Pensata

Kennedy Alencar

20/09/2002

Guerra eleitoral preocupa FHC

Apesar de concordar em linhas gerais com a estratégia de bater duro em Luiz Inácio Lula da Silva na reta final do primeiro turno, o presidente Fernando Henrique Cardoso tem reparos ao bombardeio contra o petista feito no horário eleitoral gratuito pelo tucano José Serra, seu candidato ao Palácio do Planalto.

Em conversas reservadas, FHC disse que foi um erro o ataque direto ao presidente do PT, o deputado federal José Dirceu (SP). A campanha de TV de Serra estabeleceu relação de causa e efeito entre uma declaração de Dirceu a grevistas e a agressão de grevistas sofrida no ano 2000 pelo governador Mário Covas (SP), tucano que morreu no ano passado.

FHC acha que esse tipo de ataque, suspenso pela Justiça Eleitoral, poderá se voltar contra Serra e o governo. Exemplo: eventual exploração de uma declaração de FHC em que usou a palavra "vagabundos" para criticar regras que permitem aposentadoria precoce foi tida, quando feita, como ofensa a todos os aposentados.

Mais: Dirceu, por ser o político petista com melhor interlocução com FHC e o governo em episódios recentes, deveria ser poupado. Dirceu, por exemplo, se reuniu com FHC nas semanas que antecederam a negociação do novo acordo do Brasil com o FMI e foi o fiador do apoio crítico de Lula ao novo acerto com o Fundo Monetário Internacional. O presidente teme que o petardo atrapalhe eventuais entendimentos na transição, independentemente de quem venha a ser eleito.

A contrariedade de FHC com o ataque a Dirceu foi transmitida ao comando do marketing serrista, que respondeu que "guerra é guerra". E é com o clima de "guerra é guerra" que o presidente está preocupado. Acha que pode sobrar para ele.

Na avaliação de FHC, está correto o embate mais duro com Lula, porque há chance de uma vitória do petista no primeiro turno. FHC julga pouco provável essa hipótese, mas não a descarta e se assustou com o crescimento do petista nas últimas pesquisas, especialmente nos levantamentos internos da campanha tucana. Agora, a propaganda serrista deverá continuar a bater duro em Lula, pois já constatou abalo no público neopetista.

FHC, porém, acredita que a "desconstrução" de Lula deve se concentrar nos aspectos programáticos, como a rejeição do petista à proposta de criar 10 milhões de empregos em quatro anos. Apesar de o PT argumentar que não consta explicitamente do programa de governo, Lula se comprometeu com a cifra em entrevistas.

A exibição de cena da campanha de 1998 na qual Lula fala em 15 milhões de empregos em quatro anos é um tipo de ataque que FHC considera efetivo e de menor risco para Serra.

Na visão do presidente, como aumentou a rejeição ao tucano durante o embate com Ciro Gomes (PPS), a forma de atacar Lula tem de ser bem pensada para evitar que cole em Serra a marca de destruidor, que, em vez de ajudar, pode prejudicá-lo.

FHC têm ainda duas dúvidas: o questionamento à falta de diploma universitário de Lula, desqualificando-o para o cargo de presidente, e a tentativa do tucano de se igualar ao petista no quesito "origem humilde".

Registre-se que o próprio presidente, em conversas reservadas, diz que Lula poderia ter usado os intervalos entre as três últimas eleições presidenciais para maior instrução formal.

No entanto, FHC acha que esse tipo de cobrança pode tornar Lula vítima e permitir contra-ataque na seguinte linha: "Que país foi produzido pelos presidentes-doutores?". A menção à origem humilde de Serra, apesar de verdadeira, pode ser vista como exagerada na comparação com Lula e soar "falsa", crê FHC.
Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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