Pensata

Lúcio Ribeiro

17/03/2006

Bagunça no Texas

"Girlfriend in a coma, I know
I know - it's serious
My, my, my, my, my, my baby
Goodbye"
Morrissey no Sxsw, em "Girlfriend in a Coma"


"Who - Will get me to a party?
Who - Do I have yet to meet?
You - You look a bit like coffee
And you taste a bit like me"
Clap Your Hands Say Yeah no Sxsw, cantando "The Skin of My Yellow Country"


Obas.

Colunista no Texas, correria no South By Southwest, coluna pequena e atrasada.

Compenso na semana que vem.

* A diferença de um festival como o Sxsw, de rua, cheio de festas e shows surpresas, para o Reading Festival ou o Coachella é que você sabe que está vendo uma coisa e perdendo outras dez. Mas tem outras dez coisas legais que você nem imagina que está perdendo. Só descobre no dia seguinte, lendo o jornal, vendo na internet. A vida não é fácil para ninguém, é o que eu sempre digo.

* A volta do Morrissey, o fenômeno Arctic Monkeys, o "nosso" Lenine e outros 1347 artistas e bandas. Com cerca de 1350 atrações espalhadas por cinco dias e 60 bares da cidade de Austin, no Texas, começou quarta e vai até domingo o impressionante South by Southwest, um festival que tem em seu primeiro mandamento jogar luz na nova música mundial. Nova música de novas bandas e nova música de velhos artistas com novos projetos.

O festival é de business. Vitrine indie gigante que arregimenta pequenos selos e gravadoras, músicos de todos os naipes, todos os tipos de mídia e "até" público que compra ingresso (quando sobra) para ver as bandas em ação, o Sxsw comemora em 2006 sua vigésima edição.

O evento, que nasceu em 1987 para mostrar para o mundo (leia Dallas e Houston) o que de bom estava sendo feito na música nova da pequena Austin, hoje atrai para sua feira, showcases e debates o que de melhor se faz no novo rock inglês, na world music mais comentada, no pop japonês, no hard rock californiano, no art-rock nova-iorquino.

Com isso, costuma atrair rádios de todo o país e até DJs da BBC inglesa, gente como Steve Jobs (Apple) e músicos mais do que famosos que nem estão escalados para tocar no festival, mas não querem se sentir de fora.

* Também um festival de cinema e novas tecnologias, o South by Southwest, na sua versão "festival de música", tem como padrinho neste ano o veterano músico canadense Neil Young, que apresenta conferências e debates. O filme sobre a vida de Young, "Heart of Gold", está na mostra de cinema. O diretor, Jonathan Demme, acompanha o músico em Austin.

Conhecida como a "capital mundial da música ao vivo", a brincadeira que corre é que Austin tem mais bares e casas de shows do que residências. Paralelo ao "irmão" South by Southwest, acontece também em Austin o Yeast by Sweet Beast, festival para a música e cinema experimentais que está em seu sexto ano. O Sxsw inspirou também o North by Northeast, que ocorre dentro da programação do festival de Austin, para ser um painel da nova música canadense.

White Stripes e Franz Ferdinand tiveram sua música eclipsada em participações no South by Southwest. O brasileiro Lenine toca no festival vendido como "ícone da nova música brasileira" e comemora em Austin a assinatura do contrato com o selo Six Degree, que distribuirá seus discos na América do Norte. Em 2002, as bandas indie MQN (goiana), Valv e PexbaA (ambos mineiros).

Algumas outras atrações do Sxsw 2006, entre as que eu vi até agora e as muitas que eu perdi: Clap Your Hands Say Yeah!, Belle & Sebastian, The Rakes, Guillemots, Magic Numbers, Echo & The Bunnymen (lá eles vão tocar), The Cult, Mogwai, Secret Machines, Goldfrapp, The Zutons, Eagle of Death Metal.

* A famosa frase "Don't mess with Texas", que nasceu uma campanha de lixo nas ruas nos anos 80 e virou mantra que enche de orgulho o Estado, está pelo menos 20 anos defasada. Você pega a avenida Paulista, transporta ela para a Vila Madalena, bota todos os bares no lugar dos bancos, multiplica por 100 e você tem uma leve idéia do que é a principal rua da cidade de Austin, a Sixth street, na época do South by Southwest. O festival têm suas distâncias percorridas a pé facilmente. E tanto nas ruas quanto nos clubes, o entra-e-sai, vai-e-volta e sobe-desce é de causar inveja no Carnaval baiano.

* Na noite de quarta, na abertura, enquanto o grupo escocês Belle & Sebastian enchia de ternura e de músicas do disco novo o espaço ao ar livre do bar Stubb's, a poucos passos dali a trinca inglesa The Others, The Eighties Matchbox B-Line Disaster e Rakes destruía com barulho a cantina Flamingo, que de dia serve comida vegetariana. Som muito alto? Nada perto do que acontecia na sala principal do Emo, que estava recebendo o show do texano And You Know Us by the Trail of Dead..., banda da casa. Para momentos cool, era atravessar a rua e ver o The Go! Team no Exodus. Rock é bom, mas cansa.

* Não conheci e não fui ver tais bandas, mas devia estar animado no Elysium, ainda na noite de quarta, quando estavam escaladas para tocar nomes como Hyperbubble (San Antonio), Lesbians on Ecstasy (Montreal), The Metrosexuals (Dover, EUA) e The Birthday Massacre (Toronto).

