Pensata

Kennedy Alencar

16/04/2004

PT vitamina crise; FHC esquece passado

O PT, cujo Diretório Nacional se reúne neste final de semana em São Paulo, precisa tomar uma decisão: ou assume que é governo ou dá um jeito de romper com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Só não dá para ficar na posição ambígua de dono dos principais postos no governo e de oposição número 1 a Lula.

Nesta semana, o J.P. Morgan, banco de investimentos norte-americano, rebaixou sua recomendação para compra de papéis do tesouro brasileiro. Traduzindo: mandou seus clientes terem mais cuidado na hora de investir no Brasil.

Imediatamente veio uma questão: se o Brasil faz tudo o que o mercado quer (o que não é verdade, mas o que vale é a versão), por que diabos vem esse pessoal demonstrar desconfiança em relação ao horizonte econômico do país?

Certamente não é porque o Brasil "faz tudo o que o mercado quer". É porque o país está sangrando pelo terceiro mês consecutivo (caso Waldomiro Diniz, greve sem fim da Polícia Federal, tradicionais invasões de abril do MST, discussão sobre o reajuste do salário-mínimo num quadro em que o PT é o primeiro a inflacionar o leilão de reivindicações, pressões legítimas de servidores civis e militares por reajustes salariais num momento em que o governo está fragilizado etc. etc.).

Há um caldo de cultura perigoso. E o PT tem contribuído para engrossá-lo. O partido reagiu mal ao caso Waldomiro, pressiona o governo por um reajuste que sabe inviável para o salário mínimo, alimenta o tempo todo o movimento por mudanças na política econômica. Enfim, comporta-se como um partido que tem uma espécie de meio compromisso com o governo e quase nenhum apreço pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho.

E o presidente Lula tem um bocado de culpa nessa história. Está deixando rolar solta demais essa relação "dialética" entre partido e governo, que pode ser muito boa para construir um projeto de chegada ao poder, mas que tende a ser ruinosa para um governo envelhecido com apenas 15 meses de idade.

Um eventual fracasso de Lula será o fracasso do país, mas principalmente do PT. A crise do "JP Morgan", que derrubou a Bolsa e aumentou o risco-país, é fruto de uma crise de credibilidade do governo e do PT.

O roto e o esfarrapado

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tem todo o direito de dar a sua opinião sobre o governo Lula. Mas FHC bem que podia se lembrar um pouco de sua gestão antes de apontar o fraco gerenciamento da atual administração como coisa nova no governo federal.

No primeiro mandato, FHC trocou sua força política pela emenda da reeleição. Entregou-se ao PMDB. A ruína das estradas brasileiras resultou disso. No início do segundo mandato, desvalorizou o real a contragosto. Foi forçado pelo mercado e virou gerente da crise --tudo aquilo que jurou não fazer e ser. O apagão, um desastre gerencial, quebrou a aura de competência do tucanato.

Ou seja, se alguém entende de fraco gerenciamento, ele se chama Fernando Henrique Cardoso.

Uma frase do ex-presidente a interlocutores recentes é bastante simbólica e talvez seja um valioso alerta ao atual governo. "Lula está me copiando em tudo, até nos erros", tem dito FHC a tucanos, peemedebistas e pefelistas que vão a São Paulo ouvir as suas análises sobre o governo petista.
Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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