Pensata

Kennedy Alencar

12/12/2008

O Banco Central piscou e errou

Pela primeira vez em seis anos, o Banco Central passou recibo da pressão política exercida nos bastidores pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Manteve a taxa básica de juros, a Selic, inalterada lá nas alturas. São 13,75% ao ano até a próxima reunião, daqui a um mês e meio.

O BC quis provar, mais uma vez, que era mesmo independente. No entanto, fez um comunicado para dar o sinal político cobrado por Lula de que haveria uma queda dos juros.

Segue o comunicado do BC: "Tendo a maioria dos membros do Comitê discutido a possibilidade de reduzir a taxa básica de juros já nesta reunião, em ambiente macroeconômico que continua cercado por grande incerteza, o Copom decidiu por unanimidade, ainda manter a taxa Selic em 13,75% ao ano, sem viés, neste momento. O Comitê irá monitorar atentamente a evolução do cenário prospectivo para a inflação com vistas a definir tempestivamente os próximos passos de sua estratégia de política monetária".

Ao dizer que a maioria dos diretores discutiu a hipótese de redução, mas não a adotou, o comunicado anulou qualquer sinal mais conservador da decisão unânime. Quem desejava uma demonstração de macheza do BC ficou meio decepcionado.

Mas esse trecho serviu para antecipar uma mudança de rumo e dar uma satisfação a quem tem o direito de cobrar o BC: o presidente que foi eleito e que concedeu autonomia à instituição. Não custa lembrar que o BC fazia chegar ao mercado a informação de que só reduziria juros na segunda metade de 2009. A pressão de Lula, vista por muita gente como indevida ou improdutiva, ganhou com isso um meio ano.

Leitura do comunicado predominante no mercado: o BC vai reduzir os juros já no começo do ano que vem. A evidência disso foi a queda das taxas de juros no mercado futuro logo após a decisão. Infelizmente, o país vai ter de gastar mais com a sua dívida pública por causa da teimosia do BC. Uma redução de 0,25 ponto percentual diminuiria em quase R$ 2 bilhões o custo anual de rolagem da dívida pública. Sem contar a ducha de água na fria no empresariado, o que afeta decisões sobre investimentos, demissões e produção.

Se tivesse reduzido a Selic, o mercado não acharia ruim. O mercado inteiro já entendeu que a pressão inflacionária na economia brasileira é coisa do passado.

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O dilema do câmbio

O dia de ontem, quinta-feira (11/12), deixou claro que perdeu força outro argumento do BC para manter os juros altos. O raciocínio do BC é o seguinte. O real se desvalorizou muito com o agravamento da crise internacional, de meados de setembro para cá. Uma redução dos juros só reforçaria o processo de desvalorização do real e de valorização do dólar.

Como foi o dia de ontem? O dólar caiu mais de 3% na comparação com o dia anterior. Fechou em R$ 2,348. Esse movimento enfraquece a idéia de que uma sinalização de corte de juros poderia gerar depreciação do real. Um integrante do mercado financeiro avaliou a discussão sobre câmbio assim: "Na conjuntura global, o fluxo de capital segue para os países que vão se safar da crise primeiro, não para onde as taxas de juros são altas".

Ou seja, os juros na Lua do Banco Central só sacrificam o país neste momento. Não há nenhum efeito sobre a inflação e o câmbio. Não há ameaça inflacionária, e a decisão dos investidores sobre onde colocaram os seus recursos ganhou outras nuances, mais importantes do que os juros mais altos do planeta praticados no Brasil.

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No mundo da Lua

Um trecho do comunicado do BC é interessante: "o ambiente macroeconômico continua cercado por incertezas". Pelamordedeus! Parece que há uma tremenda certeza de que a crise é brava no mundo inteiro e que já bateu um marolão por aqui. Parece que não são apenas os juros brasileiros que estão na Lua.

Kennedy Alencar colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

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