Carlos Heitor Cony
06/04/2004
Evidente que o futuro a Deus e ao Diabo pertence, mais ao Diabo, em minha opinião. Mas não participo desta paranóia física, embora não tenha votado em Lula nem em qualquer outro candidato a presidente, em 2002.
Os militares estão ressabiados, e com razão. Devem ter mil razões para a insatisfação, os salários baixos e congelados, as condições de trabalho aviltadas pela falta de equipamentos e incentivos.
Mas o perigo que ronda as instituições está se avolumando na própria classe política, que até agora não partiu para o vai-ou-racha porque a classe econômica não está a seu lado. Pelo contrário: não há segmento da sociedade que esteja mais eufórico do que a do capital. Enquanto um banco, uma agência financeira, um intermediário numa jogada no mercado internacional estiverem sendo contemplados com retornos astronômicos, dificilmente a classe política insatisfeita com Lula terá condições de enquadrá-lo num golpe militar ou num impedimento parlamentar tipo Collor.
Contudo, a insatisfação é geral e o temor também começa a ficar geral. Não creio que haja uma conspiração formal, nada que se aproxime disso. Mas a soma dos receios e a frustração popular são elementos que o governo deve levar em conta para mudar de rumo e tentar consertar as coisas.
Neste contexto, os sucessivos trambolhos e escândalos das últimas semanas não chegaram a ser decisivos. Mas abriram uma larga estrada por onde poderão trafegar, inicialmente, as hordas dos sem terra e sem empregos. Depois outras hordas, mecanizadas ou não.
Paranóia nacional
Aqui e ali, ouve-se em voz baixa a confissão de um patriota arrependido, que confessa estar com receio de um golpe institucional antes mesmo do fim deste ano. Ou, em hipótese mais larga, antes do término do atual mandato presidencial.Evidente que o futuro a Deus e ao Diabo pertence, mais ao Diabo, em minha opinião. Mas não participo desta paranóia física, embora não tenha votado em Lula nem em qualquer outro candidato a presidente, em 2002.
Os militares estão ressabiados, e com razão. Devem ter mil razões para a insatisfação, os salários baixos e congelados, as condições de trabalho aviltadas pela falta de equipamentos e incentivos.
Mas o perigo que ronda as instituições está se avolumando na própria classe política, que até agora não partiu para o vai-ou-racha porque a classe econômica não está a seu lado. Pelo contrário: não há segmento da sociedade que esteja mais eufórico do que a do capital. Enquanto um banco, uma agência financeira, um intermediário numa jogada no mercado internacional estiverem sendo contemplados com retornos astronômicos, dificilmente a classe política insatisfeita com Lula terá condições de enquadrá-lo num golpe militar ou num impedimento parlamentar tipo Collor.
Contudo, a insatisfação é geral e o temor também começa a ficar geral. Não creio que haja uma conspiração formal, nada que se aproxime disso. Mas a soma dos receios e a frustração popular são elementos que o governo deve levar em conta para mudar de rumo e tentar consertar as coisas.
Neste contexto, os sucessivos trambolhos e escândalos das últimas semanas não chegaram a ser decisivos. Mas abriram uma larga estrada por onde poderão trafegar, inicialmente, as hordas dos sem terra e sem empregos. Depois outras hordas, mecanizadas ou não.
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Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças. E-mail: cony@uol.com.br |
