Pensata

Sérgio Malbergier

13/12/2007

São Paulo Terceiro Mundo

Aqui de São Paulo gostamos de olhar para o resto do Brasil como se fôssemos a locomotiva puxando os vagões, uma Nova York dos trópicos, cosmopolita, dinâmica, rica, moderna. É tudo verdade. Temos de longe a maior concentração de PhDs e MBAs do Brasil, ficam aqui o centro financeiro e nossas Bolsas e bancos bilionários, os hospitais de ponta, as principais indústrias, as melhores universidades, os jornais e revistas mais relevantes, as agências de publicidade, os melhores restaurantes, o comércio de luxo.

E ainda argumentamos, cheios de razão, que parte da devassidão do Congresso Nacional é fruto da injusta lei eleitoral que reduz o peso do voto de São Paulo e outros centros mais ricos e avançados enquanto turbina a voz das regiões mais pobres e atrasadas do país. E, não, isso não traz mais equilíbrio entre ricos e pobres, apenas dá mais poder ao voto dos menos educados que acabam elegendo políticos menos educados que acabam fazendo esses estragos todos em Brasília que prejudicam justamente os mais pobres, pois os ricos já são ricos.

Mas basta olhar para a Câmara de Vereadores de São Paulo para concluir que não somos tão melhores assim politicamente.

Os vereadores paulistanos fizeram um arrastão legislativo aprovando 96 projetos em pouco mais de seis horas, quase 16 por hora ou um a cada quatro minutos. Será que entrarão no Livro Guinness dos Recordes? Entre os projetos aprovados estão um que amplia o rodízio de veículos na cidade e outro que o abole. Fazem isso para que os vereadores possam dizer a seus eleitores que aprovaram algo, pois a maior parte deve cair na segunda votação obrigatória, isso se for a voto novamente.

Impávido e impune, o presidente da Casa, Antônio Carlos Rodrigues (PR), explica que essa farsa "é costume da casa". E, apesar da grita na mídia (o tema foi manchete da Folha), é tudo aceito com a maior passividade pela população mais dinâmica, educada e realizadora do país. A mesma que vive reclamando do barulho infernal, do trânsito desordenado, das ruas esburacadas, da falta de idéias e planejamento urbanístico, mas não atua politicamente para mudar as coisas.

Como esperar que o Congresso seja melhor que o Parlamento da cidade mais avançada do Brasil?

Esqueça. Nossa crescente riqueza material é ainda incapaz de evoluir para uma riqueza também cívica, que transforme a administração da metrópole paulistana num modelo de eficiência político-administrativa que inspire outros Parlamentos e mesmo o Congresso Nacional.

A passividade política impera, determinada provavelmente pela vexatória história da política brasileira, desde a corrupção endêmica da Velha República, passando pelo amordaçamento da ditadura militar, culminando na corrupção endêmica (e mais despudorada) da Nova República.

A Câmara de Vereadores de São Paulo é o termômetro. Se não melhoramos a política no centro mais avançado do país, mesmo após a revelação de tantos escândalos e até cassações e prisões de vereadores, seremos ainda Terceiro ou mesmo Quarto Mundo na política.

Se os paulistanos não conseguem ter um Parlamento minimamente digno, pobre Brasil.

Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos Dinheiro (2004-2010) e Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha Online às quintas.

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