Pensata

Lúcio Ribeiro

27/05/2004

Velho demais para o rock

"You have never been in love,
Until you've seen the stars,
reflect in the reservoirs"
Morrissey, em "The First of Gang to Die"

"It started out with a kiss
How did it end up like this?
It was only a kiss
It was only a kiss"
The Killers, "Mr. Brightside"


Vamos?
É o seguinte: rock´n´roll independente e glamuroso é o que eu preciso. Está na minha alma. Indie rock´n´roll. A hora é agora.

* Poderia ser, mas a frase acima não é minha. Está na letra de "Indie Rock´n´Roll", da banda americana The Killers, amiguinha da coluna já há algum tempo. O disco e um encontro esquisito meu com o Killers vão ganhar bastante espaço lá embaixo. E um monte de indie rock´n´roll (não só) glamuroso também.

* Esses escritos aí embaixo, na primeira nota, também não são meus. Mas poderiam ser.

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SONIC YOUTH

* É difícil não pensar na idade de alguém e como ela se relaciona com o rock. Acabei de fazer 47 anos, e a cada ano que passa fica mais difícil não me perguntar se eu deveria estar ouvindo algo que ainda é considerado mais apropriado à minha idade - jazz, folk, música clássica, ópera, marchinhas de funeral etc. Você já ouviu os motivos milhões de vezes: a maioria das músicas de rock é feita por jovens, para os jovens, sobre ser jovem. E, se você não é jovem e ainda ouve rock, então você deveria ter vergonha de si mesmo. E finalmente eu achei minha resposta para isso tudo: acima de tudo, eu concordo com quase tudo dessa história, embora ela seja grosseira e não faça esforço algum em se dirigir ao que é recente, principalmente a trabalhos excelentes de Neil Young, Bob Dylan, Bruce Springsteen. Ou seja: ela não faz mais sentido para mim.

* Juventude é uma qualidade não muito diferente de saúde: é encontrada em maior abundância entre os jovens, mas todos nós precisamos ter acesso a ela. (E nem todos os jovens são sortudos o suficiente para serem jovens. Pense naquelas pessoas da faculdade que queriam ser políticos e advogados corporativos, por exemplo.) Não estou falando sobre as armadilhas da juventude: os rostos sem linhas de expressão, os abdômens de tanque, o cabelo. Estou falando de energia, do anseio melancólico, da animação inexplicável, da sensação esporádica de invencibilidade, da esperança que arde como cloro. Quando eu era mais jovem, o rock articulava esses sentimentos, e agora que estou mais velho, ele os estimula, mas de qualquer forma, rock n' roll era e é necessário porque: quem não precisa de animação e de sensação de invencibilidade, mesmo se for só de vez em quando?

* (...) O Darkness sabe que nós vamos rir da cara deles, então eles riem de si mesmos primeiro; o White Stripes pode ser uma banda de blues, mas a necessidade que eles têm de transpirar "frieza" é tão forte quanto seu desejo de emitir calor, e conseqüentemente, os cálculos já foram feitos: há tanta "manha" quanto arte. Sinceramente, eu não me importo se a música soa nova ou velha: eu só quero que ela tenha ambição e exuberância, falta de inibição, reconhecimento do poder de salvação do barulho, um reconhecimento de que inteligência emocional é às vezes melhor expressada com uma grande mudança de acorde ao invés de carão.

* A brilhante "Hey Ya!", do Outkast, uma música que por poucos meses no ano passado uniu raças e críticos e adolescentes e caras nostálgicos, tinha tudo isso e mais: você podia ouvir Prince nela, e os Beatles. E ainda a música pertencia absolutamente ao aqui-e-agora, ou pelo menos ao logo-ali de 2003.

* O texto acima apareceu no "New York Times", na semana passada. A assinatura é do escritor britânico Nick Hornby, motivado por uma conjunção que envolve Bruce Springsteen, a ótima banda Marah, da Filadélfia, e o aniversário de 30 anos de um texto que ele leu e o marcou, de autoria de Jon Landau.
No artigo, Landau emplacou a frase "Eu vi o futuro do rock e seu nome era Bruce Springsteen". E começava dizendo que estava fazendo 27 anos, se sentia velho e estava ali escutando seus discos e lembrando como as coisas eram diferentes dez anos atrás.

