Pensata

Luiz Caversan

03/10/2009

Última chance para o Rio

Estive no Rio de Janeiro a trabalho duas vezes nesta semana e, como das inúmeras outras ocasiões em que ali me encontrei (na década de 90 morei nove anos na cidade), não cansava de me deleitar com as paisagens urbanas mais lindas do mundo.

O contorno sensual de suas colinas e escarpas, as românticas intervenções como o bondinho do Pão de Açúcar, a estampa dos seus calçadões acolhedores e democráticos, o desenho sinuoso do Aterro e seus maravilhosos jardins engendrados por Burle Marx, tudo encanta.

Tenho muitos e excelentes amigos cariocas, cheguei a me sentir um pouco "da gema" quando vivia o dia-a-dia da cidade e não tenho dúvidas nem ilusões quanto a seus problemas, muitos e graves.

Problemas que tiveram boas chances de ser sanados, ainda que em parte, em situações como a Eco 92, encontro de chefes de Estado de todo o mundo que levou reconhecimento e recursos para a cidade, ou, mais recentemente e mais a ver com a escolha para sediar as Olimpíadas, a realização dos jogos Pan-americanos.

Na Eco 92, o que poderiam ter sido intervenções urbanísticas verdadeiras e eficazes se resumiram a alguma poucas reformas, o maior número delas maquiando as partes mais expostas da cidade, como a orla, que foi remodelada.

No Pan, instalações modernas foram criadas, mas a um custo vergonhoso para os cofres públicos, com contas que nunca fecharam e com responsabilidades que nunca foram atribuídas.

No mais, o tráfico continua dominando os morros, as favelas crescem e se desdobram como seu fosse um vírus se propagando por um organismo doente (ou seria a favela o próprio corpo?), os turistas continuam a ser assaltados e os moradores permanecem em alerta constante.

Mas eu quis me emocionar com a escolha da cidade para sediar as Olimpíadas.

Gostei do filmete do Fernando Meirelles, acreditei nas lágrimas do presidente Lula, embora não engula nem a pau a cartolagem que comanda esses eventos.

Quis e quero acreditar que, primeiro com a parte que levará da Copa do Mundo de 14 e depois com as Olimpíadas de 16, o Rio vai finalmente dar um salto de qualidade num país que está em evolução.

A Olimpíada será mais uma chance, na verdade do meu ponto de vista a última chance, para que o Rio enfrente com coragem e eficiência seus problemas crônicos, que busque lá no fundo da alma seu orgulho ferido por tantas e tantas vicissitudes e reocupe seu lugar na história.

Uma vez, o grande jornalista Janio de Freitas me chamou a atenção para o fato de que, mesmo antes da meia noite, as luzes dos barracos das favelas vão se apagando e a maioria das casas pobres cedo ficam em silêncio. "Sabe por quê? Porque ali moram trabalhadores, que precisam acordar cedo, a imensa maioria não tem nada a ver com o crime".

E é em nome dessa maioria, da grande nação carioca que tantas e tantas coisas bacanas já fez por este país, que eu torço pelo êxito dessa empreitada.

Pode dar certo, sim.

Luiz Caversan é jornalista, produtor cultural e consultor na área de comunicação corporativa. Foi repórter especial, diretor da sucursal do Rio da Folha, editor dos cadernos Cotidiano, Ilustrada e Dinheiro, entre outros. Escreve aos sábados para a Folha Online.

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