Pensata

Eliane Cantanhêde

09/07/2008

Onde passa boi, passa boiada

Quem ler a entrevista que o assessor e ideólogo do governo colombiano José Obdulio Gaviria me deu (publicada terça, 8/7, na Folha e na Folha Online), não tem dúvidas: apesar de negativas daqui e dali, o presidente Alvaro Uribe Está com tudo pronto para mudar a Constituição e disputar o seu terceiro mandato.

Uribe já tinha mais de 80% de popularidade. Agora o céu é o limite, depois da operação espetacular de resgate da ex-candidata à Presidência Ingrid Betancourt, três norte-americanos e 11 soldados e policiais colombianos. Pelas últimas pesquisas, ele é considerado imbatível, com 72% de intenções de voto numa e 79% em outra.

Bem, mudar a Constituição não parece nenhum grande problema para ele. Na própria terça, lá estava Uribe reunido com o presidente da Corte Suprema de Justiça, num campo neutro: nada mais nada menos que o Arcebispado de Bogotá. Não nos esqueçamos de que, além de católico ferrenho, ele é ligado à Opus Dei, a linha mais, digamos, polêmica da Igreja.

Amaciar a Justiça é o primeiro passo para mudar a Constituição, porque a Corte vem tentando julgar se o processo que resultou na primeira reeleição de Uribe, em 2006, foi legal e direito. Amaciada a Corte, é investir no Parlamento, onde os uribistas, evidentemente, são maioria. Dali às urnas!

Bem, resistências haverá. A própria Ingrid Betancourt já anda botando as asinhas de fora para disputar a Presidência em 2010, assim como o ministro da Defesa, Juan Manuel Santos. Mas que fiquem espertos, porque a força de Uribe é avassaladora. Se for candidato, ganha. Se não for, faz o sucessor. Brigar com ele, mesmo com muito boas razões, pode ser uma fria.

O mais curioso é que quem mais se estapeou pelos mandatos sucessivos foi Hugo Chávez, aqui ao lado, na Venezuela, mas sem sucesso. E é justamente seu adversário mais visceral, e de direita, quem está mais perto de chegar lá, com apoio dos EUA, mão pesada no combate à violência e um governo excessivamente militarizado. Ou seja: as Farc estão sendo o maior cabo eleitoral do seu inimigo Uribe.

Isso tudo são impressões aqui de Bogotá, onde passo uma semana. Mas o que mais interessa é que sempre se diz que "a Colômbia está isolada", mas todos os olhares estão focados aqui e o que se discute é o efeito Uribe no continente. Se ele abrir a porteira do terceiro mandato, a aposta é que vá um por um atrás dele. É a velha história: onde passa boi, passa boiada. Não é, PT?

*

PS - A prisão de Daniel Dantas, Celso Pitta e Naji Nahas é também espetacular, algo para chamar a atenção do mundo inteiro. Mas a pergunta que não quer calar é: até quando?!

Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.

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