Pensata

Lúcio Ribeiro

11/06/2003

Foo Fighters, Ibiza: no caminho para o clube

"Because maybe
You're gonna be the one that saves me
And after all
You're my wonderwall"
Oasis, em "Wonderwall"

"I've been looking so long at these pictures of you
that I almost believe that they're real"
Cure, em "Pictures of You"

"In many ways they'll miss the good old days
someday, someday
Yeah it hurts to say but I want you to stay
sometimes, sometimes"
Strokes, em "Someday"

"And I, I just want to be, darling, with you
the music is made that way
My eyes aren't blue
There is nothing I can do"
Blur, em "On the Way to the Club"


Ôla. Sentiu o cumprimento em espanhol. Dá uma olhada no sinal: ¿¿¿
Faz aí no seu teclado, que eu quero ver.
Pois, então. Esta coluna está sendo articulada de Ibiza, Espanha, a terra da música eletrônica e do topless (e tudo less). Mas como nem tudo é alegria meu computador achou de travar uma batalha besta com a internet. O que me fez escrever em um café. Portanto, a coisa aqui vai ser rápida.
Não espere uma coluna extensa, cheia de dicas legais, textos incríveis, informações exclusivas e entrevistas quentíssimas.
Quer dizer, espere só um pouquinho delas.

* a pressa se justifica pela epígrafe do Blur. Estou há poucas horas na cidade e tenho que encontrar "the way to the club".

* não só eu peguei a mania de entupir o começo das colunas com epígrafes como também já adquiri o hábito de repeti-las. Acho que já usei aqui essa do Blur. Mas, sabe como é. Se eu coloco Oasis, tenho que colocar uma do Blur também. Senão dá briga.

* Vamos logo, então. Desculpe o mau jeito com as visitas. Eu já estou saindo fora, mas pode ficar aqui à vontade.

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FOO FIGHTERS EM AGOSTO

Está maluco esperando o Rapture e outras presenças legais no Tim Festival, em outubro?
Antes, em agosto, pode rolar uma surpresa. Você sabe como essas coisas mudam no Brasil, mas de qualquer modo a informação é a de que no final do mês o projeto Kaiser Music vai finalmente anunciar uma atração que realmente vale a pena.
A decentíssima banda americana Foo Fighters deve vir em agosto ao país mostrar a turnê do álbum campeão "One by One". É a segunda vez que o Foo Fighters aparece no Brasil para shows (Rock in Rio 2001).
E é a terceira apresentação de Dave Grohl aos brasileiros, contando a histórica passagem do Nirvana no país, em 1993.
Os shows do Foo Fighters deverão ocorrer na primeira quinzena de agosto, quando o grupo tem uma janela grande em sua tour.
Na época, há um buraco entre o fim da turnê americana e o início da britânica.
Esta coluna assistiu a dois shows da turma de Dave Grohl no ano passado, um deles no colossal Reading Festival, e absurdamente recomenda a mescla de excelentes canções, shows vibrantes e postura gente-fina de cada um dos Foo Fighters.
O grupo costuma começar seus shows com a porrada "All My Life", de derrubar qualquer casa. Dessa música fez-se o clipe padrão mais bacana dos últimos anos.
O segundo single do álbum, a bela "Times Like These", também rendeu outro ótimo clipe e passa correntemente na MTV Brasil.
O Kaiser Music gastou dinheiro para trazer ao Brasil este ano o Rush, o Silverchair e o Roger Pink Floyd Waters, pelo que me lembro. E agora, se é que nada mudou até a semana passada, vai empenhar sua marca na vinda de mister Dave Grohl, o sujeito mais legal do rock mundial. Figas, desde já.

