Pensata

João Pereira Coutinho

18/02/2008

E o Oscar (alternativo) vai para...

da Folha Online

Tive uma juventude cinéfila e um dos responsáveis foi Danny Peary. Quem é Peary? Sim, um crítico menor, sem a grandeza de Pauline Kael (já morta) ou David Thomson (ainda vivo). Mas Peary tinha um paladar idiossincrático e o seu "Alternate Oscars", um livrinho encantador onde Peary revisitava a história do principal prémio cinematográfico, foi lido e relido com uma atenção escolástica.

No livro, Peary propunha-se "corrigir" as escolhas da Academia de Hollywood, um bom pretexto para viajar pela história do cinema americano durante seis décadas, de 1927 a 1991 (o exercício, inexplicavelmente, terminava em 1991). E a estratégia de Peary era simples: de ano em ano, o autor fixava-se nas três categorias principais do Oscar (melhor filme, melhor ator, melhor atriz) e depois explicava por que motivo a Academia falhou na esmagadora maioria das vezes.

Exemplos? Fácil: em 1930, "Cimarron" venceu o Oscar de melhor filme, Lionel Barrymore o Oscar de melhor ator (por "A Free Soul/ Uma Alma Livre") e Marie Dressler o Oscar de melhor atriz (por "Min and Bill"). Três escolhas, três erros, escrevia Peary. Em 1930, "City Lights/ Luzes da Cidade", de Chaplin, deveria ter ganho para melhor filme; Edward G. Robinson para melhor ator (em "Little Caesar/ Alma no Lodo"); e Marlene Dietrich para melhor atriz (em "Morocco"). E depois, com argumentação inteligente e cuidada, Peary justificava cada escolha.

Em 64 anos de premiação, por exemplo, Hollywood falhara 58 vezes no Oscar de melhor filme. Ou, inversamente, a Academia acertou apenas em 1929 ("All Quiet on the Western Front/ Sem Novidade no Front"), em 1943 ("Casablanca"), em 1961 ("West Side Story/ Amor, Sublime Amor"), em 1972 ("The Godfather/ O Poderoso Chefão"), em 1977 ("Annie Hall/ Noivo Neurótico, Noiva Nervosa") e em 1986 ("Platoon"). Nos atores, falhou 54 vezes; nas atrizes, 48. E houve casos --o ano de 1963, em que o vencedor foi "Tom Jones"-- em que nenhum filme deveria ter ganho o principal prémio.

Verdade que o livro de Peary era pessoalíssimo e megalómano. Mas, por causa dele, revisitei o cinema clássico de Hollywood, só para confirmar as escolhas do crítico. Sim, concordei com ele sobre a importância incomparável de Cary Grant (jamais premiado) ou Judy Garland (idem). E nunca a sintonia foi tão completa como no ano mágico de 1946: o Oscar de melhor filme foi para "The Best Years of Our Lives/ Os Melhores Anos de Nossa Vida", quando deveria ter premiado "It's a Wonderful Life/ A Felicidade Não se Compra" (diz Peary e digo eu). Sem falar do ator e da atriz desse ano: o Oscar de melhor ator foi para Frederic March (por "Os Melhores Anos de Nossa Vida") quando deveria ter premiado James Stewart (por "A Felicidade Não se Compra"). E Ingrid Bergman (em "Notorious/ Interlúdio", de Hitchcock) perdeu para Olivia de Havilland (em "To Each His Own/ Só Resta uma Lágrima"). Injusto, injusto.

Mas verdadeiramente injusto foi Danny Peary ter ficado em 1991 quando a Academia de Hollywood se prepara para premiar os filmes de 2007 no próximo domingo. Dezesseis anos sem a sabedoria de Peary não são apenas uma lástima para seguidores como eu; são um convite para que alguém assalte o trono do Mestre e decrete os erros da Academia desde 1991.

