Pensata

Fernando Canzian

19/03/2007

Fora Bush?

É inacreditável a cara de pau e a insistência com que a nossa classe política teima em querer torrar dinheiro público.

Nem três meses se passaram desde a proposta indecente de quase dobrar os salários dos parlamentares, fala-se agora em um reajuste de 28% para a verba de gabinete dos deputados. A verba, para contratação de assessores e parentes, pode subir de R$ 51 mil para R$ 65 mil ao mês, por parlamentar.

Seriam 225% de aumento nos últimos dez anos, para uma inflação acumulada de 91% no período. Um escárnio, considerando que cada deputado (são 513) já custa à sociedade cerca de R$ 100 mil por mês.

Com exceções, infelizmente a classe política no Brasil vai se tornando inimiga do povo a cada legislatura. Párias ao avesso, promovem desvios, politicagens que beiram o suborno e não oferecem nenhuma punição entre eles.

Nesse caldo, agora surge de dentro da Comissão de Constituição e Justiça do Senado a proposta do senador Edison Lobão (PFL-MA) de se fazer um plebiscito para a criação do Estado do "Maranhão do Sul". Com uma Assembléia Legislativa novinha em folha e mais vagas de deputados para o contribuinte carregar nas costas.

"Tenho dito que, quando temos um filho e esse filho deseja a independência, não devemos impedi-lo", disse o senador José Sarney (PMDB-AP) sobre a proposta. Tenha dó.

Só entre os 5.565 municípios brasileiros já são gastos por ano cerca de R$ 10 bilhões para manter atividades consideradas puramente "políticas". Em muitos casos, salários de prefeitos e vereadores só são suportáveis porque as cidades recebem repasses da União. Não há "independência", só trouxas aqui pagando a conta.

Segundo estudo feito pelo Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), mais da metade das cidades (57%) usa parcelas superiores a 21% da receita para sustentar esse "custo político". Muitas seriam inviáveis se tivessem que bancar esse custo sozinhas.

E agora querem mais um Estado? Para quê?

Todos os gastos relacionados ao "bom funcionamento" do setor público já vêm subindo a uma velocidade estarrecedora.

As despesas com salários no Poder Judiciário cresceram quase seis vezes mais do que a média do funcionalismo federal entre 1995 e 2005. No Legislativo, duas vezes mais. No Ministério Público Federal, cinco vezes. O Judiciário empregou 28% mais pessoas no período. O Legislativo, 45%; o Ministério Público Federal, 59%.

O negócio não tem fim.

Enquanto só olham para a própria carteira, os nobres parlamentares e o próprio Executivo simplesmente se esqueceram de uma importante medida do PAC para tentar conter o gasto público: limitar o aumento anual da folha de salários do funcionalismo à inflação acrescida de um reajuste real de 1,5% ao ano.

Simplesmente não se fala mais no assunto. Morreu. Acabou.

Paga a conta o contribuinte e as empresas que ralam no Brasil, onde a carga de impostos sobre a sociedade já se aproxima de 40% do PIB.

E o povo gentil, quando sai à rua para protestar, é para reclamar do Bush.
Fernando Canzian, 40, é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Escreve semanalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.

E-mail: fcanzian@folhasp.com.br

Leia as colunas anteriores

//-->

FolhaShop

Digite produto
ou marca