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A CAMINHO DO CLUBE

Este espaço, você sabe, costuma babar ovo para clubes de Londres e Nova York. Só a noite Trash, do clube londrino The End, você já leu o nome umas cem vezes, porque o lugar encanta demais por juntar pessoas legais, clima extracool e, para ajudar, ótimas músicas na pista.
Esta combinação explosiva para a balada perfeita infelizmente é sempre difícil de ver, ainda que por pouco tempo, na irregular noite de rock brasileira.
Pois agora a coluna orgulhosamente apresenta algumas excelentes opções mais acessíveis para conferir essa história de pessoas/clima/som bom ao mesmo tempo. E, melhor, perto de você.
Do recente boom de lugares decentes para ouvir e dançar rock (e na carona da sempre festejada aqui mania de misturar de várias formas rock e eletrônica), tomam forma em São Paulo dois excelentes programas para sair de casa e sacodir feliz o esqueleto.
A noite On the Rocks, do modernoso clube D-Edge (Barra Funda), está conseguindo decolar mesmo sendo às segundas-feiras. Este colunista, que pôde comparecer a duas das últimas três festas pilotada pelo VJ DJ João Gordo, conferiu in loco que o dia mais bocó da semana oferece uma alternativa deliciosa.
Agora o espírito da Trash de Londres baixa mesmo no Xingu, às sextas-feiras. O local, no centrão, onde abrigava o só-para-mulheres Ferro's Bar, não tem o DJ Erol Alkan, mas na pista é possível ouvir a mais antenada mixagem de coisas legais já presenciadas por este colunista em São Paulo.
De Rapture a Audio Bullys a um electro Depeche Mode, o que sai da discotecagem de Liana Padilha e Luca Lauri é coisa muito séria. O Xingu é pequeno, tem a decoração retrô-bizarra do país (parece que você está entrando numa noite de Carnaval), a qualidade do som é excelente. Esse é o lugar.
Como bem dizia o Gugu Liberato, "Viva a noiteeeee".

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STROKES

O pop já morre de saudade dos Strokes e não consegue disfarçar a ausência do brilhante grupo nova-iorquino do cenário pop. Os Strokes, sabe-se, está rebolando para tirar do estúdio sua maior provação, que é o sempre tão complicado segundo álbum de carreira.
Mas enquanto ele não vem...
Resgatei de bobeira, dia desses, o "Is This It", motivado pela aparição da versão dançante de "Last Nite" com vocal feminino (Vitamin C, coluna retrasada). Desde então, ouço o disco inteiro pelo menos uma vez por dia.
O semanário britânico "New Musical Express" dedicou a capa da última edição de maio para a banda do brasileiro Fabrizio Moretti. Mas a única coisa que tinha de material sobre os Strokes eram uma nota sobre... nada. Blablablá sobre a espera do segundo disco, que "talvez" saia no final do ano...

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WONDERWALLS

Há algum tempo correu o zunzum de que Noel Gallagher tinha reconstruído o hino "Wonderwall", do seu Oasis, uma das mais tocantes canções pop dos últimos 10 anos.
Não era o caso da Cat Power, que fez da música uma linda canção de ninar, com sua voz sussurrada e guitarrinha chorosa.
A notícia, segundo publicações inglesas, era de que Noel surpreendeu em algumas apresentações supresas ao tocar o maior sucesso do Oasis depois de tê-la mexido muito e melhorado idem.
Por meio de um leitor bacana, o Leo Galisa, recebi a música e repasso ela para você, que pode conferir tanto a versão do Noel quanto a da Cat Power.
Na minha humilde opinião, a versão original, cantada pelo velho Liam, ainda é imbatível. Vai aqui, ouça/grave e depois me diga o que achou.

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FOGO EM FORTALEZA

Essa foi boa.
Um leitor amigo que mora em Fortaleza, Ceará, disse que já encontrou à venda, em uma loja de lá, a versão nacional "Fire", o disco do grupo americano Electric Six.
Até eu sair do Brasil, no sábado passado, não tinha notícias de que o discaço da banda que é o "Village People liderado pelo Iggy Pop" (essa é da "Spin") estaria nas lojas paulistas. E a Sum Records ainda não tinha dado o sinal verde para o lançamento do CD que tem a bombástica "Danger! High Voltage!", em que o Jack White faz backing vocal.
Engraçado.