Dito e feito. Aqui ficam os filmes, os atores e as atrizes que venceram o Oscar nos últimos 16 anos. Seguidamente, os filmes, os atores e as atrizes que deveriam mesmo ter ganho o Oscar em cada um dos anos e em cada uma das categorias principais.

Vai uma aposta em como os leitores da Folha concordam comigo e correm logo para a locadora do bairro?

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"Os Imperdoáveis", de Clint Eastwood, ganhou o Oscar de melhor filme de 1992
"Os Imperdoáveis", de Clint Eastwood, ganhou o Oscar de melhor filme de 1992

1992

FILME - O ano pertenceu a Clint Eastwood e a "Unforgiven/Os Imperdoáveis". Seria imperdoável discordar da Academia. Em tom elegíaco, Clint Eastwood revisita a história do western, de que ele fez parte, e enterra o western com uma dignidade intocável e outonal.

ATOR - Al Pacino tinha sido indicado seis vezes ao Oscar e a Academia resolveu fazer justiça em filme menor e papel idem: "Scent of a Woman/ Perfume de Mulher". Erro. O ator do ano foi, na verdade, Clint Eastwood em "Os Imperdoáveis", pelo papel magistral de William Munny, o pistoleiro envelhecido que regressa à cidade para executar um último trabalho. O diálogo final com o xerife (notável Gene Hackman, em papel secundário e premiado) chegava e sobrava para resolver o Oscar de melhor ator.

ATRIZ - Emma Thompson conseguiu a proeza de transportar para a tela Margaret Schlegel, uma das maiores personagens da literatura de E.M. Forster em "Howards End/ Retorno a Howards End". Mas a atriz do ano foi, sem sombra de dúvida, Judy Davis em "Husbands and Wives/ Maridos e Esposas", de Woody Allen: a neurótica Sally, que inicia o seu calvário emocional quando o casamento desaba sem aviso, é talvez a melhor personagem feminina do cinema de Woody.

1993

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"A Lista de Schindler", de Steven Spielberg, venceu o Oscar de melhor filme de 1993
"A Lista de Schindler", de Steven Spielberg, venceu o Oscar de melhor filme de 1993

FILME - No ano em que a Academia premiava "Schindler's List/ A Lista de Schindler", um filme menor na filmografia de Spielberg, Clint Eastwood filmava outra obra-prima: "A Perfect World/ Um Mundo Perfeito", história da relação improvável (e paternal) que se estabelece entre um criminoso em fuga e a criança que ele toma como refém. A sequência final é talvez um dos momentos mais poderosos do cinema moderno e prova da complexidade e ambiguidade moral que habitam o cinema de Eastwood.

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Tom Hanks ganhou o Oscar de melhor ator por "Philadelphia"
Tom Hanks ganhou o Oscar de melhor ator por "Philadelphia"

ATOR - Tom Hanks, em "Philadelphia/ Filadélfia", no papel de doente com AIDS, comoveu a Academia; a Academia sempre se comoveu com atores de comédia que molham o bico no dramalhão "fraturante". Não me comoveu a mim. Sobretudo porque em 1993 Anthony Hopkins assinava o papel da sua carreira em "Shadowlands/ Terra das Sombras", de Richard Attenborough, ao encarnar o escritor inglês C.S. Lewis e a paixão tardia por Joy Gresham.

ATRIZ - Holly Hunter, em "The Piano/O Piano", oferece o único motivo pelo qual o filme de Jane Campion não é completamente dispensável. Mas Debra Winger, também em "Shadowlands", era a escolha certa em 1993 ao estabelecer com Hopkins um dos pares mais dramáticos (e adultos) do cinema recente.

1994

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Forrest Gump levou o Oscar de melhor filme, em 1994
Forrest Gump levou o Oscar de melhor filme, em 1994

FILME - Verdade que "Forrest Gump", de Robert Zemeckis, a história de um idiota que atravessa a América com o mesmo desprendimento com que come uma caixa de chocolates, ainda hoje me desperta algumas gargalhadas pueris. Mas Oscar para melhor filme? Duvidoso. "Quiz Show", de Robert Redford, um tratado sobre a vaidade e a ambição na América televisiva dos anos 50, não é apenas o melhor filme de Redford - mas a melhor colheita americana de 1994.