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ATRAENTE

Uma frase que cabe bem hoje é "Eu vi o futuro do pop e seu nome era Mike Skinner". O homem-banda The Streets, que até (veja você) já tocou no Brasil, há tempos está na turminha da garagem inglesa, para onde está apontado o farol da modernidade na música britânica. Agora, depois que lançou seu novo álbum, então...
Por causa de "A Grand Don´t Come for Free", que vai estar fácil na lista dos principais discos do ano, Mike Skinner aparece por todos os lugares.
Por exemplo, ele está na revista "GQ" americana de junho. Alguns pensamentos do rapper-gênio inglês:

* "Tênis. Fiquei absolutamente alucinado quando passei a ter dinheiro para comprá-los. Teve um período que comprava mais de um par por semana. Estava fora de controle."

* "Meu primeiro trabalho foi numa gravadora, mas eles me despediram por que eu estava...traficando. (pausa) Bem, eu não estava traficando. Meu amigo achou um bocado de droga e eu só estava vendendo para ele."

* "Gostaria que os americanos passassem a usar a gíria 'fit'. Quer dizer atraente, hot. Como usar: Eu acho você realmente 'fit'." A música mais famosa do novo disco de Skinner, o primeiro single do CD, é "Fit But You Know It".

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PIXIES

* Depois de histórica passagem no Brasil, a banda de Boston chega ao Reino Unido, onde o barulho pop é sempre bem maior. O grupo, que deixou muita gente em Curitiba ainda sem saber se o que aconteceu foi verdade, toca quatro noites na semana que vem no lendário Brixton Academy. Tudo esgotado há vários meses para o primeiro show dos Pixies na ilha em 13 anos. Frank Black e cia. já estão em capas inglesas por todo lugar. Os shows do Academy são as primeiras depois do Brasil. E também a porta de entrada da varredura européia da banda que voltou como se não tivesse acabado.

* O "New Musical Express" realizou junto a seus leitores uma pesquisa para saber qual a música preferida dos Pixies. A mais votada foi "Where Is My Mind?", do CD "Surfer Rosa". Do Top 10 da "NME", no entanto, sete canções vieram do "Doolittle".

* Os Pixies passeiam gostoso no imaginário pop até em bandas novas. A fabulosa TV on the Radio, o último grande rompante criativo de Nova York, gravou uma bela versão a capella de "Mr. Grieves", do veterano grupo. A música esteve no setlist da apresentação daqui do CPF. Está no EP "Young Liars" e está também na internet.
Não tão novo assim, mas posterior aos Pixies, o querido trio britânico Placebo acaba de ter lançado no Brasil o esperto DVD "Soulmates Never Die", registro de show de 2003 em Paris, para 18 mil pessoas. O concerto é encerrado com "Where Is My Mind", cover da favoritíssima música dos Pixies. O negócio é que para a música Brian Molko chama ao palco mr. Frank Black, que canta e toca violão. Espetacular, ficou.
Ainda sobre o DVD do Placebo, dá para falar que.

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TOCA PLACEBO

"Soulmates Never Dies", o DVD lançado, é honestíssimo. Mostra tanto o inteirinho show de 21 músicas em Paris como carrega um documentário sobre a badalada tour do ano passado, do álbum "Sleeping with Ghosts".
Tem detalhes do show americano num bar de Seattle, para 600 pessoas (carga máxima) quanto no Foro Sol da Cidade do México, para 16 mil fãs.
Na América, o Placebo teve como suporte a banda Eagles of Death Metal, projeto filhote do Queens of the Stone Age, do extracool Josh Homme. O Eagles aparece no DVD.
Ainda sobre a apresentação mexicana, Brian Molko comenta que não esperava a recepção beatleniana recebida. "Como é que demoramos tanto para vir a este lugar", falou o andrógino vocalista do Placebo. "Precisamos explorar mais lugares diferentes", concluiu alguém, não lembro se o próprio Molko.
Aí me faz pensar por que o Placebo ainda não passou pelo Brasil. A banda nem é tão cara e tenho impressão que o público de um show em São Paulo, por exemplo, pode chegar junto da audiência americana. Mas...

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PROMOÇÃO DA SEMANA

Para a turma que faz do Placebo a banda mais solicitada a DJs de clubes de rock, tanto quanto o Suede, a coluna oferece a sorteio uma cópia bacanuda do DVD "Soulmates Never Die", recém-lançado aqui pela Universal. Vai querer? Manda seu e-mail para aquele lugar.

