Pensata

Vinicius Mota

25/06/2005

Um painel da crise

Hoje dou a palavra aos leitores. Recebi mais de 120 mensagens sobre as indagações que fiz na coluna anterior a respeito da crise por que passa o governo federal.

A minha impressão geral foi a de que as pessoas que me escreveram estão muito bem informadas a respeito do tema e elaboram respostas bastante articuladas, sofisticadas mesmo, para interpretar o que se passa.

Expressam, portanto, um altíssimo grau de compreensão do fenômeno. De praticamente todos os textos emana a gravidade dos acontecimentos.

Agradeço profundamente a cada um que dedicou parte de seu precioso tempo na semana passada para me escrever, embora nem todos estejam mencionados no painel abaixo.

Para compô-lo, busquei preservar a diversidade dos argumentos que me foram enviados, que muito freqüentemente foram além do embate mais simples entre sim e não, ou de um confronto cru entre simpatizantes da oposição e da situação. Este painel não tem pretensão nem validade estatística. Utilizei apenas as mensagens cuja publicação foi autorizada pelo autor.




Sobre a credibilidade de Roberto Jefferson

"Acho que o Roberto Jefferson foi convincente, pois a história toda está muito bem montada. Ele indica os nomes das pessoas que administram o caixa dos partidos, quem manda nos partidos e como está montado o esquema. E, principalmente, porque ele, Roberto Jefferson, ou foi alijado do esquema ou foi prensado na parede para ser boi de piranha para a opinião pública... e ele não aceitou esse destino que lhe impuseram. Imagino que ele deve ter pensado: 'Se vou eu, vão todos comigo'."
Eduardo Mammini

"Ele não é convincente nas suas denúncias . Sua atitude parece ter sido preparada para afrontar o governo federal e tirar o foco das investigações das denúncias nos Correios envolvendo o deputado Roberto Jefferson. Suas denúncias estão repletas de ódio e vingança."
Eduardo Hildebrand Araújo

"Uma sucessão de matérias jornalísticas havia abordado o assunto anteriormente, sem maior credibilidade por falta de provas palpáveis. Agora, um 'insider' do esquema pôs a boca no trombone. Sua articulação 'alive' foi extremamente persuasiva. Nesse caso, o 'feeling' das massas opinativas é muito importante, e esse 'feeling' aponta para uma testemunha crível de Jefferson. Acreditei, como milhões de outros, em suas palavras."
Christian Smera

"Roberto Jefferson é um cantor de terceira categoria e um artista de quarta. Não teria capacidade de sustentar um depoimento, de tão longa duração, perante as principais raposas do Parlamento, se grande parte daquilo que disse não fosse a mais pura verdade."
Frutuozo Barros Gonçalves

"A impressão é que ele é mais bem articulado ao defender a existência do mensalão do que convincente quanto às provas (documentais, testemunhais etc.), mas um não exclui o outro no jogo de cena, pois novos fatos certamente virão à tona no curso da CPI, como um complicador para o governo."
Tito Schmitt, de União da Vitória (PR)




Sobre a participação de José Dirceu

"Sinceramente não creio que isso seja verdade. A biografia de José Dirceu revela um homem honesto e disposto a combater os que flagelam a República. Porém, ao mesmo tempo, seus conchavos para conseguir conquistar e manter o poder, suas alianças com partidos e políticos pouco confiáveis alimentam a incerteza sobre sua integridade."
Valentim Salemma de Almeida

"Até prova em contrário, José Dirceu é o principal suspeito porque era o homem forte da política cotidiana do governo e a forma como tratou o caso Waldomiro Diniz demonstra como não convence a opinião pública de sua inocência. Deve ser investigado para que se comprove ou não a sua inocência, mas a avalanche de denúncias dá a impressão de que sua inocência é bem improvável."
Evandro Lucas Faleiros, de Brasília (DF)

"Não. A convicção vem das provas, e não apenas do testemunho de uma pessoa. Não concordo que o testemunho é a rainha das provas (parece até coisa da ditadura)."
Paulo Sérgio Vieira, de Vitória (ES)

"Dirceu é politicamente ambicioso, não tem vida privada importante (tudo pelo partido), é obstinado, tem um viés autoritário e antidemocrático, é centralizador e tem um projeto de poder e de permanência nele por longo tempo. Penso que para ele a luta armada ainda não terminou, só está num estágio 'banho maria, sem sangue'."
Adolfo Moreira Santos, de Três Corações (MG)




Sobre a motivação da crise

"A 'crise' não tem um motivação primária. É a soma de alguns ingredientes que dentro do caldeirão ameaça virar um caldo de difícil digestão. Entre esses ingredientes colocaria os seguintes: o ressentimento da derrota; a disputa acirrada em São Paulo; o excesso de poder em mão de Dirceu, que de certa forma incomodava muito, até mesmo dentro do PT; a desmoralização do PT, jogando todos na vala comum; ações intricadas, principalmente da Policia Federal, que viraram uma caças às bruxas; a eleição de Severino Cavalcante"
Ademir Tamanini

"A crise só foi detonada porque o governo se viu engolido pela sua própria armadilha. Ao cooptar apoio à soldo, viu os custos serem inflacionados e, conforme reza a lei da oferta e da procura, a demanda faz o preço. '...30 mil... por que não 50? Afinal nosso apoio é precioso...' Na intenção de eliminar esse foco de insubordinação, o governo buscou aniquilar as lideranças pouco afinadas, daí o surgimento do caso dos Correios, Marinho e os R$ 3.000, o resto, Jefferson já disse..."
Osvaldo Barbosa, de Salvador (BA)