ATOR - Tom Hanks bisou o Oscar de melhor ator com "Forrest Gump". Tolerável, sim. Mas, para sermos rigorosos, o ano pertenceu a Tommy Lee Jones por "Blue Sky/Céu Azul", o filme póstumo de Tony Richardson.

ATRIZ - A Academia ignorou Tommy Lee Jones em "Blue Sky", mas não ignorou Jessica Lange no mesmo filme. Fez mal. Duplamente. Primeiro, porque é Tommy Lee Jones, no papel do major 'Hank' Marshall, quem sustenta todo o filme. E, depois, porque em 1994 Jennifer Jason Leigh foi Dorothy Parker no filme de Alan Rudolph, "Mrs. Parker and the Vicious Cirle/O Círculo do Vício". Ainda hoje, quando leio Dorothy Parker, é a voz de Jason Leigh que ouço na memória.

1995

FILME - Em 1995, a Academia premiava "Braveheart", de Mel Gibson. Será preciso comentar? Martin Scorsese, no mesmo ano, dirigia o seu último grande filme até hoje, "Casino".

ATOR - Nicolas Cage é Ben, o alcóolatra suicida em "Leaving Las Vegas/ Despedida em Las Vegas", o filme trendy do insuportável Mike Figgis que a Academia premiou com o Oscar de melhor ator. Engano. Jonathan Pryce, em "Carrington", compunha uma das personagens mais memoráveis do cinema recente: o escritor Lytton Strachey e a relação (impossível) com a pintora Dora Carrington (Emma Thompson, no filme).

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Susan Sarandon levou o prêmio de melhor atriz de 1995 por "Os Últimos Passos de um homem"
Susan Sarandon levou o prêmio de melhor atriz de 1995 por "Os Últimos Passos de um homem"

ATRIZ - O Oscar de melhor atriz premiava Susan Sarandon, em "Dead Man Walking/Os Últimos Passos de um Homem", de Tim Robbins. Para provar a injustiça do prémio, basta escrever duas palavras: Meryl Streep. Em "The Bridges of Madison County/As Pontes de Madison", filme de Eastwood a partir de um livro fraco de Robert James Waller, Streep é prodigiosa em sensualidade, vulnerabilidade e sacrifício.

1996

FILME - Anthony Minghella, um quase principiante, levava a estatueta de melhor filme com "The English Patient/O Paciente Inglês". O filme tem uma aura romântica e clássica que não envergonha; mas em 1996, Woody Allen filmava um musical: "Everyone Says I Love You/ Todos Dizem Eu te Amo". É o último grande filme de Woody Allen. E um dos melhores do autor.

ATOR - Geoffrey Rush, atroz no atroz "Shine/Brilhante", comprovava o gosto da Academia por premiar personagens dementes, deficientes, ou ambos. Fatalmente, a Academia não percebeu a inteligência, a subtileza e a graciosidade de Kevin Costner como veterano jogador de golfe em "Tin Cup/O Jogo da Paixão", um papel que Cary Grant não desdenharia.

ATRIZ - Confesso que Frances McDormand, em "Fargo", dos irmãos Coen, seria a escolha evidente para 1996. Mas Gena Rowlands filmou, com o filho, Nick Cassavetes, o injustamente esquecido "Unhook the Stars": a sua Mildred é o retrato perfeito de como é possível perder a vida por gentileza. Para voltar a ganhá-la por gentileza igual.

1997

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Titanic, de James Cameron, levou o Oscar de melhor filme em 1997
Titanic, de James Cameron, levou o Oscar de melhor filme em 1997

FILME - No ano em que "Titanic", de James Cameron, afundou qualquer concorrente, a Academia de Hollywood esqueceu um dos melhores filmes da década de 90: "The Ice Storm/Tempestade de Gelo", de Ang Lee.

