Pensata

Lúcio Ribeiro

03/06/2004

Talvez definitivo

"Maybe you're the same as me
We see things they'll never see
You and I are gonna live forever"
Oasis em "Live Forever"

"Candy, candy, candy
I can't let you go
Life is crazy
I know baby"
Wander Wildner, em "Candy"

"When they played that song at the Death Disco
It started fast and ends so slow
And all the time it reminded me of you"
Libertines, em "Don´t Look Back into the Sun"


Pois não?

* Epígrafes ultra-românticas, talvez contaminadas pelo clima amoreco disseminado pela proximidade do Dia dos Namorados. Não foi proposital.

* Recebi um e-mail legal nesta semana, de um cara reclamando da minha "tirania cultural". Resumindo o lero, a pessoa esbravejava sobre o absurdo de eu só falar o eu quero na minha coluna (sentiu minhas colocações pronominais?). Primeiro, não entendo como alguém pode me levar a sério. Depois, não concordo. Ou desconcordo, como dizem no interior paulista. A premissa deste espaço sempre foi a seguinte: em um dia da semana eu escrevo; nos outros seis dias o leitor escreve e eu leio. Resumindo, estou em desvantagem brutal.

* Rola que o grande Ian Brown aparece no começo deste novo "Harry Potter", interpretando um mago de dentes de ouro. Mas a ponta do ex-líder do espetacular Stone Roses é tratado como mistério. Não se sabe ao certo. Bizarrice pop que precisa ser vista. Dê o toque se vir o cantor no filme. Aliás, dizem que esse "Harry Potter" é totalmente dark.




DEFINITIVAMENTE TALVEZ

O ano de 1994 não ficou só marcado pela morte do Cobain ou pelo Dunga levantando a taça. Teve uma penca de álbuns pop dignos lançados, importantíssimos para a época. Uns mais, outros menos importantes, na verdade. Numa lista rápida dos álbuns que completam 10 anos este ano, podemos incluir:

"Selected Ambient Works 2", Aphex Twin; "Mellow Gold", Beck;
"Pussy Whipped", Bikini Kill; "Dookie", Green Day;
"Live Through This", Hole; "Grace", Jeff Buckley;
"(Welcome to) Sky Valley", Kyuss; "The Downward Spiral", Nine Inch Nails;
"MTV Unplugged", Nirvana; "Smash", The Offspring";
"Vitalogy", Pearl Jam; "Dummy", Portishead";
"Monster", R.E.M.; "Superunknown", Soundgarden;
"Chocolate and Cheese", Ween; "Blue Album", Weezer;
"CrazySexyCool", TLC, entre muitos outros. Olha que eu nem citei o disco do Bon Jovi e o do Phil Collins...

Reprodução



* Mas dentro deste "Class of 1994" em CD, o disco aniversariante mais significativo é o histórico "Definitely Maybe", o de estréia do Oasis. É até engraçado olhar para trás, hoje, para falar de uma banda que chacoalhou a música pop durante alguns anos e depois por muitos construiu a fama de arrogante, briguenta, cópia de Beatles, repetitiva. Mas que ainda assim é escolhida para estrelar o colossal Glastonbury Festival deste ano. Deste mês.
Quem não viveu o 1994 (e o 1995, 1996) britânico não tem idéia do que foi a chegada da banda dos Gallagher à música jovem. Perto de "Definitely Maybe", o bafafá em torno do CD debut dos Strokes, por exemplos, parece um cochicho. Note que 1994 aqui era pré-internet.
"DM" foi lançado em agosto, mas o "buzz" em torno do grupo rebelde de Manchester já era grande no começo daquele ano, por causa do lançamento pela Creation do single "Supersonic", em abril. A fama dos caras era forte, a música ótima e o selo era Creation. Combinação explosiva.
Lembro bem a primeira vez que ouvi Oasis. Já tinha lido sobre a "banda que ia estourar". E, numa edição do finado "Melody Maker", veio uma fita cassete com quatro músicas. Uma delas, e nem a principal, era "Cigarettes & Alcohol".
Botei o K7 no toca-fitas do carro (lembra de toca-fitas? Aqueles de gaveta?) e fui ouvir o tal Oasis. Achei muito Rolling Stones e torci um pouco o nariz para o vocal, antipático. Ouvindo depois, no mesmo dia, continuei achando Stones, mas já estava gostando bem mais. "Que vocal esperto", mudei de idéia rapidinho.
Duas músicas depois, o Oasis já era a minha banda predileta.
Mas enfim. Agora no próximo dia 13 quem faz aniversário é o single "Shakermaker", o segundo dos Gallagher. A fama já era bem notória. O primeiro single, "Supersonic", chegou ao 31º lugar na parada normal britânica. "Shakermaker" já catava o 11º da parada mainstream. Feito notável para um grupo que nem tinha um álbum.
Agosto veio e com ele o single "Live Forever" e o disco cheio, "Definitely Maybe". E aí...

