"Cruel e incompreensível"
Em tragédias das dimensões que está alcançando a do Haiti, parece dispensável um comentário. Talvez valha apenas repetir o que disse o presidente Barack Obama: "Para um país e um povo a que não são estranhas as dificuldades e o sofrimento, esta tragédia parece especialmente cruel e incompreensível".
Talvez valha igualmente repetir o que disse o eterno cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, sobre a morte de sua irmã, Zilda, criadora e coordenadora internacional da Pastoral da Criança. Zilda "morreu de uma maneira muito bonita, na causa em que sempre acreditou".
Mais que isso, talvez valha também constatar como é lenta a ação da comunidade internacional na ajuda aos países mais pobres do mundo, como o Haiti.
É justo lembrar que o chanceler Celso Amorim insistiu e insistiu em que houvesse um aumento na quantidade de recursos da comunidade internacional para permitir uma ação mais eficaz da missão das Nações Unidas no Haiti, liderada pelo Brasil. Nunca foi atendido.
Agora que a tragédia ocorreu, todo o mundo, literalmente, corre atrás.
É óbvio que o terremoto não teria sido evitado com mais envolvimento da comunidade internacional. Mas, quem sabe, teria sido possível reconstruir algo de um poder público devastado por décadas de crises e de desgoverno, com a inevitável consequência direta sobre a infraestrutura em geral. Uma infraestrutura um pouquinho menos precária tornaria um pouquinho mais eficientes os trabalhos pós-desastre.
Torço, sem grandes esperanças, para que, passada a emergência, o mundo dedique à recuperação do Haiti a atenção que lhe negou sempre, como faz habitualmente com os miseráveis do planeta.
Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às quintas e domingos na página 2 da Folha e, aos sábados, no caderno Mundo. É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo e "O Que é Jornalismo".