ATOR - Jack Nicholson, no papel de Jack Nicholson, levou a estatueta em "As Good as it Gets/Melhor é Impossível". No mesmo ano, a Academia indicou, mas não premiou, Robert Duvall, o pregador 'Sonny' Hewey em "The Apostle".

ATRIZ - Helen Hunt, no papel de Helen Hunt, levou a estatueta em "Melhor é Impossível". Mas a interpretação feminina do ano pertenceu a Joan Allen, em "Tempestade de Gelo": a cleptomaníaca Elena representa bem o clima de acédia e desmoronamento familiar e moral do filme de Ang Lee.

1998

FILME - É um erro desprezar "Shakespeare in Love/ Shakespeare Apaixonado", de John Madden. O filme merece ser visto pelo texto assombroso de Tom Stoppard, pleno de referências cruzadas e eruditas à obra do bardo. Mas o melhor filme do ano, infelizmente ignorado pela Academia e pela crítica, dá pelo nome de "Apt Pupil/ O Aprendiz", dramatização curial de um aluno de Liceu que descobre (e chantageia) um velho torcionário nazista a viver no bairro.

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Roberto Benigni ganhou o Oscar de melhor ator por "A Vida É Bela", em 1998
Roberto Benigni ganhou o Oscar de melhor ator por "A Vida É Bela", em 1998

ATOR - Roberto Benigni, em "A Vida é Bela", assinou uma das páginas mais bizarras da história da Academia. O Oscar de melhor ator deveria ter premiado o velho torcionário nazista do bairro, Ian McKellen, em "O Aprendiz".

ATRIZ - Gwyneth Paltrow, em "Shakespeare Apaixonado", é competente e irrelevante. Mas o papel feminino de 1998 coube a Christina Ricci, em "The Opposite of Sex/O Oposto do Sexo". Será possível esquecer a amoralidade cínica da personagem Dede Truitt?

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"Beleza Americana" ganhou o Oscar de melhor filme de 1999
"Beleza Americana" ganhou o Oscar de melhor filme de 1999

1999

FILME - "American Beauty/Beleza Americana", de Sam Mendes, procura ilustrar a hipocrisia moral da sociedade suburbana americana, e bla bla bla. Esqueçam. O filme do ano veio do outro lado do Atlântico, assinado por Neil Jordan. É "The End of the Affair/Fim de Caso", uma adaptação do livro de Graham Greene que está ao nível do livro de Greene. É preciso dizer mais?

ATOR - Kevin Spacey, em "Beleza Americana", colheu aplausos como Lester Burnham, o americano médio que, na crise da meia idade, repensa a vida e redescobre, demasiado tarde, a beleza que existe no mundo. Tradução: para vomitar. O Oscar deveria ter premiado Ralph Fiennes, em "Fim de Caso", pelo papel de Bendrix, o escritor enlouquecido de paixão (por Sarah) e de ódio (por Deus).

ATRIZ - O que acontece quando uma atriz veste calças de rapazinho e corta o cabelo como um? Temos Oscar para Hilary Swank, por "Boys Don't Cry/ Meninos Não Choram". Num mundo ideal, a estatueta pertenceria a Reese Witherspoon, normalmente intragável, mas simplesmente perfeita como Tracy Flick, em "Election/ Eleição", a aluna com fortes traços de ambição e sociopatia que toda a gente que é gente conheceu nos tempos de escola.

2000

FILME - Nada tenho contra o "peplum", o género histórico que fez a glória de Hollywood nos anos 50 e 60 em filmes como "Ben-Hur" ou "Os Dez Mandamentos". Mas "Gladiador", de Ridley Scott? O filme certo era "Wonderboys/ Garotos Incríveis", de Curtis Hanson, história de um escritor em crise criativa com um Michael Douglas divino.

ATOR - A escolha certa era Michael Douglas, no citado "Garotos Incríveis". Ganhou Russell Crowe, em "Gladiador".