* Com a série de singles excelentes, o tão badalado primeiro disco e uma atitude de quem não estava surpreso com nada daquilo, o Oasis fez reviver o pop britânico, que andava largado, desatado e só tinha brilho em ações isoladas ou muito underground. A Inglaterra sonora caminhava caótica, bagunçada pela zoeira grunge, pela ascensão eletrônica e se perguntando o que tinha dado de errado com os Stone Roses e o Madchester.
Faltava alguém como o Nirvana para quebrar muros e abrir caminho para os grupos que borbulhavam no andar de baixo do mainstream. Aí vieram os Gallagher. E o sucesso do Oasis forjava, o britpop, movimento que foi uma febre absurda na Inglaterra, requentou a movimentação de clubes, fez procriarem publicações musicais, era cantado por bêbados de pub e por lordes, invadiu a política, foi atrelado às mudanças sociais proclamadas pelo governo Tony Blair. Era engraçado ver a entrada que o Oasis tinha na população pobre e achatada do Reino Unido. De alguma forma, as melodias e as letras esquisitas dos Gallagher tocavam fundo na classe operária britânica. Oasis logo virou música até de estádio de futebol.

* O Oasis foi talvez a primeira grande banda que parecia outras bandas, sinais fortes da entrada da música pop na era da transformação de Lavoisier. Graças a ótimas canções de perfect pop criadas pelo genioso Noel Gallagher, o Oasis se tornou a mais Beatles das bandas, tirando os próprios. E na química do quinteto tinha ainda Stone Roses, Sex Pistols, os Stones, Kinks etc.

* Noel Gallagher, na época, sobre a baladaça "Live Forever", o carro-chefe do CD "Definitely Maybe": "É uma das melhores canções de todos os tempos. Duvido que alguém faça algo parecido nos próximos dez anos. A não ser nós mesmos, claro". Os dez anos já se passaram. O Noel queimou a língua? Opine.

* "Definitely Maybe" vendeu perto de 200 mil cópias na Inglaterra, na semana de lançamento. Até o final de 1994, com a chegada do Natal, bateu no 1,5 milhão. Isso que o álbum com que o Oasis iria explodir, mesmo, seria o próximo.

* Tempos depois de lançado o "Definitely Maybe", o jornal "Los Angeles Times" enviou à Inglaterra por três meses um jornalista musica para "entender" o fenômeno Oasis.

* Em 1998, quando o Oasis apareceu no Brasil pela primeira vez, este colunista entrevistou o "descobridor" da banda, o produtor, empresário, músico e guru do britpop Alan McGee, o dono da lendária Creation. A gravadora, que faliu há alguns anos, deixando por exemplo o Teenage Fanclub sem teto, foi o lar de bandas como Jesus & Mary Chain, My Bloody Valentine, Primal Scream, o fantástico Biff Bang Pow! (do próprio McGee), entre outras. Com o "advento" Oasis, a Creation ficou milionária. E foi apoderada pela mega Sony. Hoje McGee tem o clube Death Disco, em Londres (onde vende cerveja Brahma e foi o local que eu ouvi White Stripes pela primeira vez), a gravadora Poptones e é o empresário do Libertines, talvez a banda mais bacana do novo rock inglês.

