agora é disputado por várias lideranças do terrorismo global. Esses "sublíderes" se apresentam como braços da Al Qaeda, mas, na verdade, pleiteiam chefias independentes e pensam ser o próprio Bin Laden. A opinião é de Ely Karmon, 60, pesquisador-chefe do Instituto de Contraterrorismo de Herzliya, em Israel.

"Se analisarmos o mais recente vídeo de Abu Musab al Zarqawi [representante da Al Qaeda no Iraque], veremos que, embora ele se apresente como 'soldado' de Bin Laden, comporta-se como se fosse o próprio Bin Laden".

Em entrevista à Folha online, por telefone, de Israel, o professor explicou que após as guerras no Afeganistão e no Iraque, a Al Qaeda está cada vez mais fraca, que o grupo central da verdadeira Al Qaeda, que se reunia em torno de Bin Laden, foi em grande parte destruído, e que tanto Bin Laden quanto Ayman al Zawahiri [considerado seu "braço direito"] se tornaram "líderes virtuais".

De acordo com o professor, muitos membros das novas lideranças da Al Qaeda no Iraque --especialmente os que se reúnem em torno de Al Zarqawi-- e na Arábia Saudita não aceitam totalmente Bin Laden como o líder da rede.

"Ele [Al Zarqawi] tenta provar que é o verdadeiro líder no campo de batalha. Bin Laden, por sua vez, aparece nos vídeos apenas como uma fotografia. O fato de Bin Laden ter ficado um ano sem divulgar mensagens e um ano e meio sem aparecer em vídeos também não o favorece. Isto é um problema para ele", explica.

Disputas

A imagem de Bin Laden também é afetada por divergências entre líderes da rede no Iraque devido às ações mal planejadas, como ataques de Al Zarqawi no Iraque e na Arábia Saudita que atingem muitos civis muçulmanos, e não apenas turistas, solapando a legitimidade da liderança responsável por essas ações.

"Quem sofre no Egito, no Marrocos, na Tunísia e na Indonésia é a população, que vive do turismo. Há uma reação de parte dessa população [que também é muçulmana], que acha que a Al Qaeda age errado em realizar esses tipos de ataque", diz.

Para o professor, as diferenças entre facções religiosas também têm seu papel na divisão de poderes. Um exemplo disso é a pregação antixiita feita por Al Zarqawi, que os trata como infiéis, apóstatas, e diz que devem ser mortos. "Isto tudo [a discordância entre sunitas e xiitas] não parecem ser sinais de força e unidade, e sim de fraqueza e ruptura dentro do própria organização", diz Karmon.

Oportunidade

Mas se a guerra contra o Afeganistão levada a cabo pelos Estados Unidos ajudou a minar o poder de Bin Laden, por outro lado promoveu o retorno de ações terroristas ao Oriente Médio --antes concentradas no Paquistão e na Ásia Central.

"Para ele, esta foi uma mudança importante porque, entre 1991 e 1996 --quando Bin Laden viveu no Sudão--, o centro das atividades terroristas estava na Ásia Central. As ações estavam muito longe do Oriente Médio, e todos os líderes da Al Qaeda são de origem árabe. Foi uma oportunidade para voltar á região", disse Karmon.

De acordo com o professor, de 2003 até o final de 2004, o Iraque se transformou na principal frente de batalha para as organizações radicais islâmicas. No entanto, do final de 2004 para cá, houve mudanças, e se estabeleceram três frentes principais de terror: Iraque, Arábia Saudita --que também implica em ataque a países como Kuait e Bahrein-- e o Egito.

"É bom lembrar que o Egito foi o país onde o radicalismo islâmico se desenvolveu, nas décadas de 70, 80 e 90, e que Al Zawahiri também é egípcio", diz.

"Terrorismo global"

Para Karmon, uma das principais diferenças entre as ações de grupos terroristas nas décadas de 70 e 80 e das organizações de hoje foi o surgimento do "terrorismo global". Ele explica que nenhuma organização agia muito fora de seu próprio país, a não ser os palestinos, nas décadas de 70 e 80, e os radicais islâmicos, nas décadas de 80 e 90.

"Se você analisar o terrorismo na América Latina, nas décadas de 60 e 70, em países com Argentina, Brasil e Uruguai, ou a ação do Sendero Luminoso no Peru, nos anos 90, ou até mesmo das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, principal guerrilha colombiana), esses grupos nunca realizaram ataques na Europa ou nos Estados Unidos."

O estudioso diz ainda que o mesmo acontece se forem analisadas as ações do IRA (Exército Republicano Irlandês, guerrilha católica), ou do ETA (Euskadi Ta Askatasuna, ou Pátria Basca e Liberdade --grupo terrorista e separatista que luta pela independência da região basca), na Espanha. "Eles nunca se tornaram organizações terroristas de nível internacional, lutam em seus próprios territórios. Eles poderiam matar americanos ou outros estrangeiros em seus próprios territórios, mas não agiam diretamente nos Estados Unidos ou em outros países."

"Infiéis"

Embora o surgimento de organizações globais como a Al Qaeda --formada por muçulmanos oriundos de diferentes países do norte da África, como Tunísia, Argélia, Marrocos e Malásia, e da Ásia Central-- seja um fenômeno novo, seus ideais são antigos.

De acordo com Karmon, tal ideologia existe antes mesmo do surgimento de Bin Laden, e defende a formação de uma só nação muçulmana, que englobe todos os países islâmicos, para que todos os muçulmanos lutem, como nos velhos tempos, contra o 'inimigo', os 'infiéis', o imperialismo, os valores ocidentais e os EUA.

"Esses ideais surgiram na década de 80, se desenvolveram nos anos 90 e tiveram seu auge em 2001, após os ataques de 11 de Setembro contra o World Trade Center", acrescenta.

Outra "tendência" que teve início nas décadas de 80 e 90, e que ganhou força em 2000, na opinião do estudioso, foi a proliferação de comunidades muçulmanas fora dos países islâmicos, o que gerou grande apoio aos ataques de 11 de Setembro de grupos terroristas sediados na Alemanha e na Espanha.

Ataques

Embora não fossem tradicionais nem globalizados, grupos terroristas já tentavam agir na Europa mesmo antes dos ataques de 11 de Setembro. Como exemplo, Karmon cita o ano de 1999, quando houve a tentativa de destruir a Catedral de Estrasburgo, na França, e, em seguida, embaixadas dos EUA em Roma e em Paris. "Em março de 2004, vieram os ataques em Madri, e, em julho de 2005, os atentados em Londres", enumera.

Segundo o especialista, apesar das freqüentes ameaças da Al Qaeda de realizar novos ataques contra os EUA, a rede não teve sucesso até hoje, o que leva a pensar que eles têm o desejo de realizar novos ataques, não têm capacidade para tal.

Apesar disso, Karmon pondera que novos ataques nos EUA e na Europa são "possíveis", já que se tratam de países democráticos e com grandes fronteiras. "No ano passado, terroristas tentaram entrar nos EUA pela fronteira com o México, vindo de países como a Guatemala. Milhares de pessoas imigram ilegalmente por essa fronteira, e terroristas também podem se infiltrar."

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