ATRIZ - Se o Oscar premiou Julia Roberts, em "Erin Brockovich", pertenceu a Laura Linney, em "You Can Count on Me/ Conte Comigo", a interpretação feminina do ano.

2001

FILME - Um caso de mediocridade invulgar levou o Oscar de melhor filme em 2001: "A Beautiful Mind/ Uma Mente Brilhante", de Ron Howard, uma peça hagiográfica sobre o Nobel da economia John Nash que, muito apropriadamente, ocultou os aspectos mais desagradáveis do personagem (como o seu vibrante anti-semitismo). Em 2001, o filme certo era "In the Bedroom/ Entre Quatro Paredes", uma tragédia anti-sentimental sobre a perda e a vingança.

ATOR - Depois de Sidney Poitier, em 1964, a Academia premiava o segundo negro da sua história por um papel principal. A honra coube a Denzel Washington, por "Training Day/ Dia de Treinamento". A distinção estaria justificada se Tom Wilkinson, em "Entre Quatro Paredes", não oferecesse o papel de um pai que procura, encontra e executa o assassino do seu filho.

ATRIZ - Ano duplo para a comunidade negra. Halle Berry em "Monster's Ball/ A Última Ceia", vence o Oscar de Melhor Atriz. Em ano fraco para as mulheres, a escolha não aquece nem arrefece.

2002

FILME - A Academia premia o musical errado, "Chicago", e esquece "Catch Me If you Can/ Prenda-me Se For Capaz", a história de Frank Abagnale Jr. que Spielberg filmou com uma graciosidade digna de Minelli. É o melhor filme de Spielberg.

ATOR - Em condiçõs normais, o Oscar de melhor ator seria para Leonardo Di Caprio por "Prenda-me se for Capaz". Mas 2002 não foi um ano normal: Adrien Brody, em "The Pianist/ O Pianista", de Roman Polanski, oferece Wladyslaw Szpilman, um pianista na Varsóvia sitiada pelos nazistas, que vai escapando entre ruínas como uma ratazana amedrontada e famélica. O Oscar foi muito bem entregue.

ATRIZ - O Oscar para Melhor Atriz premiou a prótese do nariz de Virginia Woolf, perdão, de Nicole Kidman, em "The Hours/ As Horas". Mas foi Diane Lane, em "Unfaithful/ Infidelidade", quem assinou o papel feminino do ano como a esposa infiel que troca Richard Gere por um francês qualquer. Uma sequência do filme define o talento de Lane: quando, depois de cometida a traição, a esposa regressa a casa de trem e, nos abismos da culpa, não sabe se rir ou chorar.

2003

FILME - A terceira parte de "Lord of the Rings/ O Senhor dos Anéis", de Peter Jackson, é coroado com o Oscar respetivo. Peço desculpa por meus preconceitos, mas um jogo de computador continua a ser um jogo de computador. E Tolkien é infilmável. Em 2003, ano invulgarmente fraco, não houve filme que justificasse a estatueta maior.

ATOR - Sean Penn, em "Mystic River/ Sobre Meninos e Lobos", salvou a honra do convento Eastwood. Mas quem viu não esquece a obstinação trágica do general iraniano composto por Ben Kingsley, em "The House of Sand and Fog/ Casa de Areia e Névoa"*.

ATRIZ - Atriz invulgarmente bela engorda vinte quilos e usa maquiagem necessária para reforçar uma aparência grotesca. É Charlize Theron, em "Monster/ Desejo Assassino", e eu estou a exagerar, é lógico. Mas como foi possível esquecer Diane Keaton, em "Something's Gotta Give/ Alguém Tem Que Ceder"?

2004

FILME - Clint Eastwood regressa às vitórias com "Million Dollar Baby/ Menina de Ouro". Nada a acrescentar.