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O ROSKILDE É 'NOSSO'

Carlinhos Brown não está só como atração brazuca no festival dinamarquês Roskilde, o mais interessante (não por causa de) agrupamento de bandas boas em festival neste 2003.
Vai ter Brown, Queens of The Stone Age, Blur, Coldplay, Metallica, Interpol, Massive Attack, Erol Alkan.
E vai ter ainda Skank e DJ Dolores e Orchestra Santa Massa.

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RADIOHEAD ENTREVISTA

A entrevista abaixo, feita por este colunista com o baterista do Radiohead, Phil Selway, saiu publicada na Folha de S.Paulo da semana passada. Com algumas alterações, repito ela agora, para quem não a leu na Folha.

Divulgação



* Seja em Moscou, Tóquio, Londres, Nova York ou nas lojas de discos das Grandes Galerias, em São Paulo, a cena pop parou para saudar a chegada do novo CD do Radiohead, lançado
mundialmente na última segunda-feira.
Este "Hail to the Thief", o sexto disco do mais cultuado grupo de rock no mundo, nem chega a ser grande novidade para quem tem o mouse do computador direcionado para a revolução da distribuição de música na internet. Tal disco já é consumido em alta velocidade na rede desde que vazou inteiro, há dois meses, fato que pode ter a polêmica e a importância medidas pela quantidade de capas que mereceu em revistas e jornais de todo lugar, inclusive desta Ilustrada.
Para explicar esse encontro do "Hail to the Thief" real e do virtual ("O disco não estava pronto"), falar do inqualificável som da banda dentro dos rótulos convencionais ("Já ouvi dizer que fazemos rock espacial experimental, seja lá o que for isso") e mostrar desconhecimento quanto à abortada vinda ao Brasil no ano passado, a Folha conversou por telefone, de Londres, com Phil Selway, 36, baterista e fundador do Radiohead.

Folha - Vocês acabaram há pouco uma pequena turnê britânica. Como foi a aceitação das músicas novas por parte dos fãs?
Phil Selway
- Muito boa. Embora a gente já venha tocando várias das canções do novo álbum desde o final do ano passado [turnês em Portugal e Espanha], as músicas estão ficando mais fortes, mais intensas conforme vamos nos apresentando. Algumas, como "The Gloaming" e "Backdrifts', estão ficando mais cruas, enquanto outras mais simples, como "Punch Up at a Wedding", vão indo por um caminho experimental, têm ganhado uma sofisticação natural. Os shows do Radiohead têm sido bem diferentes a cada apresentação. Nós gostamos disso. E acho que os fãs também.

Folha - Como você descreveria o novo álbum?
Selway
- Acho que esse disco é o que mais conseguiu captar no estúdio a energia que o Radiohead leva para o palco. Geralmente cansamos logo do disco de estúdio, mas renovamos nossa alegria de ser uma banda a cada vez que tocamos nossas músicas ao vivo. "Hail to the Thief" carrega elementos do que já fizemos nos outros cinco álbuns, mas é o que melhor captou a felicidade da banda em tocar. Nunca estivemos tão felizes como agora. "Hail to the Thief" consegue, nas letras, ser mais direto, chegar mais nas pessoas, do que "Amnesiac" [2001] e "Kid A" [2000]. E musicalmente considero quase tão bom quanto "OK Computer" [97].