* Parte do papo com Mc Gee foi assim:
Você foi o homem que revelou o Oasis ao pop, em 1993. Como analisa, hoje, a importância da banda para a história da música inglesa? Gostaria que você falasse menos como manager do grupo e mais como "padrinho do britpop" e o primeiro a assinar com bandas tipo Primal Scream, Jesus & Mary Chain e My Bloody Valentine.
Alan McGee: O Jesus & Mary Chain foi o começo da revolução alternativa da música. Se eles não tivessem existido, talvez não teríamos tido bandas como My Bloody Valentine, Primal Scream, Stone Roses. E, sem os Roses, provavelmente talvez o Oasis também não existiria hoje. Acho que o Oasis é um desses fenômenos que aparecem a cada 20 anos. Basicamente o que eu fiz foi telefonar para os Gallagher e lançar o disco deles.
Como foi a "descoberta" do Oasis?
Alan McGee: Foi em Glasgow, Escócia, maio de 1993. Em um bar chamado King Tut's Wah Wah Hut. Cheguei cedo lá. Eu já estava bêbado, inclusive. No bar tinha uns 15 scallies (gíria para garoto proletário desempregado). Todos pulando, quebrando tudo ao ver o Oasis. A banda não estava nem anunciada e abriu para três outras atrações daquela noite. O Oasis tocou quatro músicas, achei brilhante. Fui atrás e fechamos o contrato.
Dizem que no dia seguinte do tal show da Escócia você ligou para o editor do semanário New Musical Express, Steve Sutherland, para comunicá-lo de que você tinha encontrado "A Banda". Qual é a história?
McGee: Foi verdade. Falei para ele: "Lembra a última vez que eu liguei para você, nos anos 80, para falar sobre o Jesus & Mary Chain, que eles talvez seriam a melhor banda do mundo. Estou ligando de novo agora para dizer que acabei de achar a melhor banda de rock'n'roll do mundo".
É verdade que o Oasis salvou a Creation da falência?
McGee: Foi. Estivemos perto da falência durante uns 10 anos. Como todas as independentes. Aí achamos o ouro e lançamos DEFINITELY MAYBE. Pagamos todas as dívidas que havíamos acumulado durantes os 10 anos. Depois veio MORNING GLORY, que vendeu até agora 14 milhões de cópias. É, o Oasis tem sido bom para nós.

* Como última ode ao histórico "Definitely Maybe" e seu aniversário de 10 anos, republico no final da coluna trecho grande de um artigo do badalado escritor britânico Will Self sobre o Oasis. Foi originalmente realizado para a revista "Details", se não me engano em 97. Will Self é considerado um dos mais importantes autores da nova geração britânica e foi colunista do jornal britânico "The Observer". E gastou seus dotes literários para descrever o que representou o Oasis para o Reino Unido na metade da década passada. O texto está lá embaixo.




DISCARADA

Uma leva de bons discos está chegando às lojas por estes dias. Dá uma olhada e tenha uma idéia do que dar (ou pedir) no Dia dos Namorados.

* Keane, "Hopes and Fears" (Universal)
Megafalado aqui, vale o toque: esse é "O" presente. Indie romântico que usa pianinho matador e voz sincera, como Travis, Coldplay, Starsailor e outros. Canções extremamente delicadas e melancólicas como "Somewhere Only We Know", "Everybody's Changing" e "This Is the Last Time" lembram aquelas baladonas anos 70 que roqueiros adoravam odiar na época, mas que agora dizem amar.
Você vai curtir: "This Is the Last Time"

* Ben Kweller, "On My Way"
O compositor prodígio e ótimo guitarrista Ben Kweller cresceu um pouco e manda bem neste segundo disco. O cara já tem 22 anos. Ali, de longe, dá para sentir que Kweller se apega à raiz do american rock e pende seu som para um REM do início e, principalmente, para o Violent Femmes. Não dá para ficar chateado com o menino por causa disso.
Você vai curtir: "My Apartment"

* Wander Wildner, "Paraquedas do Coração"
É engraçado ver que, quando todo mundo reclamava que as bandas indies nacionais só cantavam em inglês, aparecem bons nomes como Los Pirata e Wander Wildner e tascam letras em portunhol em cima de ótimas melodias. O zeitgeist involuntário entre os Pirata e Wildner pára aí. Em "Paraquedas do Coração" o errante gaúcho desfila sua cantiga indie quase brega sobre rock de responsa, com um pé em Ramones, com um pé em Iggy Pop, mas, o mais importante aqui, com os dois pés no álcool.
Você vai curtir: "Rodando el Mundo"




SERÁ?

Estou meio decepcionado com as mulheres. Primeiro, achei um absurdo darem o prêmio de Miss Universo àquela australiana. Depois, ainda não consegui engolir o disco novo da musa PJ Harvey, esse "Uh Huh Her", que será lançado em lojas na semana que vem. A voz lindona dela está lá, o som barulhento e aflito também. Mas só curti (bastante até) uma música: "The Letter". A tal "Who the Fuck" só é legal no clipe, estouradaço, colorido de um modo harveyano. Se é que você me entende. Já viu?




