Pensata

Fernando Canzian

26/04/2010

Pobres bancos

WASHINGTON - Reunida no fim de semana em Washington, a banca internacional pediu clemência às autoridades globais. Há um clamor para puni-la pelos excessos do passado e prevenir que no futuro não se repitam os descalabros que levaram à crise de 2008-2009.

Não colou.

Especialmente em uma semana em que foram revelados e-mails do banco Goldman Sachs dando conta de que seus executivos festejaram o derretimento do mercado imobiliário nos EUA. O mesmo que já levou milhões de pessoas a perder suas casas. Na crise, segundo as mensagens, o Goldman fez "serious money" (dinheiro grosso) e ganhou "mais do que perdeu".

A raiva do setor público (e do público) nos EUA e na Europa é de tal ordem que dificilmente os banqueiros escaparão de novas amarras. Correm o risco inclusive de serem taxados para a criação de um fundo de reposição de perdas a governos que tiverem de onerar contribuintes para socorrer a banca.

Os bancos são representados internacionalmente por um instituto chamado IIF. Ele reúne quase 400 das maiores instituições. É a partir do IIF (uma espécie de Febraban global) que se dá o lobby dos banqueiros.

Nas últimas semanas, os bancos vêm enviando centenas de lobistas ao Congresso dos EUA para tentar diluir as medidas que o governo Barack Obama quer adotar contra eles.

Entre as mudanças propostas pela Casa Branca estão a criação de uma agência de proteção aos consumidores, limitação ao tamanho de alguns bancos e ao risco que eles podem assumir, limites ao pagamento de bônus e a criação de câmaras de compensação para registros das hoje obscuras operações com derivativos.

O mercado de derivativos movimenta estimados US$ 600 trilhões, cerca de dez vezes o PIB global. E ninguém sabe direito o que há nele. O que soubemos com a crise é que havia, por exemplo, papéis completamente podres sendo negociados com a chancela AAA fajuta de agências de classificação de risco.

O argumento dos bancos contra as medidas em curso é esfarrapado.

Charles Dallara, chefe do IIF, disse à coluna que os bancos querem trabalhar em conjunto com as autoridades. Prega que, no lugar de mais regulação e taxa, o tamanho dos bancos seja limitado a instituições que possam quebrar sem comprometer outras áreas da economia (reduzindo o chamado "risco sistêmico").

Diz também que deveria haver essa limitação de tamanho para que, ao quebrar, os credores e acionistas (que apostaram na instituição) sejam os grandes perdedores. Não os contribuintes.

Mas, durante os últimos 20 anos, todo o movimento dos bancos foi exatamente na direção contrária. No sentido de consolidação em instituições imensas e globais e na criação de mecanismos cada vez mais obscuros e intrincados (como os derivativos) para potencializar seus ganhos.

A recente crise foi grande e cara demais para deixar a reforma por conta de quem provocou o estrago.

*

Justiça seja feita, os banqueiros estão certos ao propor o fim de bancos "grandes demais para cair". Eles acabam levando vantagem em relação aos menores, pois podem captar dinheiro no mercado a custos menores. Já que, em tese, não podem quebrar (os governos segurariam as pontas no final).

Isso é mais um incentivo, no médio prazo, aos pequenos e médios a se concentrarem em grandes instituições.

Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha Online.

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