Pensata

Marcio Aith

26/02/2001

A brizolização de ACM

Abro o "Globo" na Internet e vejo uma charge de ACM como uma vaca louca vestindo camisa-de-força. Imediatamente me veio à cabeça uma frase lapidar de Leonel Brizola, outro personagem da política brasileira tratado como louco pelas empresas do dr. Roberto Marinho: "se a Globo está a favor, coisa boa não é; se está contra, é porque tem alguma coisa de interessante em quem ela está batendo".

Caros, está muito difícil entender, aqui de Washington, como é que os meios de comunicação (não só as Organizações Globo, registro) "brizolaram" o ACM, transformando-o num louco senil.

Minha incapacidade vem da seguinte lógica: será que somente agora perceberam aspectos malucos no malvadeza? É possível que alguém não tenha reparado antes seus sinais de desequilíbrio? Nunca pareceram estranhas aos observadores políticos de Brasília as ameaças feitas por ACM a jornalistas e adversários nas últimas décadas, a quem xingava, babando, de ladrões e de homossexuais?

Francamente, tem algo de muito podre no tratamento que estão dando a ele agora, e me vejo, depois de anos irritado com seus métodos ditatoriais e coronelistas, na ingrata posição de atacar seus críticos. Ou neocríticos, já que muitos o achavam lindo e quase deliravam ao ouvir, das assistentes de redação, o chamado mágico: "fulano, é o senador (ou governador) Antonio Carlos retornando sua ligação".

Francamente, ACM sempre pareceu louco e inconsequente. A única diferença é que, agora, ele perdeu poder. E poder é fogo: transforma alucinado em ativo, burro em simples, ladrão em empresário bem-sucedido e covarde em pragmático. Já a decadência faz o contrário.

Desprotegido, ACM deixa de ser uma pessoa interessante sob o ponto de vista do puxa-saquismo jornalístico e político. É mais útil execrá-lo, para agradar o grupo que parece ter se fortalecido com a aparente queda do gigante baiano.

Não quero culpar Chico Caruso pela charge. Vai ver ele já fez outras tantas de ACM louco, só que nunca foram publicadas porque, na época, a amizade do político baiano com os Marinho as tornava inviáveis.

Também não se trata de uma discussão filosófica ou "ranheta". É concreta, prática e útil.

Vamos imaginar que uma das acusações recentes de ACM seja apenas uma dica, talvez uma ótica dica, para o início de um trabalho jornalístico bem feito.

Vocês acham que algum dos que hoje o chamam de louco vão ter ânimo para investigá-la? O que quero dizer é que, em vez de atacar ACM, xingando-o de "louco que acusa sem provas", talvez seja melhor trabalhar um pouco e verificar se as provas fazem sentido.

Nunca é pouco lembrar das acusações, também sem provas, de Pedro Collor contra o irmão. Ou das acusações daquele maluco do orçamento que havia mandado matar sua mulher a picaretadas. Por que levamos a sério aquelas acusações? Talvez porque, covardes na alma, percebíamos que, de alguma maneira, os alvos daquelas acusações eram frágeis ou, apesar do poder que tinham, acumulavam inimigos ainda mais fortes.
Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

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