Pensata

Magaly Prado

03/01/2004

Retrospectiva do dial AM

Hoje, coloco a retrospectiva do dial AM paulistano e abaixo respondo a mensagem do leitor Marco, lá da Escócia.

Retrospectiva AM

2003 foi o ano das reviravoltas no dial AM. Primeiro a Record voltou com tudo, em julho, a trazer novos comunicadores. Quem não se lembra, ela estava totalmente nas mãos dos evangélicos. Testou alguns que ficaram no ar por poucos meses, como o Capriotti, a Liliane Ventura, mudou aqui e ali, e hoje está com a grade de programação para tentar conquistar seu antigo público.

O destaque vai para Cacá Rosset, ator que nunca havia feito rádio e que trouxe para o horário das 17h às 18h, uma atração renovada com humor que lhe é característico. Apresentadores como Christina Rocha, acostumados com a comunicação da TV Record, experimentam nova linguagem no estilo "Cidade Alerta" por achar que ganharão audiência igual ao resultado dos números da TV. Só o tempo dirá. Eu, particularmente não gosto.

Outra mudança significativa foi a América que trocou seus comunicadores antigos por uma equipe nova, na maioria estudantes da Fundação Cásper Líbero, para trazer de volta ao dial a promessa de incluir música de qualidade e informação direto dos especialistas.

O forte da programação da América é lidar com temas como a cidadania, voluntariado, educação, ambiente e cultura. A emissora ainda não possui resultados do Ibope, já que sua alteração aconteceu em meados de setembro, e, principalmente por conta de novos programas terem entrado no ar em fins de outubro. Se tivesse mantido a programação, em fevereiro teria resultados de audiência. Porém, mudou novamente a grade agora em janeiro, então só terá noção de quais programas estão dando certo, em abril, quando sair a pesquisa relativa ao trimestre. Porém, em fevereiro, vai dar para ter ao menos uma idéia de quem está ouvindo os 1.410.

Por outro lado, comunicadores como João Ferreira, Paulo Barboza, Kaká Siqueira e Roberto Losan, foram para as rádios Record e Tupi. Nenhum deles ainda possui resultados de audiência sem herança de programações anteriores, pelo mesmo fato da América: sem tempo suficiente para aferir números únicos da programação nova.

No caso desses comunicadores, a tônica de seus programas não muda. O que muda é apenas a freqüência, já que eles fazem o mesmo tipo de programa há décadas. O formato é o mesmo: música popular, em geral, aquelas que freqüentam as paradas e tocam direto em todas as rádios, fofocas de artistas e personalidades, e ouvintes com lamentações no ar.

Nelson Rubens, que se intitula o maior fofoqueiro do país, desde que saiu da América, também em setembro, ainda não retornou ao dial paulistano.

Aliás, a fofoca no rádio obteve altos e baixos. Programas como o "Fala Sério", de Antonio Guerreiro, na Jovem Pan FM, ficou poucos meses no ar e não emplacou.

A rádio Capital continua com seus comunicadores de peso. Fortes boatos davam conta que Eli Corrêa e Paulo Lopes não assinariam com a emissora, foi só especulação maldosa da concorrência. Ambos radialistas, os mais famosos do dial, sem esquecer o Zé Bétio, estão no ar pelos 1.040 do dial AM.

Aliás, a Capital só não é primeiro lugar por causa do padre Marcelo Rossi, na Globo AM. Que permanece na liderança absoluta. O religioso traz ouvintes não somente para seu horário, mas irradiando nos demais, tanto antes como depois. O padre colabora para aumentar a audiência da Imaculada Conceição AM que está ganhando ouvintes e já figura em sétimo lugar no ranking geral.

A Bandeirantes AM esteve em 2003 firme forte com ênfase no radiojornalismo, assim como a CBN, que não deixou por menos, abocanhando os principais prêmios dirigidos aos radialistas. Heródoto Barbeiro, na CBN, e Zé Paulo de Andrade, na Bandeirantes, levaram para casa mais um troféu de desempenho para a coleção deles.

A novidade foi Maria Lydia que saiu da CBN e foi para a Bandeirantes participar do jornal "Gente", todas as manhãs.

Algumas emissoras resolveram este ano replicar seus noticiários do AM no FM, como já fazia a CBN. Caso da Jovem Pan e da Eldorado. Por um lado, ouvintes do FM ganham jornalismo de qualidade, por outro lado, retira do mercado de trabalho profissionais das FMs.

TRIBUNA DO LEITOR-OUVINTE

Cara Magaly Prado.
Saudações.

Hoje li sua coluna de 27/12 sobre as FMs no ano de 2003 e chamou-me a atenção a forma como você colocou a questão acerca da qualidade da programação...

...Não consigo imaginar como melhorar a qualidade da programação de forma vertical, com alguém decidindo o que será ouvido e por quem. Ao que me consta o que acontece hoje é exatamente isso. As emissoras de rádio (tanto no Brasil quanto fora - posso citar o caso das rádios na Escócia, com exceção da BBC) se atém apenas à famosa playlist, aquilo que as gravadoras determinam que seja tocado (não vou entrar no mérito da questão, mas o jabá é uma realidade), talvez o grande problema não é uma questão de gosto musical, mas sim de liberdade para que as músicas pedidas sejam executadas pelos programadores. Sei que se pode argumentar que a população em geral irá escolher as músicas que estão tocando no momento, mas posso afirmar, por experiência própria que, quando você pede por uma música que está fora da playlist, dificilmente você ouvirá essa canção...