O brasileiro Lenine, para quem interessar possa, tocou na madrugada de sexta, no Caribbean Lights. O taxista brasileiro que me salvou de um mundo sem táxis às 3h da manhã foi ver e achou lindo. Chama Antonio Dionisio, tem uma banda de world music em Austin, CD lançado por gravadora americana e costuma excursionar pela Califórnia, pelo Texas.

* Fui a uma conferência do Morrissey, quinta à tarde. Lá ele revelou. O Coachella deste ano ofereceu 5 MILHÕES DE DÓLARES para ele promover lá a volta dos Smiths. Os Pixies, por exemplo, voltou pra tocar lá por US$ 1 milhão. No Reading Festival, uma mega-atração costuma catar 1 milhão de libras. O U2 recebeu, livre, para fazer dois shows no Brasil, cerca de US$ 800 mil.

* Quem diria que meus dias todos ouvindo o Zane Lowe na Radio One não foram em vão. Se não fosse ele e os caras do Arctic Monkeys, para me botar para dentro num clube abarrotado que tinha uma fila de duas horas de espera na porta, eu não teria visto o Clap Your Hands Say Yeah, o show-surpresa do Flaming Lips, o show (ruim e ) abortado no meio do Dirty Pretty Things (ex-Libertines). E os Strokes não mandariam lembranças a você.

* Papo sobre os shows já vistos e o que ainda está por vir aparece aqui na semana que vem. Mas, rapidinho. Ainda estou com os ouvidos prejudicados depois do Rakes, o Guillemots é um encontro do Coldplay com o Radiohead, o Morrissey não devia fazer aquilo comigo e tocar "How Soon Is Now" no final do show, o Clap Your Hands Say Yeah toca bem mais pesado que no disco e ao vivo o vocal nem lembra o David Byrne (Talking Heads) tanto assim. Perdi o Goldfrapp, m****. Os Beastie Boys fizeram um show surpresa aqui e eu fui saber bem depois.

* Texas à parte, a notícia nos EUA musical era o telefonema que o garoto de 16 anos Alex Ostrovsky, do Michigan, recebeu de um funcionário da Apple, em uma madrugada no final de fevereiro. Alex estava baixando do iTunes o último álbum da banda inglesa Coldplay. Quando estava no sétimo download, na música "Speed of Sound", o menino atingiu a marca de 1 bilhão de músicas baixadas na loja da empresa que inventou o iPod. Alex achou estranho o telefonema naquela hora, por volta de 1h da manhã, principalmente porque o sujeito no outro lado da linha começou falando que também gostava de Coldplay. O garoto pensou, num primeiro momento: "Fui pego baixando música... Mas, espera. Eu estou pagando por ela..." Tudo explicado, Alex ouviu que ganhou da Apple um iMac, dez iPods e US$ 10 mil em download de músicas. O Coldplay mostrou mais uma vez sua vocação em fazer o bem.

* A mais recente edição da revista "Rolling Stone" traz uma reportagem sobre o show dos Stones no Brasil. Destaca duas coisas: o recorde de público em uma apresentação da banda, o 1.2 milhão que foi à praia de Copacabana em fevereiro, e o fato de que várias garotas foram ao show usanto camisetas que diziam "Mick Jagger - Put a Baby in Me" (Faça um filho em mim).

* Um dos vídeos mais requisitados na MTV americana é o da música "Youth", cantada por um tipo "diferente" que atende pelo nome de Matisyahu. O inusitado é que Matisyahu é um judeu ortodoxo nova-iorquino que canta... reggae e hip hop. O som é uma delícia. E Matisyahu, cujo nome de batismo é Matthew Miller, usa com muito balanço o canal de TV mais pop do planeta para fazer sua pregação político-religiosa atual, tal qual Bob Marley fazia para seus lados, nos anos 70 (não na MTV, óbvio). Matisyahu se apresenta de chapéu e capa preta, camisa branca, tem uma barba bem grande e um par de tranças. Seu disco de estréia é "Shake off the dust... Arise", de 2004. Fala-se no South by Southwest que um dos inúmeros shows-surpresa do festival pode ser o de Matisyahu.

* Por onde quer que você olhe tem uma referência ao filme "V for Vendetta" ("V de Vingança"), adaptação de famosa HQ que estréia hoje nos cinemas americanos, tem uma estonteante Natalie Portman (mesmo careca) no elenco, é escrito pelos irmãos Wachowskis, é mais divertido que "Matrix" e está sendo chamado de o primeiro filme pró-terrorismo de Hollywood. Vou tentar ver já nesta sexta.

* PREMIAÇÃO: que beleza. Algumas lembranças texanas já vão para o sorteio agora mesmo. Emails ao lucio@uol.com.br concorrem a uma camiseta do South by Southwest 2006, um CD de novidades 2006 da gravadora Matador (Belle & Sebastian, Cat Power, Mogwai, Mission of Burma). E um par de ingressos do Campari Rock (www.camparirock.com.br), festival que conta com a curadoria desta coluna e que acontece dia 8 de abril em Atibaia, pertinho de São Paulo, com o espetacular Supergrass como maior atração.

* RESULTADOS: eu sei. A lista dos vencedores de prêmio está beeeeem atrasada. Mas aqui de longe não há chance de eu fazer o sorteio. Semana que vem eu atualizo a lista gigante. Foi mal.

* Vou nessa. Desculpa a correria, os erros e os acentos esquisitos desse teclado americano. Semana que vem, já em São Paulo, tem mais.
Lúcio Ribeiro, 41, é colunista da Folha especializado em música pop e cinema. Também é DJ, edita a revista "Capricho" e tem uma coluna na "Bizz". Escreve para a Folha Online às quartas.

E-mail: lucio@uol.com.br

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