AS TRÊS DA SEMANA

A volta dos que não foram. As recomendadas da semana são velhos conhecidos:

* The Cure, "The End of the World"
Bem bacana. Bem Cure.

* The Hives, "Walk Idiot Walk"
Guitarra tosca e repetitiva. Pique de AC/DC. Vocal demente. O Hives está de volta. Baixe

* Datsuns, "Blacken My Thumb"
Não curto muito o Datsuns, mas esse primeiro single do novo álbum racha assoalho. Metaaaaaal. No vídeo, o vocalista do Datsuns tá com a cara do Fabrício, do MQN e da Monstro Discos, de Goiânia.




MELISSA, 16

Mais um livro barra-pesada sobre adolescentes está chegando ao Brasil. "Cem Escovadas Antes de Ir para a Cama", que vendeu mais de um milhão de cópias na Itália, sai aqui no mês que vem. O livro é autobiográfico e conta a experimentação sexual da jovem Melissa Panarello, de 18 anos, que viveu suas aventuras punks (sexo grupal, lesbianismo e tudo mais) aos 16, depois de levar um fora do namorado. Ela é da cidade de Catânia.
Se fosse feito um recorte na cultura pop atual, com o objetivo de identificar as tribos adolescentes definidas, pelo menos duas iriam saltar aos olhos de imediato.
Uma é composta pela camada teen desconsolada com o insuportável peso da vida e que se apega a ou cria bandas emo (emocore, emotional core) ou punk pop, para falar até de desesperança e até suicídio nas letras.
Linkin Park, Blink 182, Good Charlotte, Simple Plain, CPM22 são exemplos de porta-vozes do desespero juvenil e até da reação a ele, o chamado "therapy rock".
Uma outra tribo dessa geração internet da muita informação e pouca motivação aparece em outras letras, mas agora da literatura, mostrando o mesmo desconsolo com o insuportável peso da vida. Mas descambando para outras situações limites, como mergulhar em drogas e principalmente sexo desenfreado e de vários tipos: grupal, voyerista, lesbiano.
O livro da jovem italiana Melissa Panarello chega agora para se associar a esse clubinho acima.
A cultura pop, sob o olhar adolescente, anda turbulenta. Não é gratuito que a ex-musa pudica, a cantora Britney Spears, pinta e borda com sua libido em videoclipes e beija até outras mulheres, para milhões e milhões de pessoas assistirem.
Spears é famosa por dançar de roupinha de colegial no famoso clipe "Baby One More Time", há alguns anos. Hoje em dia, segundo o "New York Times", a moda (importada do japão) dos pervertidos de plantão é frequentar clubinhos de sexo onde garotas se vestem de colegial para atender aos clientes. Exigência deles.
Então livros como "Cem Escovadas Antes de Ir para a Cama", em que uma garota de 16 anos participa por impulso de festas regadas a sexo, tem lugar em um mundo onde o ícone das menininhas, a boneca Barbie, larga o namorado de 40 anos para se aventurar com um surfista bronzeado, como foi anunciado no começo do ano. "Mas não é namoro. Eles estão só ficando", esclareceu o fabricante.




RÁPIDAS

A revista "Paper" (Nova York) fez a seleção das cinco bandas que interessam hoje. São elas: Secret Machines (de NY), The Concretes (Estocolmo), The Hong Kong (NY), Blanche (Detroit) e TV on the Radio (Brooklyn).// A banda indie Bad Folks, de Curitiba, está excursionando por. Barcelona. Toca dia 8 no Sidecar (Pl. Reial, 7). A entrada custa 5 euros.// Dentro da linha "futebol é pop", quem curte as duas coisas não esconde a alegria de ver chegar à banca a nova publicação "Revista 10", da Conrad, sobre a paixão por futebol. A intersecção dela com o rock está nos nomes que pilotam a revista: Paulo César Martin (do "Garagem") e o Marcelo Orozco (livro do Kurt Cobain). Bola dentro.




