Pensata

Carlos Heitor Cony

15/03/2005

Tempos modernos

Semana passada, no programa "Liberdade de Expressão" que mantemos diariamente na CBN, Heródoto Barbeiro, Arthur Xexéo e eu comentamos a bolação de um industrial, aqui no Brasil, que mandou instalar nos banheiros de suas fábricas, um circuito interno de TV, para fiscalizar quantas vezes seus funcionários vão até lá, o que fazem e quanto tempo demoram.

Na minha vez de falar, lembrei que em 1936, há quase 70 anos portanto, Chaplin fez um de seus filmes mais importantes, "Tempos Modernos". Após meses desempregado, Carlitos é operário de uma fábrica onde passa oito horas diárias apertando parafusos que correm numa esteira de produção.

Para aliviar o stress, logo no primeiro dia, vai ao banheiro lavar o rosto. Na parede principal do lavabo, surge um telão com a cara em close do dono da fábrica, perguntando o que ele está fazendo ali, por que não está no seu posto de trabalho. Carlitos dá as desculpas que pode mas o dono ordena que ele regresse imediatamente aos parafusos e comunica que o tempo gasto no banheiro será descontado de seu salário.

Quando Chaplin fez o filme, a tecnologia da época estava longe de permitir que um "Big Brother" qualquer invadisse a privacidade de quem quer seja num banheiro ou em qualquer outro lugar de sua vida pessoal.

Hoje, é cada vez mais possível esta vigilância "full time" em cima dos cidadãos, de todos nós. Certamente, aqui e no resto do mundo, já estão instalados equipamentos como os previstos por Chaplin, que há setenta anos, era apenas uma piada. E que hoje ameaça um tipo de opressão que se tornará mais geral e anti-humana.
Carlos Heitor Cony, 80, é membro do Conselho Editorial da Folha. Romancista e cronista, Cony foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2000. Escreve para a Folha Online às terças.

E-mail: cony@uol.com.br

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