Folha - Que tipo de música pop faz o Radiohead? Como você definiria a linha sonora da banda desde o roqueiro "Pablo Honey" (93), passando pela guinada atmosférica de "OK Computer" e chegando a este "Hail to the Thief"?
Selway
- Bem, nós vivemos juntos como uma banda desde 1985. Inevitavelmente, até como um meio de sobreviver e de nos suportarmos, atravessamos diversas fases distintas. Somos muito felizes em sempre encontrar novos meios de trabalhar, de acordo com o que o pop nos oferece em determinado tempo e espaço. O que não quer dizer que renegamos o barulho que fizemos com "Creep" ou a histeria eletrônica que colocamos em "Paranoid Android" sete anos depois, por exemplo. Nosso desafio é fazer músicas que não fiquem datadas.

Folha - O quanto chateou vocês o fato de o CD ter vazado para a internet?
Selway
- Ficamos bastante desapontados. As músicas nem estavam prontas. O que vazou não era aquilo que queríamos mostrar para o público.

Folha - A versão de "Hail to the Thief" que apareceu na rede é muito diferente da que está no disco?
Selway
- Para a banda, sim. Talvez não para a maioria das pessoas. Se você é músico e ouvir as duas versões, nota a diferença.

Folha - Qual a posição da banda a respeito da troca gratuita de arquivos musicais pela rede?
Selway
- [Pensando muito...] Não somos contra. Não acho que a internet vai matar a música, como a indústria costuma espalhar. É um modo bem eficaz para bandas novas divulgarem seu trabalho. Quando eu era adolescente, diziam que gravar disco em fita cassete ia matar a música. E eu gravei muito disco em fita cassete. E a música não morreu por causa da Basf. Acho que uma revolução como essa dos MP3s sempre força uma mudança das coisas. Mas quando acontece algo como foi com "Hail to the Thief", que nem estava pronto, não acho bom.

Folha - Foi dito aqui no Brasil que o Radiohead tocaria no país no ano passado, estava acertado. Isso não aconteceu devido ao cancelamento do festival (Free Jazz) que traria a banda em outubro. Você confirma?
Selway
- É sério isso? Não fomos avisados, acho, em nenhum momento. Não sei se pode ser verdade, porque nós da banda sempre sabemos onde [os agentes] estão nos levando.
Dificilmente iríamos naquela época, porque ir à América do Sul com uma turnê é complicado e estávamos envolvidos com o novo disco.

Folha - Alguma chance de o Radiohead vir à América do Sul?
Selway
- Sim, temos planos de fazer uma turnê pela América do Sul no próximo ano.

Folha - Qual sua música favorita do novo álbum? E qual a que você mais gosta das que a banda fez?
Selway
- Deste novo álbum a minha preferida é "Sit Down. Stand Up", porque acho que é a que consegue melhor captar todas as fases anteriores do Radiohead. A canção que eu mais gosto dentre todas as que a banda já fez é "Paranoid Android".

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"THERE THERE", A MÚSICA

"Hail to the Thief" nem bem chegou às lojas ainda e sua história já foi vastamente contada. Só nesta Folha o disco já apareceu em notas, colunas, fotos, capas. E volta aqui hoje.
A celebração noticiosa do pré-lançamento evidencia a importância que a banda do esquisito Thom Yorke galgou na cena pop desde que estreou nela no começo dos 90, quando fez um apenas ótimo CD de rock comum, com guitarras estridentes e vocal desesperado.
Em 1997, o Radiohead lançou a obra-prima "OK Computer" e desde então a banda caiu dentro de uma vala de experimentalismos e ruídos eletrônicos para andróide ver, fugindo das guitarras. E a legião de fãs cultuadores da banda só cresceu.
Desde "OK Computer" o pop fica ouriçado a cada vez que o grupo vai lançar um disco, na esperança de o rock "voltar" a ter destaque no som do Radiohead. E "Hail to the Thief", então, pode ser festejado como o CD que promoveu o retorno do rock ao Radiohead. Por causa da excelente "There There". A música tem as esquisitices experimentais do Radiohead, mas também solo de guitarra. Dá até para desconfiar que a canção foi tocada por uma banda comum deste planeta, com guitarra, baixo e bateria. Se você pecaminosamente desconsiderar as 13 faixas restantes, 'There There' -em que Thom Yorke canta: "O fato de você estar sentindo algo não significa que ele exista" - vale sozinha o preço do álbum.

