Pensata

Valdo Cruz

30/01/2007

Lula, o primeiro derrotado

Luiz Inácio Lula da Silva queria apenas um candidato governista a presidente da Câmara dos Deputados. Marcou até data --dia 20 de janeiro-- para que fosse ungido um nome, aquele que estaria predestinado a comandar aquela Casa pelos próximos dois anos. Chega ao dia da eleição num cenário bem diferente do imaginado, com dois candidatos oriundos da base governista e mais um da oposição. Quem vai ganhar? Difícil cravar. Pode ser Aldo Rebelo (PC do B-SP) ou Arlindo Chinaglia (PT-SP), com um espaço, pequeno, para uma surpresa tucana --Gustavo Fruet, do PSDB do Paraná.

Um derrotado, porém, já é conhecido: o presidente Lula. Não será uma derrota acachapante, daquelas que deixam estragos enormes, mas será um revés. Afinal, seja quem for o vencedor, o novo presidente da Câmara terá uma esfera maior de autonomia em relação ao governo federal.

A candidatura petista de Arlindo Chinaglia foi imposta ao Palácio do Planalto. Faz parte da estratégia petista de abrir mais espaço dentro do governo Lula, numa aliança com um grupo do PMDB também em busca de mais poder dentro da sigla. Ganhando, vai representar mais pressão sobre o Planalto na hora de definir a reforma ministerial.

Aldo Rebelo contava com a simpatia de Lula. Sentiu-se abandonado no meio do caminho. PSB e PC do B, aliados históricos do presidente, acusaram o golpe e definem o desfecho com duas candidaturas como traição. Vencendo, Aldo terá superado Chinaglia com ajuda da oposição. Ganha mais liberdade em relação ao governo e assume mais compromissos com pefelistas e tucanos.

Sem falar na possibilidade, remota mas não impossível, de a disputa entre dois governistas acabar favorecendo o tucano Gustavo Fruet. Nem de longe ele é um Severino Cavalcanti, mas seria um desastre ainda maior para o governo Lula do que o protagonizado pela vitória do ex-deputado do PP de Pernambuco.

Em resumo, o governo de coalizão estréia com uma colisão, cujo saldo de feridos ainda não é possível dimensionar. Lula poderia ter evitado esse acidente de percurso se tivesse definido desde o início quem era realmente seu candidato. Inegável que tinha simpatia pelo nome de Aldo, mas não fez movimentos significativos para bancar sua candidatura. Quando Arlindo Chinaglia se lançou, pediu ao PT para não se meter em uma nova aventura. Mas deixou o barco singrar pelo rio. Quando acordou, o mar já estava próximo demais. Não conseguiu impor seu desejo de candidatura única dos governistas. Repetiu o mesmo erro.

Lula tem a reforma ministerial para curar as feridas resultantes da eleição da Câmara dos Deputados. Bem ministrado, é um santo remédio, capaz de ressuscitar até desenganados --o quase oposicionista pós-eleição da Câmara pode se transformar no governista mais ferrenho pós-montagem do novo ministério. Esse é seu trunfo. A dúvida é se haverá ministério suficiente para agradar a todos. A conferir.




Para registrar

Aliados de Arlindo Chinaglia andavam falando abertamente pelos corredores da Câmara que estavam recebendo promessas de cargos no governo em troca do apoio à candidatura do petista. Aldo Rebelo chiou, seus amigos alardearam que o balcão estava instalado e, de repente, ninguém mais fala no assunto.

O silêncio passou a imperar depois que Dilma Rousseff (Casa Civil) visitou o atual presidente da Câmara em sua residência. Ali, garantiu ao comunista que o Palácio do Planalto não havia autorizado ninguém a prometer cargos no ministério do segundo mandato a quem apoiasse o petista Arlindo Chinaglia.

O recuo pode ter duas origens: 1) tinha gente prometendo o que não poderia entregar ou 2) quem andava falando demais recebeu ordem para ficar calado até o resultado da eleição. No Planalto, numa ou noutra situação, a garantia é que não há autorização do presidente para o troca-troca.
Valdo Cruz Valdo Cruz, 46, é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal e atuou como repórter de economia. Escreve às terças.

E-mail: valdo@folhasp.com.br

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