WILL SELF E O OASIS

"A primeira vez que escutei o Oasis - repetidas vezes - foi no show de rádio de meu amigo Mark Radcliffe, da BBC. Mark é transmitido de Manchester. E conhecido por pegar o que quer que seja que esteja vibrando de perversidade pop polimorfa naquela cidade. 'Maay-bay, I don't reely wanna know...', Liam Gallagher rosnava sem parar na canção LIVE FOREVER. Eu captei o ritmo, mas não fazia muito o meu gênero. Era branco demais, guitar band demais, auto-referencial demais ao próprio rock.
"Mas quando a imprensa e a babel geral começaram a admiração, descobri-me intrigado. Noel afirmava ter roubado uma loja de seu bairro aos 13 anos. A banda havia ameaçado queimar um clube proeminente caso não pudessem se apresentar lá. Havia havido uma confusão a bordo de um ferryboat. O Oasis não arrasava os quartos de hotel, eles os fatiavam. Gabavam-se orgulhosamente de serem maiores que os Beatles - a coqueluche do pop. E havia drogas - toneladas de drogas. E havia mulheres - toneladas de mulheres.
"Embora sejam ostensivamente britpop, os irmãos Gallagher são, na verdade, parte da segunda geração de imigrantes irlandeses. Sua sensibilidade musical foi formada tanto por canções familiares em County Mayo como pelos hinos niilísticos do Sex Pistols.
"Muito se tem dito da afinidade da banda com tudo que é coisa beatle, mas a verdadeira psicodinâmica do Oasis se deve muito mais a seus progenitores sulistas com jeito de cafetão e aspirantes à boemia - as Majestades Satânicas originais. Como os Rolling Stones, o Oasis é um quinteto com um líder inefavelmente carismárico e sexual e prosperou na tensão psicossexual entre seu letrista/guitarrista principal e seu líder/estilo guru.
"No caso do Oasis, isso é ainda mais atiçado pelo consanguinidade. Basta imaginar o que deve ser escutar seu irmãozinho cantando sobre suas experiências sexuais e sentimentais para entender por que músicas como WONDERWALL possuem tamanha ressonância emocional. Só para estender um pouco mais a psicoanálise, se existe um paralelo entre o Oasis e os Beatles, ele está nas personalidades de John Lennon e Liam Gallagher, Ambos passaram por infâncias difíceis; ambos sofreram o deslocamento concomitante do ser.
"Noel Gallagher descreveu seu irmão como alguém que 'vive em seu próprio mundinho' e inferiu que o efeito essencial do estrelato havia sido o de intensificar a obliquidade do relacionamento fraternal com sanidade. "Não creio que se tenha necessariamente que recorrer à patologia ou a psicologismos a fim de classificar a personalidade de extremos de Liam. Mas, ao contrário de Lennon, os irmãos Gallagher nunca se deixaram ser domesticados pelas exigências do comércio e da imagem. Lennon foi levado pela ânsia de abraçar sua (inicial) caracterização de amável, desprovido de classe e de sexualidade. Os irmãos Gallagher são ligados intrinsecamente às suas origens de classe proletária. Para entender a importância deste fato, deve-se observar quão rígidas as distinções britânicas de classe ainda são.
"Na Inglaterra, pode-se ascender da classe proletária à classe média em uma geração, mas não se pode chegar à cúpula. Se você possuir algum tipo de sotaque forte regional, não há como você ser considerado apropriado. "Na Grã-Bretanha, o proletariado industrial, principalmente no norte, formava uma horda masculinha dedicada à adoração fervorosa do futebol. Uma das partes mais tocantes da biografia da banda, escrita por Paolo Hewitt, é quando Noel descreve como eram aquelas tardes de sábado. Os pais deixavam seus filhos lado a lado de uma enorme barreira do tamanho das arquibancadas e corriam para o bar. Os irmãos Gallagher ficavam sentados ali, irradiados pelo som e pela cor que é uma partida de futebol inglesa em plenitude. E então a cantoria começava. É esse rumor rouco de multidão de torcedores que provê o forte sentimento de hino de tantas músicas do Oasis: são feitas de propósito para serem cantadas em massa.
"Outro aspecto importante da estética - ou anti-estética - Oasis vem da cultura do futebol: sua pose de "casual" fashion. Os Casuals foram a linha sucessória da estética Mod do final dos 60 e começo dos 70 que se inspirou na padronização das lojas de departamento. Oasis, com seus tênis amarfanhados, exemplifica um cruzamento bizarro entre os dançarinos movidos a anfetamina das raves e os hooligans munidos de navalhas que perturbavam as partidas de futebol inglesas nos anos 80. Isto, com uma dose saudável de putaria, drogas e mau comportamento exemplar, é o caráter pós-tudo, pós-rótulo do Oasis. Essa é a razão por que destruição de quarto de hotel e esmagamento fraternal é algo tão deliciosa e delirantemente digno de idolatria."




