Pensata

Fernando Canzian

22/06/2009

Uma estátua para Jim

DE NOVA YORK - O governo brasileiro deveria erguer uma estátua na Esplanada dos Ministérios para o economista-chefe do banco Goldman Sachs, Jim O'Neill. Rússia e Índia também.

Foi O'Neill quem criou, lá em 2001, a expressão Bric (em inglês, quer dizer tijolo) para designar o grupo de emergentes Brasil, Rússia, Índia e China e para apresentar um novo material de construção para a economia global.

O termo Bric cimentou de vez o Brasil no radar econômico internacional. E o país de pernas curtas soube fazer melhor uso (como muletas) dos outros membros mais fortes para tentar dar passos mais espichados.

A reunião dos representantes dos Bric na semana passada na Sibéria (Rússia) foi mais uma coreografia nessa direção. Agora, querem aumentar a participação nas decisões do G20, grupo das 20 maiores economias.

Embora seja o primeiro no acrônimo Bric, o Brasil é o menor deles. Segundo o FMI, em 2008 a economia brasileira respondeu por apenas 2,9% do crescimento global. A da Rússia, 3,3%; da Índia, 4,8%. Mas os três juntos não chegaram aos 11,4% chineses.

Segundo o FMI, unidos os Bric representam 22,4% da economia do planeta, graças à China. E têm 43,4% da população.

Com menos de 10% do total de habitantes do globo, EUA e a zona do euro respondem por 36,4% do PIB global.

Já a inserção brasileira na economia global é ínfima: 3,3% de exportações de bens e serviços. China: 24%. EUA: 14,3%. Zona do euro: 44%.

É legitimo e oportuno que os países em desenvolvimento, com os Bric à frente, queiram um naco maior dessa rapadura. Mas é tarefa difícil. O poder econômico dos mais ricos ainda é incontestavelmente enorme.

Com exceção de China e alguns outros asiáticos, pouquíssimos emergentes têm bala na agulha para manter o crescimento acelerado independentes de financiamentos dos mais ricos.

E nenhum crescimento é mais sustentável do que o baseado em investimentos produtivos.

Um novo estudo do Banco Mundial revela que os emergentes enfrentam um abrupto estrangulamento na disponibilidade de dólares para pagar dívidas contraídas durante o último "boom" da economia mundial, entre 2002 e 2007.

Os emergentes têm neste ano US$ 1 trilhão (quase o PIB do Brasil) em dívidas corporativas (75% do total) e oficiais vencendo. O problema é que, diante do US$ 1 trilhão, o fluxo de dólares em investimentos produtivos ou especulativos é de estimados US$ 363 bilhões por conta da crise.

A diferença entre as necessidades totais e o fluxo, como já vem ocorrendo entre países da Europa do Leste, terá de ser coberta por dinheiro do FMI, ou com reservas dos bancos centrais (como ocorre na América Latina).

As dívidas de US$ 1 trilhão são, essencialmente, resultado do otimismo que levou grandes empresas a se endividar para ampliar a produção na expectativa de um consumo maior.

Agora, na hora de pagar a conta, não só os fluxos de dólares secaram, mas o custo de novos refinanciamentos explodiu. Saltou de 6,4% ao ano antes da crise para 12%.

Ser grande e querer ser grande são coisas distintas.

Hoje, há um risco enorme no aumento do endividamento das economias mais ricas para conter a crise via pacotes trilionários de gastos públicos. As dez maiores do mundo podem ver seu endividamento crescer de 78% como proporção do PIB para 114% em cinco anos.

Mas, entre os emergentes, muitos foram obrigados no passado recente a recorrer a empréstimos do FMI tendo endividamentos muito menores: que não superavam 60% do PIB.

A grande diferença, ainda, é que as economias avançadas permanecem se endividando em moeda forte e local. Cidadãos e empresas locais compram títulos públicos e de empresas denominados na moeda que têm na carteira ou em caixa.

Isso exclui a imensa necessidade de financiamento externo de que os emergentes ainda dependem.

Reais, rublos, rupias e yuans podem ser promissores. Mas ainda não valem muita coisa.

*

Um clássico sobre comparações, de qualquer ordem:

- Jim, do you think that my wife is beautiful? (Jim, você acha minha mulher bonita?)

- Well, John... Compared to what? (Bom, John... Comparada a quê?)

Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha Online.

FolhaShop

Digite produto
ou marca