Pensata

Valdo Cruz

07/12/2006

Salário mínimo: puro jogo de cena

Ministros do governo Lula começaram a negociar ontem oficialmente o salário mínimo do próximo ano com as centrais sindicais. O ministro Guido Mantega (Fazenda) insistiu que o valor deve ser de R$ 367, ou seja, R$ 17 a mais do que o mínimo atual.

Puro jogo de cena. O governo sabe que não conseguirá impor esse valor. Terá de aceitar pelo menos R$ 375. Se ficar nisso, já vai ser uma vitória.

O fato é que as centrais sindicais entraram na negociação pedindo R$ 420, sabem que não vão levar, mas não aceitam nada abaixo de R$ 375. Esse número virou piso. Culpa de quem: do próprio governo Lula, responsável pelo encurtamento de sua margem de manobra.

O valor de R$ 375, repudiado agora oficialmente pelo governo, é sua proposta inicial. Foi estipulada ao enviar o Orçamento da União ao Congresso prevendo que a economia cresceria 4,5% nesse ano.

Como precisava arrumar dinheiro para destravar os investimentos públicos, a equipe econômica começou a procurar onde economizar. Lembrou que o cálculo do mínimo de R$ 375 havia sido feito com base num crescimento da economia brasileira totalmente furado.

Aí refez seus cálculos. Baixou a previsão de crescimento da economia de 2006 para 3,7%, mudou a expectativa de inflação e cravou uma nova proposta para o salário mínimo: R$ 367. E divulgou o número como o aumento que poderia conceder sem comprometer as contas da Previdência Social.

Só que, num momento de sinceridade, Guido Mantega chegou a dizer, durante entrevista a jornalistas, que a proposta do governo era realmente R$ 367, mas que sabia que dificilmente conseguiria evitar os R$ 375.

Jogou por terra a estratégia dos negociadores do governo Lula: insistir nos R$ 367, dizer que não era possível chegar a R$ 375 para, depois, oficializar a vitória das centrais sindicais e aceitar um salário mínimo naquele valor.

Mantega foi cobrado internamente. Tanto que voltou a falar só nos R$ 367. Agora, porém, é tarde. O governo entra nas negociações em desvantagem. Sem falar na fase dois, a de negociar no Congresso o valor definitivo do salário mínimo no próximo ano.




Mais baixo

Em tempo: o valor de R$ 367 foi calculado como se a economia fosse crescer 3,7% em 2006. É que o governo havia estipulado uma regra de fixar o valor do mínimo repondo a inflação mais um percentual de acordo com a variação do PIB per capita. Sabe-se, hoje, que até os 3,7% são furados. O crescimento da economia não deve passar de 3%.




Mais erros

Por falar em estratégia errada, o governo Lula começou mal sua caminhada para eleger um presidente da Câmara de sua confiança. Luiz Inácio Lula da Silva não vetou o lançamento do deputado petista Arlindo Chinaglia. Reservadamente, chegou até a gostar da idéia, apesar de preferir a solução de continuidade: manter Aldo Rebelo (PC do B) na cadeira de presidente da Câmara.

No primeiro ensaio, amargou uma derrota ao não conseguir emplacar no TCU (Tribunal de Contas da União) o deputado petista Paulo Delgado. Ganhou a nomeação o pefelista Aroldo Cedraz, ponto para Aldo Rebelo, revés para Chinaglia.

O resultado da votação mostrou que a oposição deve realmente se inclinar pelo nome do comunista na disputa pela presidência da Câmara, que deve contar com o apoio de boa parte do famoso baixo clero, um grupo multipartidário com forte poder na hora de escolher o comandante da Câmara dos Deputados.

Arlindo Chinaglia trabalha para conseguir o apoio de todo o PMDB. Só assim pode continuar sonhando com o posto. O fato é que o governo corre sério risco de reeditar o cenário que levou Severino Cavalcanti à vitória em 2005. Tarso Genro, ministro da coordenação política, porém, diz que não há a menor possibilidade de isso ocorrer novamente.

Tarso diz que fechou um "contrato político" com o PT, com o aval do presidente Lula, de que a candidatura de Arlindo Chinaglia será retirada caso represente risco de derrota para o governo. Diz o ministro que a base aliada terá apenas um candidato. A conferir.
Valdo Cruz Valdo Cruz, 46, é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal e atuou como repórter de economia. Escreve às terças.

E-mail: valdo@folhasp.com.br

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