Pensata

Luiz Caversan

26/07/2008

O filme, o barbeiro e o taxista

"Nós éramos 15 mulheres aprisionadas num hotel. Eles nos estupravam seguidamente, todos os dias, várias vezes por dia. Quando alguma de nós gritava, um daqueles soldados dizia: 'Ah, você está gritando. Agora eu vou te dar motivo para gritar.' O soldado então pegava uma faca afiada, fazia pequenos cortes em diversas partes do corpo dessa mulher, colocava sal e depois fechava o corte com agulha e linha de costura. A minha melhor amiga morreu depois de sangrar lentamente durante muito tempo..."

(Recordações da personagem Hanna no filme "A Vida Secreta das Palavras", baseado em fatos reais. Os soldados a que ela se refere eram sérvios, que agiam sob a complacência do carniceiro Radovan Karadzic, preso esta semana. O que mais assusta neste caso não é apenas a crueldade, mas o fato de as atrocidades terem sido cometidas há pouco mais de uma década, no coração da Europa)

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"A cidade ficou vazia assim porque está todo mundo com medo. Olha só, quinta-feira, 9 da noite e não tem ninguém na rua, os lugares estão vazios. Também, com tanta violência o carioca prefere ficar em casa. A polícia, que deveria proteger o cidadão, só faz merda, então as pessoas têm medo de sair à rua. Bem, também tem o lance da Lei Seca, isso afeta o movimento dos bares. Mas com a polícia daqui não tem erro. Se o doutor for pego numa blitz do bafômetro, eles vão pedir R$ 2 mil para acertar por ali mesmo, sem ir para a delegacia. Mas, andar na rua, disso o povão está com medo..."

(Palavras do taxista Ernesto, enquanto dirige pelas ruas aparentemente calmas de Ipanema, bairro nobre do Rio de Janeiro)

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"O neguinho vai ganhar, pode escrever. Vai ganhar, os tais dos conservadores podem espernear quanto quiserem. O amigo aqui do lado diz que ele é só um show man, tipo Silvio Santos, entende, mas não adianta, ele vai ganhar. Pô, você viu o show que ele deu em Berlim? O neguinho não é mole não...Tem voto até de alemão e vai ter também o voto dos americanos. Para ter certeza eu só quero ver quem ele vai escolher para vice. Se escolher a Hilary, fica mais difícil, mas se escolher aquele grandão que ganhou o Prêmio Nobel [Al Gore], aí não tem pra ninguém. Aí é só uma questão de tempo pro neguinho chegar à presidência dos Estados Unidos. Eles aqui duvidam de mim, mas é igual o Lula. Eu falava: o Lula não é fraco, não. E eles riam. Olha aí, o Lula já está no segundo mandato e elege quem ele quiser, até um poste. Se o Lula chegar e disser: olhaí pessoal, vamos botar o Léo na Presidência do Brasil, não tem erro, eu serei eleito! Já pensou, eu aqui e o Barak Obama lá?"

(Comentários do barbeiro Léo, enquanto pilota sua cadeira no salão Leblon, também no Rio de Janeiro)

Luiz Caversan é jornalista, produtor cultural e consultor na área de comunicação corporativa. Foi repórter especial, diretor da sucursal do Rio da Folha, editor dos cadernos Cotidiano, Ilustrada e Dinheiro, entre outros. Escreve aos sábados para a Folha Online.

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