Pensata

Kennedy Alencar

11/09/2009

Ciro e lições de 1989

Parece que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se deu conta de que a tendência do deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) é mesmo disputar o Palácio do Planalto em 2010. Talvez ainda venha a acontecer, dependendo da evolução da corrida eleitoral, uma tentativa de fazer da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a candidata única de todas as forças que apoiam Lula.

O presidente tem uma carta na manga. Tentar emplacar Ciro como vice de Dilma. Mas é uma articulação complicada, porque dificultaria muito a aliança formal com o PMDB, partido que deseja a vice para oficializar o apoio à candidatura presidencial da ministra.

A prioridade política de Lula é a aliança com o PMDB. Motivos: tempo significativo no horário eleitoral gratuito e a estrutura do partido mais enraizado no território nacional. Transformar a eleição presidencial numa disputa plebiscitária vem em segundo lugar.

Ciro discorda da tese de plebiscito. Discorda porque acredita que a tese é arriscada. E discorda porque ela é inconveniente ao seu plano de concorrer ao Palácio do Planalto. Já a hipótese de vice de Dilma... Mas, com já dito, isso dependeria de uma concessão que o PMDB hoje não está disposto a a fazer.

Nesse contexto, Ciro acredita que poderá ocorrer com ele o que aconteceu com Lula em 1989. Naquela eleição, parte da esquerda queria que o petista apoiasse Leonel Brizola, então candidato do PDT. Brizola parecia uma opção mais realista, com mais chance de ser aceita do que o ex-líder sindical barbudo visto pelos empresários como bicho-papão.

Lula não cedeu. Por uma pequena diferença em relação a Brizola, foi para o segundo turno contra Fernando Collor de Mello, à época no PRN.

A candidatura de Ciro tende a tirar votos de Dilma no Nordeste, o principal celeiro da popularidade presidencial e, portanto, fundamental para a preferida de Lula. Na cabeça de Ciro, que interpretou assim algumas pesquisas, Dilma não vai decolar como o presidente acredita.

Restaria ser candidato a contragosto do presidente. Se o plano de voo der certo, viraria o candidato de Lula no segundo turno. E teria, então, boa chance de derrotar a oposição.

*

Mágica estatística

De tempos em tempos, aparecem uma verdades estatísticas inegáveis. A última versa sobre a capacidade de transferência de votos do presidente Lula. Seria de 20%.

20% de quê? Dos votos que ele receberia se fosse candidato? Isso seria o teto que um candidato apoiado pelo presidente conseguiria? Quanto da intenção de voto hoje estacionada em Dilma é resultado de transferência de prestígio de Lula? Por que não 5% ou 10% de transferência? Por que não 25% ou 30%?

Leitores enviaram mensagens dizendo que, na última pesquisa Sensus/CNT, 20,8% dos entrevistados disseram que votariam no candidato de Lula. Ora, isso não é taxa de transferência de voto. É um dado da possível transferência. Vai depender de quão conhecido o candidato de Lula se tornar, de maior ou menor empenho do presidente a seu favor, do sentimento do eleitorado na hora em que o tema da campanha realmente estiver decisivamente em discussão (agosto e setembro de 2010), da avaliação de Lula e de seu governo lá na frente. Enfim, muita coisa.

Esse dado de 20% é puro chute. Não dá para dizer quanto Lula transferirá ou não. Há muitos fatores que influenciam a razão do voto.

Dá para falar que o presidente terá forte influência na sua sucessão se mantiver a boa avaliação pessoal e do governo na época da eleição. Obviamente, um presidente com cacife ajudará a sua provável candidata. Mas a força de Lula não é garantia de eleição automática. Nem a "verdade estatística dos 20%" significa que Dilma não possa angariar votos suficientes para vencer.

Quando se trata de pesquisa, melhor levar em conta a seriedade do pesquisador.

*

Bom palpite

Na pesquisa Sensus/CNT, não foi feita pergunta sobre a crise do Senado e a relação com a popularidade de Lula. Mesmo assim, o relatório da pesquisa atribui a queda da popularidade de Lula ao apoio a José Sarney. Realmente, é um bom palpite. Tem muita chance de estar certo.

Kennedy Alencar colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.

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