Pensata

Kennedy Alencar

05/12/2003

Heloisa Helena e o PT

A senadora Heloisa Helena (PT-AL) tem todo o direito de discordar das políticas do governo do PT. Tem todo o direito de votar contra. Só não tem o direito de fazer isso ficando no PT e usando a justificativa de que o partido sempre foi contra a reforma da Previdência.

É uma meia-verdade. Setores do PT sempre foram favoráveis a mudanças no sistema previdenciário, especialmente no do funcionalismo público. Sem demonização dos servidores, há evidentes privilégios, como salário integral de aposentadoria.

Não vale o argumento de que ela está sendo coerente com posições do PT no passado. Será que todos os outros parlamentares, deputados e senadores, que votaram a favor da reforma da Previdência são incoerentes? Fizeram-no por oportunismo político no passado, para ficar bem com o funcionalismo, e por pragmatismo cínico agora, para ficar bem com o governo?

Certamente é uma discussão interessante, essa das razões da mudança de posição de amplos setores do PT. Mas o fato é que o partido fechou questão a favor de uma matéria e deu a Heloísa Helena todas as chances de se manifestar contra e votar a favor.

Ela, porém, preferiu ficar com o que chama de sua coerência. É um direito dela. Mas deve estar disposta a pagar o preço de sair do PT ou ser expulsa do partido neste mês. Se o PT perdoá-la, dizem dirigentes moderados, o partido acabará. Nunca mais no exercício do poder central poderá exigir fidelidade partidária de seus membros.

A moderação crescente do PT ao longo dos anos só não foi vista por quem não quis. O PT vem dando uma guinada ao centro desde 1995, quando José Dirceu, hoje ministro-chefe da Casa Civil, foi eleito presidente do partido numa aliança da tendência dele e de Luiz Inácio Lula da Silva com outros grupos moderados do PT. Naquele ano, os moderados tiraram os radicais do comando do partido.

Desde então, a cada eleição o PT vem mudando, sempre rumo ao centro, na direção de políticas social-democratas. O PT insiste que é um partido socialista. Algumas tendências são. Muitos de seus dirigentes têm essa origem. Mas o partido e seu principal líder, Lula, defendem mesmo bandeiras da social-democracia.

Reformar para valer o capitalismo brasileiro, talvez o maior ato revolucionário que o governo do PT possa realizar, deve ser o objetivo do governo.

Daí não haver lugar mesmo para Heloísa Helena e três deputados federais radicais, Luciana Genro (RS), Deputado Babá (PA) e João Fontes (SE), no PT de hoje. Esses radicais acreditaram que a moderação de Lula na campanha eleitoral era pura manobra tática, para ser abandonada no exercício do poder. Para o bem do país, não era.

Vergonha federal

A Folha recorreu à Justiça para ter o direito de averiguar documentos públicos de prestação de contas de deputados federais à Câmara. O presidente da Casa, João Paulo Cunha (SP), pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) para reconsiderar a liminar que permite acesso do jornal aos documentos, que versam sobre comprovação do uso da verba indenizatória a que os deputados federais têm direito.

Desesperado para se reeleger presidente da Câmara, João Paulo quer barrar a divulgação desses documentos. Por quê? Tem medo do que os deputados andam fazendo? Sem coragem e cacife político para bancar uma decisão que possa afetar sua casta, quer jogar sujeira para baixo do tapete a fim de ver se os colegas o julgam um bom companheiro e o reelegem?

João Paulo justifica assim sua atitude: "Li os termos da decisão do Supremo Tribunal e decidi recorrer porque acho que há coisas que precisam cuidadosamente serem tratadas". Certamente não é o interesse público que está sendo cuidadosamente tratado.
Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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