Pensata

Fernando Canzian

29/09/2008

Ladeira abaixo

NOVA YORK - A derrota do governo George W. Bush em aprovar o pacote de US$ 700 bilhões congelou qualquer resto de otimismo para uma resolução em bons termos da atual crise financeira. As Bolsas desabaram como reflexo, colocando o dia 29 de setembro de 2008 como mais um ponto negro no calendário financeiro de Wall Street.

O pacote entrou em votação nos EUA totalmente desidratado e, mesmo assim, foi rejeitado. Em vez dos US$ 700 bilhões e carta branca para o Tesouro atuar, o Congresso decidiu votar a liberação imediata de apenas US$ 250 bilhões, com mais US$ 100 bilhões engatilhados caso fossem necessários. Mesmo assim, não passou (228 votos contra e 205 a favor).

Enquanto tentarão negociar um novo pacote, o Tesouro e o Fed (o banco central norte-americano) terão de se virar sozinhos com os recursos que têm. O mais plausível é que tentem coordenar uma série de fusões e vendas de instituições micadas _se der tempo. O resultado, muito provavelmente, será uma forte concentração do setor financeiro nos EUA.

Ontem a crise fez uma nova e grande vítima. O Citigroup fechou durante a madrugada a compra do Wachovia, que já foi um dos mais agressivos bancos norte-americanos, por US$ 2,2 bilhões. O Citi pagou US$ 1 por ação do Wachovia e empurrou para o Tesouro dos EUA a responsabilidade por uma parte de uma vasta carteira de créditos de alto risco.

Além de atuar no varejo, o Wachovia era um dos maiores bancos dos EUA na área de crédito a empresas de médio porte. Seu balanço de 2007 mostrou mais de US$ 190 bilhões em empréstimos para companhias norte-americanas e outros US$ 35 bilhões para empresas do setor imobiliário.

O banco engrossa a lista de quebras, vendas e estatizações dos últimos dias que inclui ainda Washington Mutual, Bear Stearns, Lehman Brothers, Merrill Lynch, AIG, Fannie Mae e Freddie Mac.

Agora, três grandes bancos comandam quase um terço das finanças nos EUA: Citigroup, Bank of America e JPMorgan Chase.

Os reflexos no Brasil continuarão a ser sentidos e devem aumentar consideravelmente.

São dois os motores do crescimento da economia brasileira hoje: crédito ao consumo e investimentos das empresas. Os dois têm o financiamento bancário como combustível, e ele ficará cada vez mais escasso daqui para frente. Mas nosso grande calcanhar de Aquiles continua o de sempre: o dólar. É uma péssima hora para o governo ter deixado que as contas externas brasileiras entrassem tão rapidamente no vermelho.

Para financiá-las, precisaremos exatamente do que estará em falta no mercado: crédito e investimentos externos.

Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha Online.

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