Pensata

Kennedy Alencar

06/08/2004

Em debate de dar sono, Marta foi o alvo

O debate desta quinta-feira (05/08/04) da TV Bandeirantes foi um tédio só.

Com sete candidatos a prefeito de São Paulo, produziu um embate morno, que dificilmente terá efeito significativo na disputa. A esperada federalização da campanha, com ataques ao governo Lula, não aconteceu para valer.

A prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), foi quem mais perdeu por ter sido a mais atacada. Alvo natural por estar no poder, a petista enfrentou de cara uma inusitada dobradinha entre José Serra (PSDB) e Paulo Pereira da Silva (PDT).

O tucano, magro a ponto de lembrar o ex-vice-presidente Marco Maciel, e o pedetista pareceram fazer jogo casado para atacar a prefeita, perguntando um ao outro sobre emprego e saúde. Pela regra do jogo, previamente fechada entre todas as assessorias, ela não tinha de direito de resposta.

Marta e suas polêmicas taxas (de lixo, iluminação etc.) apanharam de todos.

A prefeita quis dar o troco a Serra, perguntando ao ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) quais as razões do explosivo endividamento da cidade. Ela criticou o ex-prefeito, corretamente lhe atribuindo a paternidade da atual e altíssima dívida paulistana. Mas achou que ele preferiria jogar a culpa nos juros altos dos dois governos FHC (1995-1998 e 1999-2002), o que atingiria Serra, ministro do Planejamento e da Saúde nos anos tucanos de poder federal.

Maluf bateu duro no PSDB, mas lembrou que o PT manteve a política de juros altos quando chegou ao Palácio do Planalto. Foi uma pitada de federalização.

No momento mais marcante, Maluf acusou a prefeita de promover uma gastança (logo ele!). Ao dizer que daquele jeito a população não agüentaria Marta por mais quatro anos, alfinetou: "Não fica brava comigo". A frase de efeito foi uma alusão ao incômodo carimbo de arrogante.

Isso aconteceu no segundo bloco, quando candidato perguntava a candidato.

No terceiro bloco, que teve regras iguais e que acabou tarde (23h45), o debate foi ainda mais entediante, com exceção de uma promessa irrealista aqui e acolá de Maluf.

O quarto e o quinto bloco foram mais produtivos, com perguntas mais incisivas e objetivas de jornalistas.

Um formato com menor número de candidatos, intervenções livres dos candidatos sem tanto apego ao cronômetro e participações pontuais de jornalistas parece ser o mais interessante para o eleitor.

É preciso, portanto, mudar a lei eleitoral, cheia de amarras que tornam obrigatórias as presenças de candidatos sem sal e representatividade, como Ciro Moura (PTC).

A ex-prefeita Luiza Erundina, que costuma se sair bem na TV, não estava numa boa noite. Teve atuação mais apagada do que a dos três principais candidatos: Serra, Marta e Maluf. Demorou a devolver uma resposta dura da atual prefeita à acusação de distribuição de cargos em troca de favores políticos. Nada que vá mudar votos, contra ou a favor.

Será difícil o eleitor lucrar com debates assim. Ganhou quem dormiu mais cedo. Foi dureza, nas considerações finais, bem depois da meia-noite, ver mais uma teatral e desconexa indignação da Doutora Havanir, um clone piorado do correligionário Doutor Enéas (Prona).

Curiosidades

* Marta, Serra e Maluf se esforçaram sinceramente para parecer simpáticos.

* Apesar da ausência de baixarias explícitas, Maluf fez questão de dizer que estava casado havia 49 anos com a mesma mulher. Serra, de modo mais elegante, também investiu no figurino homem de família. Foram ações algo desleais para marcar diferença com uma prefeita que rompeu um longo casamento e enfrentou preconceito e falso moralismo por isso.

* A Bandeirantes vendeu a imagem de debate em horário nobre. Gato por lebre. Começou às 22h15 e terminou depois de 0h40.
Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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