Pensata

Vinicius Mota

27/03/2005

Um governo da inclusão

A pesquisa CNI/Ibope divulgada na semana passada mostrou que o favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva para reeleger-se no ano que vem ficou menos pronunciado. O raio de intenções de voto no petista, que variava de 42% a 49% em novembro, passou a oscilar entre 39% e 43% em março. O que era piso praticamente tornou-se teto em questão de quatro meses, e as chances de vitória de Lula num primeiro turno hipotético de numa eleição que hipoteticamente fosse disputada hoje ficaram menores.

A pouco mais de ano e meio das eleições presidenciais de 2006, prognósticos com base nesses números valem nada, embora a repercussão dos resultados da pesquisa já cause algum rebuliço de preocupação nas hostes governistas e de agitação em alguns partidos de oposição.

Tudo somado, o pefelista Cesar Maia, o prefeito do Rio agora numa autêntica razia com o Planalto por conta da intervenção federal nos hospitais cariocas, foi o fator que modificou o cenário. Intensivamente exposto na mídia pelo PFL, era de esperar que Maia engordasse nas intenções de voto. A cautela recomenda esperar alguns meses de "normalidade" para atestar se o patamar eleitoral do prefeito de fato se solidificou num nível mais elevado ou se vai murchar tanto quanto inflou.

Mas, olhando para outros números da mesma pesquisa, surge uma associação de movimentos mais intrigante.

Uma hipótese plausível para a consolidação da estratégia reeleitoral de um grupo governante é a da interiorização, no sentido amplo, da sua base de votantes. Tende a obter mais apoio em cidades menores, no interior do país, de gente de menor renda e escolaridade. O fato de o PT ter sido defenestrado das prefeituras de São Paulo e Porto Alegre, de não ter vencido em nenhuma capital do Sul e do Sudeste exceto Belo Horizonte no pleito de outubro passado e de ter sido derrotado em cidades médias importantes como Santos, Ribeirão Preto e Campinas, enquanto avançava na conquista de prefeituras de cidades menores e menos influentes, pareceu mesmo corroborar essa transição.

A evolução da avaliação do governo Lula registrada agora pela sondagem CNI/Ibope confirma parcialmente essa impressão quando mostra que, nas cidades com mais de 100 mil habitantes, a gestão federal tem avaliação (36% de "ótimo e bom") ligeiramente abaixo da média nacional (39%). Não registra, porém, variação significativa entre as regiões do Brasil. No Sudeste, por exemplo, o governo obtém os mesmos 39% da média brasileira.

Uma série de outros itens pesquisados, entretanto, mostra que, entre os mais pobres, os menos escolarizados, os que vivem em municípios pequenos, os que vivem no Nordeste, e os menos instruídos, caiu a aprovação à administração federal em relação à pesquisa de novembro.

Nas cidades de até 20 mil habitantes, se a aprovação do governo (43%) ainda fica acima da média, o saldo dessa avaliação (porcentagem de "ótimo e bom" menos porcentagem de "ruim e péssimo") caiu oito pontos percentuais em quatro meses. Fenômeno semelhante ocorreu entre os cuja renda familiar mensal não ultrapassa 1 salário mínimo --queda de sete pontos percentuais no saldo da avaliação-- e entre os que estudaram até o ensino médio. Ocorre fenômeno inverso nas periferias das grandes cidades: a aprovação (34%) fica abaixo da média, mas seu saldo recuperou-se cinco pontos percentuais de novembro para cá.

Na outra ponta da estratificação social, só alegria. Dos que vivem numa família que recebe mais de 10 salários mínimos mensais, 48% aprovam o governo e, entre os que têm pelo menos ensino superior completo, esse índice também é bem acima da média: 47%. Nos dois casos, o saldo da avaliação do governo aumentou de novembro para cá, enquanto a média nacional oscilou três pontos percentuais para baixo.

Para usar a terminologia simplista da moda, os incluídos gostam acima da média e mais do governo Lula, enquanto os excluídos gostam menos. É uma tendência? Só o tempo dirá. Mas é deveras curioso.
Vinicius Mota, 33, é editor de Opinião da Folha (coordenador dos editoriais). Foi também editor do caderno Mundo e secretário-assistente de Redação da Folha. Escreve para a Folha Online aos domingos.

E-mail: vinicius.mota@folha.com.br

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