... 1.ª Quem é o ouvinte comum? e, num desdobramento dessa, há um ouvinte que não seja comum? Bom, não acredito que existam ouvintes superiores e inferiores, mas sim pessoas que carregam experiências diferentes e gostos diferentes, além disso, pelo menos é aquilo que entendo quando falamos e indústria cultural, não creio que a produção cultural das grandes gravadoras (e seus diversos nichos de mercado) vislumbre tais nuances entre seus consumidores, o que ela vê são apenas
consumidores...

...Quem vai decidir sobre que programação é melhor ou pior, ou seja, como apurar o gosto do "ouvinte comum"? Bom, não sei, mas certamente se perguntarmos para 20 diferentes pessoas elas nos indicaram 20 diferentes possibilidades acerca de uma melhor programação.

Creio que não devemos ir tão longe e acreditarmos na existência de um gosto superior ao dos demais (apesar de não gostar em absoluto daquilo que se ouve nas rádios brasileiras, ou aqui nas rádios comerciais britânicas), nessa crença iluminista de uma Razão superior e universal, mas sim, e para mim essa é a questão, devemos pensar numa forma de democratizar as rádios e não numa forma de criar um novo "padrão de programação", cujas decisões serão tomadas, novamente, por apenas algumas pessoas. eis aqui o verdadeiro desafio de toda a nossa sociedade (e talvez de todo o mundo, a busca de uma forma verdadeiramente democrática de
organizarmos a nossa sociedade).

Por fim, apenas um comentário. Quando cheguei ao Reino pensei que fosse encontrar uma programação voltada principalmente para a produção britânica, mas, para a minha surpresa, o que você ouve aqui, majoritariamente, é música dos Estados Unidos. Algo o Brasil tem que o torna diferente da maior parte das nações no Ocidente, nossa indústria cultural é, ao menos no que diz respeito à música, majoritariamente dominada por artista nacionais.

Bom, é isso aí. espero que tenha tempo para ler isso aqui. Um abraço gelado dos Lothians.
Marco, Edinburgo, Escócia.

Resposta. Olá Marco. Vou tentar lhe responder. Não acho também que deva ser uma só pessoa ditando uma programação musical. Imagino que uma equipe de programadores deva discutir e repensar a programação atual,e depois experimentar algo que possa ir criando gosto nos ouvintes aos poucos, para que ele vá se acostumando com as boas músicas. Vamos dar um exemplo: Ed Motta é bom, porem, a música "de trabalho" atual é "Espaço na Van". Não agüento mais ouvir a mesma música nas rádios que tocam MPB. Claro, que é a imposição da gravadora, muitos radialistas recebem o CD apenas com essa faixa. Poderia ser feito de outro jeito: colocar outras músicas do próprio Ed Motta para tocar. Assim, abre a cabeça do ouvinte. Não é difícil, pois não estou sugerindo as mais obscuras, não. Apenas outra canção que seja boa. Não é preciso ser comercial total.

Quando você fala de playlist determinado pelas gravadoras, concordo com você. Estamos carecas em saber da existência do jabá. Sua sugestão de atender os ouvintes é o sonho de qualquer radialista que não se vende.

Esta semana mesmo, estava eu conversando com o padre Manuel Quinta, da rádio América, e ponderamos sobre isso. O ideal é atender o ouvinte com seu pedido musical. E enquanto ele ouve a música para ele, na seqüência, ele pode ouvir uma outra que apresentamos a ele. Ouvintes da América, até meses atrás com audiência totalmente popular, e hoje em dia, mudando seu público, pedem o sucessão batido, muitas vezes são músicas com letras exdrúxulas, apelativas, com qualidade musical duvidosa. É esta música que eu execro. Não é ir contra a música popular, só porque é popular. Não acho legal as emissoras programarem músicas ruins.

Quando falo do ouvinte comum, me refiro ao ouvinte de rádio, e não ao ouvinte de rádio segmentada, pois existem muitos ouvintes que só ouvem rock ou só rap, ou ouvintes que só ouvem jornalismo no rádio. Não é uma questão de ouvintes superiores ou inferiores como você citou, não penso nisso. Penso que a maioria dos ouvintes precisa ouvir a música boa que está sendo produzida e não o hit que martela o dia todo nas rádios comprometidas com gravadoras. E assim, poderemos contribuir para apurar o gosto do ouvinte, sim. Algumas poucas rádios têm essa preocupação. Está certo que não estão com o faturamento no azul, mas colaboram para a cultura musical decente. Não se trata de "gosto superior", apenas melhorar o nível da programação trazendo bons produtos musicais, que existem e não são divulgados.

Enfim, Marco, não é fácil, existe uma máfia enorme comandando o veículo. Você mesmo constatou aí no Reino, que nem as músicas britânicas possuem espaço maior ou ao menos equivalente às músicas estrangeiras, principalmente a americana, não é mesmo? Difícil, mas com as gravadoras perdendo terreno para a pirataria e para o acesso das músicas pela internet, as coisas podem melhorar no futuro. De repente, as rádios vão precisar buscar dinheiro em outros mercados. Eu só acho que as pessoas poderiam ouvir música boa no rádio. E vou continuar sonhando com isso.

Até semana que vem! Beijos sonoros! Magaly Prado
Magaly Prado é jornalista e radiomaker. Escreve para a Folha Online aos sábados

E-mail: magalyprado@uol.com.br

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