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ORCUTE

Notícia moderna das mais velhas, você deve ter percebido que está todo mundo no Orkut, lugar virtual para reencontrar e arrumar novos amiguinhos. Lá também é o canal para penetrar no mundo das comunidades descoladas e falar da banda predileta, do time que você odeia, do ator mais gato da TV, do "O.C., de quem você come ou não come, do colunista que mais escreve besteira.
Tem até uma comunidade para discutir ele. Ele. Humberto Finatti, primeiro e único, responsável pelo obrigatório espaço sexo-drogas-rock "Zap´n´Roll" (site Dynamite).
Está coluna não esconde sua inveja do vizinho pop, tema de uma comunidade pop "do bem".

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KILLERS, BANDA MATADORA

Ainda sobre o Killers.
Quando o álbum "Hot Fuss" chegar às lojas americanas e inglesas em menos de duas semanas, o grupo de Las Vegas (Las Vegas?) já vai ter um sólido caminho percorrido rumo a um certo reconhecimento, sempre tendo em mente o que "sólido" e "reconhecimento" significam na música independente.
Nem bem o CD saiu e o Killers já tem emplacadas três músicas nas rádios inglesas e nas college americanas.
A música que apresentou o Killers ao mundo pop foi a pegajosa "Somebody Told Me", bem new wave, de "pegada" gay, que saiu em single na Inglaterra em março.
Mesmo sendo de Las Vegas, o Killers é muito britpop. Já foi dito até que a banda finge o sotaque inglês em algumas canções.
"Mr. Brightside", um outro single, é a que está "bombando" em rádio indie agora. Belíssima. "Indie Rock'n'Roll" também toca bastante, mas talvez mais por causa do nome.
Uma coisa engraçada aconteceu entre este colunista e o Killers, durante apresentação da banda no festival de Coachella, na Califórnia, no começo do mês.
Na passagem do palco principal (Muse) para a tenda eletrônica (2 Many DJs), vi na programação que num palco secundário o Killers se apresentava e dava para pegar pelo menos quinze minutos do show. Só conhecia "Mr. Brightside" (pouco) e "Somebody Told Me" (bem).
Durante as quatro músicas que eu pude ver, o show foi chato e não teve os "sucessos". Fui embora.
Dias depois, lendo algumas críticas da apresentação da jovem banda, era unânime que no começo do show (a parte que eu vi) o Killers foi um "Level 42" (para citar um nome bem chato) e no fim o grupo deixou o palco como um "Radiohead".
Essa eu perdi.

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SEIS SHOWS

* Morrissey, Manchester
O crítico do "Guardian" claramente não gostou do disco novo do ex-Smiths, mas descreveu como foi mágico a volta do cantor a um show na Inglaterra. "Por anos uma propriedade única de fãs ardorosos, Morrissey tem sido repentinamente abraçado pela cultura mainstream como nunca foi", observou o jornalista Alexis Petridis. "Como é muito bacana e justo se sentir de volta ao top 10 britânico novamente, junto de megatalentos como Eamon e Frankie", ironizou Morrissey. Continuou Petradis: Não há como negar seu vivo poder como um performer ao vivo, rodando e jogando o microfone no chão, puxando a camisa até parecer que ela vai rasgar, a cara de quem está sofrendo muito quando diz suas letras."

* Massive Attack, São Paulo
Dançar com movimentos econômicos, em um clima de músicas soturnas, sob uma iluminaçãoque dava a impressão de estar vendo tudo, mas nada com muita certeza. Acompanhar à risca o mandamento do trip hop, que é viajar. Ver os vocais se revezarem e fazer o show ganhar em diversidade, mesmo com músicas na mesma toada eletrônica triste, enigmática. 3D, Dot Ellison e Horace Andy soberbos, em ordem decrescente de soberba. Assim foi o Massive Attack, no show de terça.

* Strokes, Nova York
Ben Ratliff, jornalista bacana do "New York Times", porém sempre um ano atrás dos acontecimentos, foi ver o show gratuito dos Strokes no Central Park. O que ele descreve no palco é uma banda formada por um Bob Dylan-1965, um Johnny Thunders-1978, o baixista Phil Lesh, do Grateful Dead, e Ray Davies no vocal. "Não, era os Strokes", acordou. Os megashows do Central Park iniciam o verão nova-iorquino, quando todo mundo anda alegre pelas ruas. Ratliff afirma que os Strokes estiveram no lugar certo, na hora certa. É uma banda que mostra uma redescoberta Nova York nesta época do ano. Uma evocação roqueira daqueles raios solares gostosos que refletem nos prédios gigantes, uma nova carga de energia boa depois de toda aquela punição que é o inverno. Lembro que conheci pessoalmente Ratliff no Abril pro Rock de 2001, em Recife. Apresentados, falamos rapidamente sobre rock brasileiro, porque ele me perguntou e tal. Depois falei que estava achando bacana a movimentação de novas bandas de underground de Nova York, a terra dele. Falei dos Strokes, que estavam estourados na Inglaterra. Ele mostrou não ter idéia do que eu estava dizendo e perguntou: "Quem? Strokes? São de Nova York?"