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RADIOHEAD AO VIVO NOS EUA

Marco Lockmann, nosso homem em Nova York, deu uma esticada a Nova Jersey no sábado passado para assistir à apresentação do Radiohead no confuso Field Day Festival. E conta abaixo como foi.

* O Radiohead era a esperança do conturbado Field Day Festival, a tentativa da Costa Leste americana se aproximar da qualidade dos festivais europeus e até mesmo do Coachella, da Costa Oeste. A banda estava em NYC há alguns dias e aparentemente fez um show histórico para uma platéia pequena no Beacon Teather, um especial para a série de TV "MTV $2 bill concerts".
Na espera pelo Radiohead, o telão mostra cenas da platéia, absolutamente irritada e cansada pelas confusões de tirar da troca de lugar do festival e da redução de dois dias de evento para um, isso há dois dias de sua realização e depois de já ter vendido mais de 50 mil ingressos.
Entra Thom Yorke no palco, a chuva que caía para "ajudar" mais de repente pára e a banda emenda as musicas de "Hail to the Thief", como se fossem um único mantra a tomar conta do do Giant Stadium. Difícil falar de uma música só: "Myxomatosis" ao vivo desestabiliza, "Pyramid Song" e aí "Idioteque" e "Paranoid Android" deixam o público atônito. E em "2+2=5", cheia de guitarras, Thom Yorke chuta o ar e dança freneticamente.
A sensação de estar tendo "a fucking good time" é bem diferente da imagem do grupo depressivo do documentário "Meeting People Is Easy".
No final do show e da volta à "realidade", mais chuva, camisetas com a escalação (fracassada) do festival vendidas a preço de banana e grupos protestando (para realizar o festival no Giants Stadium, um evento importante de caridade foi cancelado). Failed Day quase
juntar a frase total, não fosse o Radiohead.

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THE CURE - ENTREVISTA

Período de importantes entrevistas, este colunista falou com o grande Robert Smith, líder do histórico The Cure, a respeito do lançamento do DVD duplo ao vivo, no final do mês.
E aí abaixo vão outros textos que saíram na Folha, para apreciação de quem não teve a oportunidade de ler.

