Pensata

Sérgio Malbergier

30/07/2009

Eu quero o meu busão!

O povo de São Paulo finalmente saiu às ruas para protestar.

Não. Não foi para pedir a saída de José Sarney da presidência do Senado. Mas para que a Prefeitura de São Paulo suspenda as restrições à circulação de ônibus fretados.

No Brasil é assim. Não existe o nós brasileiros, que precisamos acabar com esse sistema político podre e anacrônico que nos atrasa e nos explora. Só existem eus. Cada um por si, e os políticos contra todos.

O protesto em São Paulo é raro. De trabalhador classe média, que nunca pensou em fechar grandes avenidas na hora do rush. Ao contrário dos protestos de favelados nas marginais paulistanas, sempre dispersados na pancada, os sem-ônibus puderam expressar pacificamente seu desespero compreensível.

A cidade não oferece transporte coletivo eficiente (apesar dos orçamentos gigantescos do Estado e da capital paulistas oriundos de suas pesadas cargas tributárias). Assim, criou-se uma rede semiclandestina de ônibus fretados que ligam com mais rapidez e conforto periferias a grandes pólos de serviços da cidade, como Paulista, Berrini e Faria Lima.

É um caso típico. Do que há de melhor e pior. De um lado, políticas públicas lentas, fracassadas, sempre acompanhadas de denúncias de corrupção. Do outro, a enorme capacidade nacional de contornar dificuldades resultantes do fracasso público.

Em São Paulo, esse "soft power" brasileiro transforma-se em empreendedorismo capitalista, como mostra a explosão do serviço dos fretados. Mas a exploração desse nicho vem cheia de irregularidades, que agora o prefeito Gilberto Kassab quer regular.

É daquelas disputas onde os dois lados têm razão.

Ruth Silva, analista de recursos humanos que trabalha há mais de dez anos na Berrini, aonde o metrô não chega, disse à Folha: "Os usuários dos fretados são aqueles que sempre chegam na hora, faça chuva, faça sol, tenha greve de ônibus ou de metrô. E é essa confiabilidade que o prefeito Kassab quer que a gente perca".

Kassab, que levantou a cidade com a Lei Cidade Limpa, admite reestudar algumas restrições, que parecem ter sido decididas sem o devido estudo. Mas a necessidade de regular o serviço é evidente. E os choques de ordem que Kassab tenta promover podem ser o começo de uma imprescindível melhor organização urbana.

Quando a classe média brasileira sai às ruas, os políticos devem se preocupar, descobriram Fernando Collor e João Goulart.

Só quando, ao invés de ônibus fretados, ela exigir políticos minimamente honestos e o fim da impunidade, o Brasil poderá mudar de patamar de desenvolvimento. É a política, estúpido!

Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos Dinheiro (2004-2010) e Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha Online às quintas.

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