Pensata

Fernando Canzian

28/12/2007

O Brasil que não vai para frente

Aproveito minha folga de fim de ano para resolver pepinos acumulados. O pior deles, e que (tinha certeza) me causaria a maior perda de tempo, é ir ao Fórum João Mendes, no centro de São Paulo.

Trata-se de um contato com o serviço público, com a Justiça. Documentos expedidos por gente dessa área --um aborrecimento.

Em casa, procuro na internet, meio eficiente e que já está entre nós há mais de uma década, os horários de atendimento para o meu caso --a retirada de um simples documento envolvendo questões imobiliárias.

É impossível encontrar o horário específico para meu caso ou um site geral da Justiça que detalhe esses procedimentos. Usando bom senso, vou ao fórum dentro do horário comercial, as 11h da manhã.

"O sr. é advogado?, pergunta um funcionário.

"Não".

"Então, o sr. só poderá entrar no fórum depois das 12h30".

"Ok", digo, "mas onde está escrito isso?"

Não há nenhuma informação visível, dentro ou fora do saguão do fórum sobre esse horário de atendimento. Funcionários vestidos com um colete amarelo com os dizeres "Posso ajudar?" também não têm certeza de onde vem a informação sobre o horário. Não poderiam ao menos colocar um cartaz por ali avisando? "Não, isso é coisa lá de cima", diz um dos "Posso ajudar".

Como tenho uma hora e meia pela frente, digo que gostaria muito, apresentando agora minha credencial de jornalista, de ver o documento em que esses horários constam. Espero mais de meia hora de pé no saguão e um dos "Posso ajudar?" aparece depois com um papel na mão, tirado de algum arquivo.

Trata-se do Provimento 1.344/2007, de 25 de agosto de 2007, onde o sr. Celso Luiz Limongi, presidente do Tribunal de Justiça, determinou o horário.

Fico pensando: é falha minha não ler os mais de 1.500 Provimentos que esses caras editam por ano ou deles, de não divulgar em cartazes ou de maneira clara na internet os horários aos coitados dos contribuintes que têm de resolver seus problemas?

Tenho mais 40 minutos pela frente até o "horário de atendimento ao público" começar e decido escrever esta coluna na "Baratonet", uma eficiente e bem montada casa de internet (privada) que encontro ao lado da Catedral da Sé.

No meio do texto, toca o celular. Um amigo do outro lado da linha, que ligou para combinar um almoço, diz que está há um tempão em uma fila enorme no Detran (outro órgão público) esperando a liberação de um documento para seu carro. Dificilmente conseguiremos nos ver antes de 2008.

No Brasil de 2007, ano que talvez tenha mudado definitivamente o patamar da economia brasileira e as perspectivas de futuro, ainda continuamos presos ao polvo que é o setor público.

É triste constatar, mas, ao que parece, essa ainda é uma área que no Brasil só existe para se alimentar dela mesma. Para empregar amigos e parentes, gastar os tubos em prédios e salários e seguir em frente sem qualquer controle externo eficiente.

A quem sustenta essa porcaria toda, um ótimo 2008!

Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha Online.

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