* Contrariando a famosa propaganda, a voz e o cabelo de Robert Smith, símbolo maior da cultura pop "dark" dos anos 80 e hoje um senhor de 43 anos, continuam os mesmos.
A voz está ainda mais realçada pelo punhado de bandas novas que soam como se no microfone estivesse um Smith de 20 anos.
E o cabelo? "Está sempre do mesmo jeito, armado para cima", disse, por telefone, de Londres, o próprio príncipe inglês dos casacões pretos que marcou o pop com músicas umas de cunho denso, sorumbático, e outras tão alegres como estar apaixonado às sextas-feiras.
Não que o rock atual esteja doente, mas de todo modo a cura está aí. O Cure, um dos maiores fabricantes de hinos da cena inglesa dos anos 80 e que atravessa revigorada presença na música jovem atual mesmo depois de mais de 20 álbuns e uns 25 anos de carreira, prepara um pomposo lançamento de DVD ao vivo. E anuncia que o próximo CD da banda, a chegar às lojas no final do ano, será "quase nu-metal".
O DVD, duplo, que ganhará edição brasileira até o final deste mês, é batizado de "Trilogy". O Cure aproveitou dois concorridos shows em Berlim no ano passado para tocar na íntegra três discos que Robert Smith considera terem uma ligação introspectiva no som e uma correspondência temática (a melancolia) nas letras.
Nas apresentações, já armadas para o DVD que está chegando às lojas, Robert Smith recriou o belo porém funesto clima da fase mais sombria do Cure, de seus três álbuns prediletos: "Pornography", de 1982, "Disintegration", de 1989, e "Bloodflowers", de 2000.
O fã mais ardoroso do Cure pode não achar motivo para gastar em dois DVDs que não contenham hits como "Boys Don't Cry", "Friday, I'm in Love" e "Lovecats", que ainda hoje tocam nas rádios rock brasileiras. Mas a fase gótica está bem representada com 223 minutos de excelentes registros de canções como "The Hanging Garden", "Pictures of You" e "Fascination Street".
O velho Cure está entre nós. Um dos clássicos do começo de carreira da banda, "The Walk", foi ressuscitado nas pistas dos clubes ingleses de rock no ano passado. Neste ano, a voz esticada de Robert Smith pode ser reconhecida quando quem está tocando na verdade são bandas emergentes como a canadense Hot Hot Heat e a nova-iorquina Rapture.
O gosto pelo preto funeral e pelo cabelo "espetado para o alto" pode ser visto em qualquer foto que estampe o pesado grupo AFI e o indie sombrio Black Rebel Motorcycle Club. E o punk blueseiro Jack White, do White Stripes, diz que o Cure ajudou a empurrá-lo para a carreira musical.
O Cure prepara, segundo seu vocalista, guitarrista, compositor e criador, um próximo CD a ser lançado no final do ano. E manufaturado por Ross Robinson, papa da onda nu-metal e/ou rap metal americano. Aí, se isso se confirmar, a pergunta vem inevitável: haverá cura para o Cure?

* Folha - Como está seu cabelo neste momento? "Armado" para cima?
Robert Smith
- Sim, está. Ele sempre está do mesmo jeito, armado para cima. Depois de anos, ele já fica assim sozinho.

Folha - Qual é a idéia por trás deste DVD "Trilogy"? Por que esses três discos em particular?
Smith
- Há duas razões principais para esse DVD ter surgido.
Já faz nove anos que o Cure vem mantendo essa atual formação e nunca gravamos nada ao vivo nem tampouco filmamos alguns de nossos shows. O outro motivo é que, pessoalmente, considero os álbuns "Pornography", "Disintegration" e "Bloodflowers" interligados de certa forma. Eles são amarrados de modo bem especial no clima das canções e na densidade das letras de uma maneira única em todos esses anos do Cure. Se fosse para fazer uma análise dos 25 anos da carreira da banda, diria que esses três discos em particular são os que estão mais fortes na minha memória. E, para que eles fiquem fortes nas memórias das pessoas, resolvi botá-los em filme.

Folha - Depois desse lançamento revisionista, o que se pode esperar do Cure no futuro?
Smith
- Acabamos de assinar contrato com uma nova gravadora e entregamos a produção do próximo disco do Cure para o Ross Robinson, um americano famoso por produzir discos para o Korn, Slipknot, Amen e At the Drive-In. Sim, eu sou fã de nu-metal [risos]. Entre as razões para trabalharmos com Ross, estão o fato de ele ser fã de longa data do Cure e porque achei que seria interessante um cara como ele mexer no som do Cure. Que as pessoas não se espantem se o próximo disco sair quase... nu-metal.

Folha - Após mais de 20 anos, o que você vê quando lembra os tempos do pós-punk no final dos 70/começo dos 80, tocando com Siouxsie & the Banshees e formando o Cure?
Smith
- Eu me sinto um sujeito bem diferente daquele Robert Smith, apesar do cabelo igual. Mas a essência, eu acho, continua a mesma.

Folha - Como as canções marcantes do passado do Cure mudaram para você com o passar dos anos?
Smith
- Hoje me sinto menos ligado às canções do começo da minha carreira. Parece que antes do "Disintegration" (89) eu vivi uma outra vida. Talvez porque até esse disco eu era muito jovem. Quando ouço as músicas dos discos anteriores, com exceção um pouco das do "Pornography" (82), quase não entendo sobre o que cantava.