* Walkmen, Natal
Hugo Montarroyos escreve no site Reciferock que a banda nova-iorquina Walkmen fez no festival Mada uma apresentação perfeita. "Se os discos são apenas razoáveis, ao vivo a banda é fenomenal. Lembra muito os Strokes, é verdade, mas não passa a impressão de ser mera cópia. E, não, ao vivo não parece nada com o U2. Pena que o público não se deu conta do caviar que estava ali sendo oferecido", narrou Montarroyos. O site Reciferock tem vídeos de ótima qualidade de algumas apresentações do Mada 2004. Do Walkmen, tem a hora em que o grupo mandou a espetacular "The Rat". Deu para ver que o vocalista-figura Hamilton Teihauser ainda conserva o gás de cantar gritando, como se tivesse desesperado e pronto para correr para o aeroporto e pegar o avião de volta o mais rápido possível, para resolver o problema que o está matando, seja qual for ele. "The Rat" ao vivo no Mada está no Reciferock pedindo para ser vista. Então vá logo lá e veja.

* Beastie Boys, Londres
Ouvi na semana passada, via internet, uma apresentação especial dos garotos endiabrados para a Radio One inglesa. A nova "Ch-Check It Out", a clássica "Intergalactic" e várias outras foram bombadas com um gás inacreditável, como se a banda estivesse tocando para 20 mil pessoas no Madison Square Garden, e não em um estúdio fechado de rádio britânica. Os Beastie Boys continuam boys, para alegria de caras como o Nick Hornby. Bestie Men são outras coisas, ainda bem.

* Jazzie e os Vendidos, São Paulo
Um butcher, uma Clarah e um proprietário indie fizeram uma apresentação primorosa, na Funhouse, segundo a opinião de um amigo. Guitarra e Saxofone. Blues sob controle mais para Jon Spencer do que para White Stripes.

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DUAS MÚSICAS

"Pack of Wolves", Nightbreed
"Duality". Slipknot
As duas melhores músicas podreiras dos últimos anos. A primeira tem hora que descamba para um drum'n'bass macabro de matar. A segunda é tão metal quanto romântica. Ótimas.

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DOIS PRÊMIOS

Mais dois, na verdade. Para você não se mostrar desinformado nas rodinhas amigas, esta coluna o municia com a edição nacional do fantástico Franz Ferdinand e seu disco homônimo, mais uma cópia caseira de "You Are the Quary", o doce álbum do amargo regresso do gênio inglês Morrissey. Tudo para sorteio, através de e-mails para lucio@uol.com.br. Vem nessa.

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UM FESTIVAL

A começar pelo nome no mínimo engraçado, de um festival de rock que é "in" Rio mas na verdade acontece em Lisboa, o Rock in Rio-Lisboa se mostra gigante, chamativo, megaestrelado, mas ainda assim é difícil entender a quem ele possa interessar, seja no Rio, em Lisboa, no Brasil, em Portugal, na Europa. A questão é de identidade, não só geográfica.
O evento de seis dias e dois finais de semana que acontece a partir de hoje põe forte tempero brasileiro no continente dos festivais. Mas esse tempero rende um caldo ralo, que resulta de um elenco esquizofrênico, que num todo aponta para lugar nenhum.

Cada um com seus problemas, mas é um megafestival que migra de um país continental carente de megafestivais para um continente inflacionado de eventos musicais de tal porte. E que traduz o lema "por um mundo melhor" menos pretensamente como "por uma música melhor".

Para os brasileiros, o Rock in Rio Lisboa e suas mais de 80 atrações não vão render mais do que um programa de melhores momentos na Globo. Para os lisboetas, em particular, é o festival de mais de 80 atrações e 90 horas de duração que vale por levar à cidade, em seu primeiro dia, o músico Paul McCartney. Essa é a primeira vez que o ex-beatle se apresenta ao vivo em Portugal, em 40 anos de carreira.

Mas no meio do "padrão europeu" de festivais de verão, o Rock in Rio Lisboa pousa como um ET, daqueles de cabeça desproporcional a seu corpo. Talvez até essa seja a intenção do evento, mas o RRL não prima por juntar uma platéia de gosto minimamente coerente dentro de qualquer tendência de música jovem. Nem põe óleo na engrenagem que faz mover essa mesma música jovem, aquela que vende disco, representa as canções que tocam no rádio, que aparece na (M)TV, está nos jornais e revistas.

