Pensata

Carlos Heitor Cony

14/10/2003

O Nobel da Paz

Todos os anos, quando são distribuídos os prêmios Nobel, discutem-se os critérios adotados pelos acadêmicos da Suécia para darem aquele suntuoso cheque aos agraciados. O de literatura e o da paz, este dado pela Noruega, chamam atenção, os demais, de química, física e outros setores, são geralmente aceitos com placidez universal, somente os entendidos em cada assunto se preocupam com eles. Mas de literatura e paz, acho que todo mundo entende um pouco e por isso os premiados provocam mais espantos ou aplausos.

Este ano, especulou-se sobre o prêmio da Paz, transformando-o numa espécie de loteria, de jogo do bicho: em Londres,a bolsa de apostas cotou o papa na base de 10 a 1. Parece que João Paulo 2º era o favorito, a meu ver erradamente, porque ele é maior do que o prêmio e se trata de um profissional da paz, um ícone branco que com sua bastante presença simboliza a paz que desejamos.

Acontece que a maioria dos premiados pela Noruega são personalidades que se destacaram na luta pelos direitos humanos, como aquele bispo da África do Sul; pela caridade, como Madre Terezade Calcutá; como Jimmy Carter, que ainda como presidente dos Estados Unidos iniciou uma campanha contra as ditaduras que haviam se instalado no Cone Sul da América Latina, e como ex-presidente, procurou intermediar alguns dos conflitos localizados de nosso tumultuado tempo.

Até o presidente Lula foi lembrado para o Nobel da Paz. Palpite patrioteiro de uma turma que ignora as regras do jogo. Acredito que a mídia internacional pagou mais este mico: o de transformar um prêmio discutível numa indiscutível loteria mundial. No passado, Dom Hélder Câmara esteve para levar o prêmio, merecidamente, mas consta que houve forte pressão contrária do governo brasileiro daquela época. Evidente que os responsáveis pela concessão do prêmio sempre negam qualquer tipo de pressão oficial.
Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças.

E-mail: cony@uol.com.br

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