Folha - Você ainda tem fascinação pela temática gótica, da melancolia, da escuridão? Acha que isso ainda faz sentido no pop?
Smith
- Não acho que o Cure alguma vez chegou a prestar atenção na cultura pop. Nós criamos nosso próprio mundo. Às vezes você cria uma música em um dia ensolarado, mas isso não quer dizer que, por dentro, você não sinta que esteja chovendo sem parar. O que o Cure fez de melhor em todos esses anos foi tocar músicas emocionais com uma forte carga atmosférica, pendendo para o melancólico, que é como eu sempre me senti mesmo nos mais ensolarados dos dias. Ainda hoje me pego gostando mais de músicas do tipo que as pessoas costumam consideram "dark". Eu não ouço Strauss.

Folha - Você gosta da música pop produzida hoje na Inglaterra?
Smith
- Gosto de algumas coisas. Tem sempre pessoas fazendo músicas interessantes. Mas o pop do Reino Unido hoje está bastante diversificado, diluído. Faz tempo que não aparece por aqui algo com cara de movimento. Há pessoas que tentam fabricar uma tendência, um movimento, como fizeram com o britpop no passado. Mas existe hoje muitos estilos diferentes dentro do que é chamado aqui de música pop. Aí fica difícil amarrar isso em um pacote para vender.

Folha - Você conhece uma banda canadense chamada Hot Hot Heat, que está fazendo certo sucesso em Londres agora? O vocalista do HHH canta muito parecido com o jeito que você cantava nos anos 80, não acha?
Smith
- Eu conheço a banda. É realmente parecido. Não sei o que acontece, mas há agora um número grande de grupos que mencionam o Cure de alguma forma, seja no jeito de cantar, seja em inspiração. Eu me sinto lisonjeado. Recentemente conversei com aquela menina do grupo americano Yeah Yeah Yeahs, a Karen O., e ela disse que o Cure inspirava muito a banda dela. Sinto-me honrado, porque a banda dela é muito boa.

Folha - O que você lembra dos dois shows que o Cure fez no Brasil, um em 1987 e outro em 1996?
Smith
- Quando tocamos aí em 1987 foi uma histeria para a qual eu não estava preparado, por mais que nossas músicas fizessem sucesso. Diria que foi assustador até. Não me lembro direito dos dois shows, mas recordo que a atenção criada em torno da presença do Cure no Brasil, nas duas vezes, foi muito intensa. Eu me senti bem esquisito por causa disso.
Satisfeito por um lado. Mas me perguntando por que pessoas de um país tão alegre gostavam tanto de músicas melancólicas e de vestir preto como um cara como eu.
Estava marcado para irmos ao Brasil em 2000 com a turnê do "Bloodflowers", mas acabou não dando certo. Mas nós iremos tocar o disco novo na América do Sul no ano que vem, isso já está planejado.

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PROMOÇOES DA SEMANA

A coluna repete a espetacular promoção da semana passada e bota para sortear o livro do autor americano John Fante ("Pergunte ao Pó") e o disco novo do Radiohead ("Hail to the Thief"). Tudo que é preciso você fazer, além de ter sorte, é mandar e-mail para lucio@uol.com.br. Tem mais uma revista "Crocodilo", também, se você quiser. O processo é o mesmo.

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ATÉ O BRASIL

Semana que vem a coluna será produto nacional. Fico devendo a lista dos vencedores da promoção da semana passada, pela falta de condições de realizar o sorteio. Agora, vou pegar o caminho para o clube. Vejo você aí.
Lúcio Ribeiro, 41, é colunista da Folha especializado em música pop e cinema. Também é DJ, edita a revista "Capricho" e tem uma coluna na "Bizz". Escreve para a Folha Online às quartas.

E-mail: lucio@uol.com.br

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