Pensata

Carlos Heitor Cony

09/11/2004

A infâmia e a inveja

Não sei como andam as tentativas de se organizar, legal e moralmente, as possibilidades criadas pela informática e pelo uso indiscriminado da Internet. Do ponto de vista tecnológico, é evidente que os avanços são quase diários, tornando mais eficiente e generalizado o veículo que está criando uma nova era na comunicação humana.

Contudo, os abusos também explodem quase que diariamente. Qualquer débil mental pode criar e manter um site, que contamina outros débeis mentais que nada sabem de nada e bebem as baboseiras que lhes parecem as tábuas da lei contendo a verdade e o bom gosto.

Outro dia, um amigo ficou mais do que confuso. Por acaso, leu num desses sites que eu havia sido defensor do regime militar e dele beneficiário.
Por Júpiter! Durante aqueles anos, fui preso seis vezes, tive a casa arrombada e depredada, duas filhas menores quase seqüestradas (a diretora do colégio onde elas estudavam impediu a violência) respondi a mais de oito IPMs, tive sentenças no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal Militar, fui processado pelo ministro da Guerra, que mais tarde foi presidente da República, fui obrigado a passar uma temporada em Cuba, viajando pelo mundo como apátrida, perdi empregos e durante anos ninguém me aceitava no mercado de trabalho, com medo de represálias do regime.

Meu amigo me conhecia de outros carnavais, mesmo assim ficou pasmo, não pelas infâmias e besteiras que leu, mas pelo motivo que as ditaram e foram espalhadas, via internet. Sabendo que não sou de responder a imbecis, perguntou se ao menos eu ia explicar alguma coisa. Disse que não. Ele então concluiu, não sei se certo ou errado: "É. A inveja é uma m..."
Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças.

E-mail: cony@uol.com.br

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