PROMOÇÃO DA SEMANA

Opa. O papo está bom, mas vamos ao que interessa. Os e-mails que chegarem no lucio@uol.com.br perigam ganhar em sorteio os novíssimos CDs do Keane ("Hopes and Fears") e do Ben Kweller ("On My Way"). Ambos os prêmios vão ser acompanhados pelo número 1 da "Revista 10", a nova publicação de futebol que chegou nesta semana às bancas. Hit me, baby.




DESTRUA O ROCK

Reprodução



Isto não é rock'n'roll. Mais: DESTRUA o rock'n'roll. Tipo de toque que não seria possível não existisse a internet, circulam por rádios e clubes europeus, vindas do nada, duas das músicas disco-rock-house mais sacolejantes dos últimos segundos. E ambas, engraçado, detonam o rock no título. Mas na verdade dialoga com o estilo, dentro da tendência corrente do hibridismo das pistas.
Vem da pequena gravadora italiana Oxyd, de eletrônico, o misterioso projeto Snack, que dentre as várias informações desencontradas aponta uma participação do DJ britânico Darren Emerson, ex-Underworld.
O Snack cunhou a contagiante "This Is Not Rock'n'Roll", um funkyhouse (o termo não é meu) com guitarras que segue a escola electro-rock (também não) do DJ americano Felix da Housecat. Na verdade, a música parece uma desconstrução de "Da Da Da", do antigo grupo alemão Trio.
O single simples e de vinil de "This Is Not..." chegou com muito estardalhaço e pouca informação nas lojas inglesas. A letra chama pela revolução nas pistas, ensina a "sentir o baixo e respirar fundo" e no final enfileira vários nomes de rock clássico, como Jerry Lee Lewis, Roy Orbinson, Johnny Cash, Carl Perkins etc.
Falando em listas de nome da música, a ordem "Destroy Rock'n'Roll" vem de um carinha chamado Mylo, que surgiu de uma ilha-apêndice da Escócia para logo já ser tratado como o novo Royksopp, herdeiro do Daft Punk e daí para cima.
O disco de tal nome destruidor foi lançado há duas semanas, mas a música "Destroy Rock'n'Roll" já rola em programas de rádio tanto rock como eletrônicos desde o começo do ano.
A música começa com uma voz sampleada de alguém tipo lendo uma ordem judicial, como se estivesse para anunciar os nomes de uma lista proibida, cujas músicas e vídeos devem ser destruídos por estarem influenciando negativamente as crianças, pervertendo os movimentos do corpo da gurizada ao incutir a break dancing e outras formas de dança.
O julgamento tem sua ira localizada em atos dos anos 80 e condena Michael Jackson, Prince, Bruce Springsteen, Madonna, ZZ Top, Rolling Stones, Adam Ant, Sheena Easton, Duran Duran, Thompson Twins, Banarama, Missing Persons, Stevie Nicks, Cindy Luuuuuuper, Van Halen, David Buuuuwie, Queen e muito mais.
O hit começa com um falatório e logo vai recebendo, num crescendo hipnotizante, as batidas ácidas da house e as guitarrinhas rock, à medida que o interlocutor vai anunciando os nomes dos condenados.
À internet, já!




VENCEDORES DAS PROMOÇÕES

Hora do acerto de contas. Vê aí quem faturou o que faturou, incluindo os prêmios da semana retrasada.

* DVD "Soulmates Never Die", do Placebo
Elton C.
Rio de Janeiro, RJ

* 2 CDs "Franz Ferdinand", dos próprios
Jamille Cintra
São Bernardo do Campo, SP
Eli Cunha Simone
Campinas, SP

* Franz Ferdinand ao vivo em Amsterdã
Cintia Fuminori
São Paulo, SP

* Morrissey caseiro, "You Are the Quary" no capricho
Márcio Rodrigues Paiva
Criciúma, SC

* O CD "Desperate Youth, Blood Thirsty", do TV on the Radio
Joílson S. Alegretti
São Paulo, SP




PRONTO?

Pronto.


Lúcio Ribeiro, 41, é colunista da Folha especializado em música pop e cinema. Também é DJ, edita a revista "Capricho" e tem uma coluna na "Bizz". Escreve para a Folha Online às quartas.

E-mail: lucio@uol.com.br

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