Colunas
Clovis Rossi
30/09/2009

O Irã, o Brasil e o tempo da persuasão

Reúne-se amanhã, quinta-feira, um dos poucos Gês de que o Brasil não participa. É o G6, formado pelos cinco países com poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas (Estados Unidos, Reino Unido, França, China e Rússia) e pela Alemanha.

Reúnem-se com o Irã, para discutir seu programa nuclear e eventuais sanções adicionais, no caso de não ficarem satisfeitos com as explicações que o governo iraniano apresentará.

Desnecessário dizer que o encontro é, sempre, carregado de tensão. Mas, nos últimos dias, a tensão aumentou com a descoberta de instalações nucleares mantidas ocultas pelo regime iraniano até recentemente, com o lançamento de mísseis com alcance para chegar a Israel e a alguns países da Europa e, por fim, com a notícia divulgada hoje pelo "Financial Times", do seguinte teor: "Os serviços britânicos de inteligência dizem que o Irã tem secretamente desenhado uma ogiva nuclear desde o fim de 2004 ou começo de 2005, uma avaliação que sugere que Teerã embarcou nos passos finais rumo à aquisição de armas nucleares".

Volto agora ao Brasil. Embora não faça parte do G6, o tema Irã não é estranho ao Brasil. Pela ordem cronológica:

1 - Na cúpula do G8 ampliado em L'Aquila, em julho, o presidente Barack Obama sugeriu a seu colega Luiz Inácio Lula da Silva que use o peso que teria (na visão dos Estados Unidos) junto ao Irã, dadas as relações comerciais bilaterais, para pregar a favor do uso exclusivamente pacífico da energia nuclear.

Obama, pelo relato que me fez seu porta-voz, Robert Gibbs na ocasião, teria lembrado (ou sido lembrado por Lula) de que o Brasil está constitucionalmente impedido de buscar o caminho militar para a energia nuclear.

2 - Agora, em Nova York, à margem da Assembléia-Geral da ONU, Lula encontrou-se com Mahmoud Ahmedinejad e o recado que deu foi exatamente aquele conversado com Obama na Itália, segundo o relato de Marco Aurélio Garcia, assessor diplomático do presidente brasileiro.

Marco Aurélio jura que o recado não foi apenas porque Obama pediu, mas porque é a posição tradicional do Brasil.

Missão cumprida, então? Mais ou menos. O governo brasileiro deu-se por satisfeito com as explicações de Ahmedinejad e suas juras de que só visa o uso pacífico da energia nuclear.

Lula diz que não tem razões para duvidar, mas será confrontado com uma escolha entre o previsível endurecimento do G6, o que, por extensão, significaria desconfiança em relação ao Irã, e a sua própria crença na palavra do colega iraniano.

A tese brasileira é a de que é melhor a persuasão do que a sanção para manter o Irã longe das armas nucleares. É uma escolha tão legítima quando a outra, o caminho das sanções. Desde que o governo brasileiro tenha em conta que há um limite de tempo para o exercício da persuasão. Se servir apenas para dar tempo ao desenvolvimento de armas nucleares, seria de uma ingenuidade eliminatória para quem pretende jogar em todos os torneios de primeira divisão, G6 incluído em algum momento futuro.

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às quintas e domingos na página 2 da Folha e, aos sábados, no caderno Mundo. É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo e "O Que é Jornalismo".

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