Pensata

Kennedy Alencar

29/11/2002

A indignação do ministro Parente

Quando criou a Comissão de Ética Pública, o presidente Fernando Henrique Cardoso prometeu tratar com rigor moral inédito a transição de funcionários graduados entre a saída do governo e o seu eventual ingresso na iniciativa privada. O caso do ministro Pedro Parente, um dos homens mais poderosos de Brasília, é um belo exemplo para discussão da eficácia do ato presidencial. Parente, ainda no cargo de ministro, já anunciou que vai trabalhar num dos maiores grupos de comunicação do país, a RBS, do Rio Grande do Sul.

Não se levanta aqui dúvida sobre a honestidade do chefe da Casa Civil. O ministro teve o mérito de tratar de público o que muita gente com acesso a informações vitais e valiosas já tratou na penumbra.

A suspeita, porém, é a seguinte: Parente participou ou não da elaboração da medida provisória número 70, que alterou as regras de controle das empresas de radiodifusão e beneficiou grupos que concentram muitas concessões de radiodifusão? A MP beneficia a RBS.

Parente divulgou nota reiterando que não participou da elaboração da MP. Mais: o ministro das Comunicações, Juarez Quadros, também divulgou nota ratificando a mesma informação. No entanto, a nota de Juarez traz um detalhe curioso. Diz que a MP foi discutida apenas com o secretário-executivo da Casa Civil, Silvano Gianni.

Mas Gianni é homem da confiança de quem? Do ministro Parente?

Quantas outras MPs o secretário-executivo preparou sem o conhecimento do ministro Parente? Isso é um comportamento frequente? Ou foi apenas no assunto específico que poderia levar o ministro Parente a ter de obedecer a quarentena remunerada de quatro meses antes de poder trabalhar na RBS?

O ministro Parente levou quantas MPs que nunca examinou para o presidente Fernando Henrique Cardoso aprovar? Não seria conveniente o ministro da Casa Civil examinar um assunto tão delicado, como esse da concentração das concessões públicas de radiodifusão? Quantas MPs o ministro Parente assinou sem saber do que se tratava? O ministro Parente não lê as medidas provisórias que assina?

Não, não lê.

O próprio ministro Parente disse. "Acho esse assunto muito desagradável. Não tive nenhuma participação na elaboração da medida provisória. Nem sequer li o texto da MP antes de ela ser aprovada pelo presidente da República. (...) Estou chateado, indignado, aborrecido. Apenas levei o texto da medida provisória para o presidente assinar. Quem discutiu esse assunto com o ministro Juarez Quadros foi o secretário-executivo da Casa Civil, Silvano Gianni. Serei prejudicado sem ter culpa no cartório".

Ou seja, ficar "chateado, indignado e aborrecido" etc. e tal é um direito do ministro Parente. Dar explicações mais detalhadas à opinião pública não. Ainda mais de quem deveria ser o primeiro a dar o exemplo.
Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br

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