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Jamie Foxx, levou o Oscar de meljor ator de 2004 ao interpretar Ray Charles em "Ray"
Jamie Foxx levou o Oscar de melhor ator de 2004 ao interpretar Ray Charles em "Ray"

ATOR - Jamie Foxx, em "Ray", faz um belo boneco de Ray Charles e leva a copa. Mas o Oscar de melhor ator pertenceria a Paul Giamatti, em "Sideways/ Entre Umas e Outras", o filme indy de Alexander Payne sobre dupla de amigos que viaja pela região vinhateira da Califórnia. Giamatti é Miles, escritor falhado e enólogo amador (no sentido mais nobre da palavra "amador"), um retrato pleno de desencanto e honestidade.

ATRIZ - Hilary Swank, em "Menina de Ouro", seria escolha possível, se Annette Bening não tivesse filmado "Being Julia/ Adorável Julia", filme sobre a atriz (e harpia) Julia Lambert, a partir do romance de Somerset Maugham.

2005

FILME - Escrevi anteriormente que a vitória de Benigni, em "A Vida é Bela", foi uma das páginas mais bizarras da Academia. Corrijo. A página mais bizarra aconteceu em 2005, quando um telefilme vulgar, "Crash/ No Limite", levou o Oscar de melhor filme. Será preciso repetir que o filme do ano foi colheita independente e dava pelo nome de "The Squid and the Whale/ A Lula e a Baleia"?

ATOR - Philip Seymour Hoffman é primoroso em "Capote", ao reproduzir a voz e os maneirismos do escritor Truman Capote. Mas, apesar de tudo, a escolha certa seria Jeff Daniels, novamente em "A Lula e a Baleia": o típico intelectual nova-iorquino, pedante e blasé, que atravessa o divórcio com uma encantadora angústia "non-chalance".

ATRIZ - Reese Witherspoon, que não ganhou em 1999, com "Eleição", venceu o Oscar em 2005 por June Carter, a companheira de Johnny Cash, em "Walk the Line/ Johnny e June". A escolha não é inteiramente absurda, mas o ano foi débil em actrizes e nem Laura Linney, em "A Lula e a Baleia", mereceria a honra.

2006

FILME - Não deixa de ser irónico que Martin Scorsese tenha perdido o Oscar em 1976 (com "Taxi Driver/ Motorista de Táxi"), em 1980 (com "Raging Bull/ Touro Indomável") ou em 1995 (com "Casino") para o ganhar em 2006, com "The Departed/ Os Infiltrados". O filme é bom, mas francamente menor no conjunto da obra de Scorsese. E, além disso, o ano pertenceu a Clint Eastwood, com "Flags of Our Fathers/ A Conquista da Honra" e "Letters from Iwo Jima/ Cartas de Iwo Jima". Qualquer um deles teria merecido a distinção.

ATOR - Entre os atores, Hollywood tem esquecimentos homéricos. Cary Grant, indicado duas vezes, nunca ganhou. Chaplin também não. Nem Richard Burton, indicado 6 vezes e 6 vezes derrotado. Mas Peter O'Toole, com oito indicações, apresentou-se em 2006 com "Venus", filme sobre ator em final de vida que ainda alimenta efabulações lascivas por Lolita provinciana e proletária. É o melhor papel de O'Toole. A Academia optou por Forest Whitaker, em "O Último Rei da Escócia". Não me perguntem por que.

ATRIZ - Deus está nos detalhes: quem já viu a rainha Elizabeth 2ª a caminhar nas suas lides públicas sabe por que motivo Helen Mirren em "The Queen/ A Rainha", não teve concorrência em 2006. Melhor era impossível.

E em 2007? Os vencedores são-me indiferentes, confesso. Mas o último ano teve um grande filme ("Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet") servido por dois grandes atores (Johnny Depp e Helena Bonham Carter). Depp está indicado para o Oscar de melhor ator, Bonham Carter foi esquecida. Esquecer Helena Bonham Carter, em qualquer circunstância, deveria merecer uma passagem pela cadeira sangrenta do barbeiro.

João Pereira Coutinho é colunista da Folha. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro "Avenida Paulista" (Record). Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.

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