Pensata

Sérgio Malbergier

24/04/2008

De volta para o futuro

O Brasil encontra-se em circunstâncias impensáveis há cinco anos.

Quanto mais aproximamos o marco zero do lusismo, a primeira posse, de hoje, mais vemos como o presidente superou expectativas. Para ficar em dois números: o índice Ibovespa foi de 11.600 pontos em 2 de janeiro de 2003 para acima de 60.000 agora; o dólar despencou de R$ 3,4 para R$ 1,7.

Claro, Lula, o temor que ele gerava nos atores econômicos capitalizados, era parte do problema. A solução foi torná-lo presidente, domesticá-lo num jogador que respeita as regras do jogo (econômico, especifique-se).

Isso bastou para criar algum consenso. E isso bastou. O Brasil cresce mais que a média mundial nas previsões do FMI para este e o próximo ano.

Descobrimos, parece, petróleo abundante no momento em que as reservas globais decaem e nações emergentes precisam do combustível para emergir, explodindo o preço do barril. Lideramos colheitas e rebanhos em escala global de novo no momento de pico de seu valor. Somos líderes em minério de ferro, em biocombustíveis. Os bancos estão fortes em plena crise financeira. Nossas Bolsas se unem e criam poderosa alavanca para empresas e produtos. O mercado interno ganha tração com avanço de renda na base da pirâmide. O crédito cresce.

A riqueza do país brota quase apesar dele. Pois está tudo desorganizado, as agências reguladoras estão desreguladas, a política nunca pareceu tão corrupta, a Justiça é ineficaz, os impostos estão altíssimos.

Mas anos e anos de estabilidade com relativa responsabilidade fiscal, só isso e nossa grandeza pela própria natureza, trouxeram o milagre de volta. Crescemos menos, porque a base industrial já temos. Mas crescemos, e novamente os caminhos se abrem. Os anos 1970 vislumbraram rumos grandiosos, mas nossa falta de rigor, o atraso cívico-intelectual, a tampa da ditadura, a corrupção e as idéias ruins nos deixaram na estrada. Ao invés de uma Austrália, nos tornamos um Brasil.

O destino bate à porta uma segunda vez.

E o que fazemos?

Os mesmos defeitos nos seguram, a tolerância exagerada com a corrupção e com a ineficiência, o atraso nas idéias, a tradição de colocar as pessoas erradas nos lugares errados para tomarem decisões erradas.

Por exemplo, deixamos a Agência Nacional do Petróleo nas mãos de Haroldo Lima, do PC do B. A agência destinada a regular o mercado petroleiro brasileiro no seu momento mais importante nas mãos do comunista que outro dia assoprou ao mundo inadvertidamente que a Petrobras teria feito outra megadescoberta do ouro negro. E depois ainda atacou a Bolsa de Valores e a Comissão de Valores Mobiliários.

Haroldo Lima é o perfeito homem errado no lugar errado na hora errada. Brasília e Brasil estão cheios deles. Podemos mais uma vez ficar só olhando o futuro passar.

Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos Dinheiro (2004-2010) e Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha Online às quintas.

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