Headliners como Peter Gabriel e Sting, que não lançam disco bom/significativo há muitos anos, dificilmente serão chamados para algum outro festival neste ano, fora o Rock in Rio Lisboa. E provavelmente nos anos seguintes também.

É missão quase impossível prender, por três shows que seja, uma pessoa de gosto musical qualquer diante do palco mundo (o principal) no domingo, por exemplo. O bluesman português Rui Veloso abre os trabalhos e antecede o veterano reggaeiro brasileiro Gilberto Gil. O ministro sai para o palco ser varrido pelo moderno hard rock setentista dos moleques australianos do Jet. Vai embora o Jet e entra o som "maduro" e mainstream do cantor e guitarrista Ben Harper, que lançou seu quinto disco no ano passado e ninguém viu (ouviu). Nem o sempre "correto" Grammy deu bola. Mas o RRL vai dar. Depois Peter Gabriel assume seu posto de grande atração do dia. E não deve acordar os que dormiram depois do Jet.

A idéia do festival em congraçar artistas portugueses com brasileiros e latinos gerou uma escalação estapafúrdia, que se para uns pode parecer um "verdadeiro leque de atrações" para quem acompanha música é um verdadeiro "samba do lusobrasileiro doido". Alejandro Sànz, Nuno Norte, Ivete Sangalo, Luis Represas, João Pedro Pais, Moonspell, Rui Veloso e Charlie Brown Jr definitivamente não combinam num mesmo evento.

Até a megabanda indie Foo Fighters, que estava repousando depois de quase dois anos de turnê, foi tirada de seu descanso para substituir de última hora o Guns n' Roses, que há anos não consegue se portar como um grupo de rock. A banda de Axl Rose era o sonho do festival em repetir a afluência de pelo menos parte das 250 mil pessoas que estiveram no evento do Rio em 2001.

A tenda Raízes do RRL, que terá a veterana brasileira Joyce cantando "Clara, Ana e quem mais chegar" para quem mais chegar perto para ver, é mais coerente a uma fórmula de festival e contabiliza mais atrações que o palco principal. Nisso o festival poderia se chamar World Music in Rio-Lisboa, mas perderia a sacada do uso da marca forte.
Quatro dias depois que a cantora baiana de axé-MPB Daniela Mercury encabeça a noite em que a pop star Britney Spears "abre" para a brasileira (?!?), a mesma Lisboa abriga seu festival Super Bock Super Rock, com atrações pop mais relevantes como os roqueiros dos Pixies, o indie Muse, o rap-metal teen Korn, o papa eletrônico Fatboy Slim e o badalado grupo-projeto N.E.R.D., vanguarda da mistura de hip hop e rock. O "modesto" Super Bock representando a contento a música como ela é vista e consumida hoje. Para brasileiro ver, tem a popularíssima Los Hermanos, banda nacional "da hora".

Ainda em junho, o britânico Glastonbury também vai promover um show do Paul McCartney. Tal qual o Rock in Rio Lisboa, também vai dar a seu público de mais de 120 mil pessoas/dia atrações como o banda nova Kings of Leon e o grupo hype de rap Black Eyed Peas. Mas no pacote o Glastonbury, que nem anunciou oficialmente sua escalação mas tem todos os ingressos esgotados desde abril, vai oferecer ainda Morrissey, James Brown, Franz Ferdinand, Libertines, Oasis, Basement Jaxx, Rapture, Muse e dezenas de outros astros importantes. Fora a English National Opera tocando Wagner.

Como um olhar menos ligado à emergência da música pop, o Rock in Rio Lisboa, com seu nome, sua escalação e a idéia da propagação da marca talvez até faça sentido. Num campo hipotético, se o Reading Festival resolvesse fazer seu Reading Festival in São Paulo, talvez pudéssemos esperar aqui uma atração como o Radiohead, por exemplo. Por causa do nome do festival.

De repente o título Rock In Rio chama mais público do que simplesmente Rock in Lisboa. Porque em Lisboa talvez Daniela Mercury seja artista para competir de igual para igual com a banda de Thom Yorke.


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UM ADEUS

Tchau!
Lúcio Ribeiro, 41, é colunista da Folha especializado em música pop e cinema. Também é DJ, edita a revista "Capricho" e tem uma coluna na "Bizz". Escreve para a Folha Online às quartas.

E-mail: lucio@uol.com.br

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