Pensata

Fernando Canzian

31/03/2008

Bolsas e bolsos no reino de Lula

da Folha Online

O presidente Lula atingiu novo recorde de avaliação positiva, com 55% da população considerando seu governo ótimo/bom. Segundo o Datafolha, com exceção do Sudeste (47%), todas as demais regiões do país têm a maioria dos eleitores avaliando o presidente positivamente. Lula "arrebenta" no Nordeste, com 68% aprovando seu governo.

Novos números também mostram que a cobertura dos programas sociais do governo agora atinge um quarto da população brasileira. A divisão desse bolo também continua colada à percepção do desempenho presidencial.

Dos nove Estados do Nordeste, onde Lula é rei, oito têm uma cobertura de programas sociais maior que a média (25%) no país: ela vai de 33,3% dos domicílios na Bahia a 41,3% no Maranhão. Já em dois dos mais populosos Estados do Sudeste, onde a avaliação do presidente é bastante pior, apenas 7,6% dos paulistas recebem benefícios sociais. Entre os fluminenses, 6%.

Esses números atestam, mais uma vez, o poder político-eleitoral dos programas sociais. Eles injetam diretamente dinheiro e otimismo no bolso dos eleitores. Foi assim na reeleição de 2006 e continua sendo quando se trata da percepção do desempenho presidencial. Mas não é só.

A simbiose político-financeira também revela ao menos duas outras coisas: 1) continua enorme a disparidade de renda e o número de miseráveis no Brasil (1,4 milhão de crianças de 5 a 13 anos ainda trabalham, por exemplo) e; 2) os quase 50 milhões de beneficiários de programas sociais vêm, muito provavelmente, ajudando a dar novo impulso à economia como um todo.

Não se pode restringir aos programas sociais o efeito pró-Lula refletido na avaliação presidencial. É inegável que a economia do país ganhou outra musculatura e previsibilidade nos últimos dois anos, contribuindo fortemente para a atual maré crescente de mais investimentos, emprego, renda e consumo.

Gradativamente, os bolsos dos brasileiros vêm ganhando mais recheio. O PIB de 5,4% em 2007 é reflexo acabado disso.

Mas é também irrefutável que os programas sociais continuam tendo um papel fundamental nessa onda de otimismo com Lula e, muito mais do que residual, nos gastos do dia-a-dia das famílias. Afinal, esses benefícios entram pela porta de 25% dos lares do país.

Como sempre ocorre, há dezenas de argumentos contrários à proliferação das bolsas aos miseráveis. Os principais levam em conta o tônus eleitoral que elas oferecem a quem as distribui ou o "mau uso" do dinheiro, que pode acabar na compra de um eletrodoméstico e não no feijão com arroz ou remédios.

São argumentos válidos. Uma comparação, porém, para colocar as coisas em perspectiva: de longe o mais abrangente programa social do governo Lula, o Bolsa Família custará em 2008 apenas um décimo do que será economizado pelo governo federal só para pagar juros da dívida pública (R$ 107 bilhões). Note-se: o equivalente a apenas 10% do que vai embolsar a parcela mais rica do país.

Nesse reinado lulista de bolsos e bolsas inchando, dossiês, CPIs ou escândalos continuarão sendo, no máximo, ruídos.

São as dores do crescimento, para o bem e para o mal.

Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha Online.

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