Pensata

Carlos Heitor Cony

25/01/2005

Julgando um juiz

Um ministro do Supremo caluniou, difamou e injuriou publicamente um cidadão brasileiro que nada fez além de exigir um direito que a Constituição lhe garante. Seria o caso do cidadão processar o magistrado, mas dificilmente encontraria um advogado que aceitasse uma causa contra um membro do Supremo. Em coletivos de cúpula, como o STF, costuma haver o tal "esprit de corp", o espírito de corpo que muitos chamam de espírito de porco.

Inteirando-se da origem e das circunstâncias do ministro, fiquei sabendo que ao ser indicado para a Suprema Corte, por FHC, o jurista Dalmo Dallari veio a público, acusando-o de graves falhas morais e profissionais, acusações que até hoje não foram desmentidas. O senador Eduardo Suplicy, na sessão do senado que aprovaria a indicação presidencial, pediu vistas do processo, mas o rolo compressor do governo de FHC funcionou.

Contrariando a Constituição, que exige vida ilibada e notável saber jurídico para os ministros do Supremo, Gilmar Mendes foi parar no STF. Como advogado da União nos tempos de FHC, serviu de intermediário do governo para "convencer" congressistas a não aprovarem a CPI que apuraria graves escândalos por ocasião das privatizações. O senador Jefferson Peres lembrou, a propósito da injúria feita por Gilmar Mendes contra mim, que um juiz só pode falar nos autos e após examiná-los.

Não há nenhum auto, nenhum processo contra o cidadão que tem um direito assegurado pela Carta Magna. Sedento de publicidade, Gilmar Mendes expressou uma opinião que lhe é vedada pela lei e pela moral. Como qualquer um, ele poderia opinar sobre o tempo, sobre a fase que o Palmeiras atravessa.

Emitir publicamente um comentário que prejulga uma ação que não chegou até ele porque não existe ação, revela mais do que leviandade, mas despreparo profissional, jurídico e moral.
Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças.

E-mail: cony@uol.com.br

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