"O Roberto Jefferson foi colocado na berlinda pela 'trupe' de José Dirceu no escândalo dos Correios e sabia que estava, em decorrência, com o mandato perdido. Resolveu sair atirando. O pior é que sabia em quem atirar..."
Décio Ferreira Pedrosa, de Belo Horizonte (MG)

"Ausência total de articulação política do governo. Culpa exclusiva do presidente"
Anna Karenina Ross

"A motivação da crise é política. Visa as eleições do ano que vem e acho que a mídia está fazendo o jogo da oposição"
Eduardo Guimarães, de São Paulo (SP)

"A disputa pelo Planalto. Basicamente o mesmo motivador de tantas movimentações 'éticas' do PT ao longo de toda a década de 90. Agora é a vez da oposição. Ao contrário do que pensa o PT, isso não se chama golpismo. Se chama democracia. A natural disputa pela alternância na ocupação do poder."
Eduardo Bisotto

"Somam-se três fatores: a falta de articulação política do governo; o excesso de uso de cargos de confiança como moeda de troca; e, principalmente, o sistema político brasileiro, que faz com que o eleitor formalmente vote num partido e/ou num candidato de um partido mas que, após a eleição, entrega o cargo à 'pessoa física' (ou seja, a cadeira não é do partido, é da pessoa e acaba virando moeda de troca)."
Gabriel Tavares

"Fortes suspeitas de corrupção no governo com um ingrediente a mais: a sensação generalizada de que o governo é ineficiente em muitas áreas."
Ivan França

"A motivação da crise tem variados ingredientes, mas acredito que o principal seja a tentativa do Roberto Jefferson de passar de vilão, no caso dos Correios, a vestal, fazendo um mea-culpa e denunciando os podres da política. É claro que há interesses político-partidários e pessoais de todos os participantes do imbróglio, de dentro do governo, do PT, da base aliada e da oposição."
Carlos Landini

"A principal motivação é lógico que é o projeto de poder do PT, pois, até agora não governou só pensou na reeleição de Lula, visando garantir emprego para petista incompetente e sem escrúpulos com a coisa pública."
Luiz A. V. Nerto

"Sem dúvida as eleições de 2006. Mas isso não invalida a necessidade de se aproveitar essa chance para uma grande limpeza ética e, talvez (será?), tentar fazer a tão necessária reforma politica."
Moisés Lima Dutra




Se o projeto de reeleição de Lula será afetado

"Sim. Entendo que muitos anos serão necessários para que o PT (Lula e companhia bela) se refaça desse nocaute. Por melhores que sejam as explicações, mesmo que haja absolvição na Câmara, no STF, seja onde for, na cabeça das pessoas do público a imagem do quebra cabeças estará incompleta, faltará uma peça. O povo custa a acreditar, mas, quando acredita, já julgou, independentemente de provas ou de ouvir os acusados."
Felisberto Q. Carvalho

"Não, quanto ao resultado. Continuo acreditando que Lula se reelegerá. Sim, quanto à forma. Talvez de maneira positiva. Torço para que Lula pelo menos reestruture seu projeto de reeleição e, oxalá, resgate posições históricas e reduza o pragmatismo que vitimou o PT."
Walter Gimenez de Mattos

"A crise politica afetará uma das principais bandeiras do PT, que é a de incorruptível. Apesar disso afetar a credibilidade do partido acredito que, tomando ações corretas, como isolamento do problema, e continuando com o projeto de crescimento da economia, dificilmente Lula irá perder a reeleição"
Daniel Goretti

"Considero que a crise não vai afetar a reeleição. O povo tem a memória curta, estão tentando afastar o Lula do PT, considerando como se um não fosse conseqüência do outro e como se ele fosse realmente inocente. Político inocente? ainda está para nascer e talvez nunca nasça. Além do mais, o povo é muito influenciado pela imprensa e aqui mesmo em meu Estado o governo tem bombardeado, nos horários nobres, repetidas propagandas dizendo da 'honestidade do PT'."
Rosa Helena Torres

"Não. O capital político do presidente é impressionante. Faz uma uma boa condução da economia, tem uma postura digna (que é o que o povo brasileiro mais valoriza) embora resvale na política (o que surpreende - imaginávamos que teria mais dificuldade na economia e menos na política). O presidente começou a errar quando limitou Dirceu na condução política do seu governo: ou fazia pessoalmente ou deixava Dirceu; não escolheu nenhuma das alternativas."
Larry Cassol Argenta

"Acho que sim, pois a imagem que é passada é que o governo Lula é inoperante, ineficiente e despreparado"
Murilo Lacerda Yoshida, de São Carlos (SP)

"Ainda é cedo para responder esta pergunta. Se Lula for capaz de se desvincular das más influências que o cercam, ter força para não deixar que impeçam o procedimento das investigações e proporcionar as trocas de indicados políticos por profissionais de carreira para presidirem algumas estatais, acho que ele conseguirá aumentar as chances de reeleição."
Nelcio Antonio Tonizza de Carvalho

"Não, porque embora tenha acordado tarde, ainda é possível o presidente recuperar o tempo perdido, com uma reforma ministerial de verdade. O presidente Lula, por ter vindo de baixo, ser um homem de origem humilde e não se ter envolvido com as maracutaias do seu partido, o PT, ainda goza de prestígio suficiente para ser bem sufragado."
Eldon Canário

"A crise vai afetar profundamente o projeto de reeleição de Lula, porque, embora seja o mais inocente na balbúrdia, não tem força para modificar o quadro caótico que se criou, e isso será inteligentemente usado pela oposição, de agora até as eleições."
Tiretu Frota
Vinicius Mota, 33, é editor de Opinião da Folha (coordenador dos editoriais). Foi também editor do caderno Mundo e secretário-assistente de Redação da Folha. Escreve para a Folha Online aos domingos.

E-mail: vinicius.mota@folha.com.br

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