Pensata

Marcio Aith

11/02/2002

Quem vai querer comprar banana?

Na quinta-feira, dia 8 de fevereiro, o presidente norte-americano, George Walker Bush, fez um discurso importante a agricultores do Estado de Utah. Suas palavras não deixam dúvidas de que os EUA, depois de namorar a retórica da liberalização comercial, nem mais fingem disposição para abrir seus mercados a produtos agrícolas estrangeiros. O discurso de Bush escancarou o grau de hipocrisia por trás da nova rodada mundial de liberalização comercial.

Vamos às palavras presidenciais:

"Essa nação tem que se alimentar. É da nossa segurança nacional que possamos alimentar com produção própria. Graças à Deus não dependemos da carne de outros (países) para garantir a saúde e a alimentação do nosso povo."

Em outro momento, ao transpor seu pensamento para fora das fronteiras norte-americanas, Bush disse: "Queremos a população da China comendo bife norte-americano. Queremos abrir mercados em lugares como a Europa para a carne saudável dos EUA."

Não é preciso muita lógica para deduzir a mensagem do presidente. Para Bush, agricultura é assunto de segurança nacional nos EUA. Portanto, a Casa Branca tem o direito e o dever de manter subsídios a seus produtores. Também tem o mesmo direito/dever de afastar a competição estrangeira com processos antidumping (como o fajuto que atinge o aço brasileiro) e questões fitosanitárias (como as que impedem o Brasil de exportar carne fresca aos EUA).

No entanto, segundo a mesma lógica do presidente norte-americano, países como a China e os europeus não podem justificar sua proteção com o mesmo argumento. Só nos EUA auto-suficiência agrícola seria questão de segurança nacional.

O problema de tal discurso (além dos óbvios) é que ele contradiz o pregado pela Casa Branca nos fóruns multilaterais e em seu diálogo com países em desenvolvimento.

O mesmo Bush, por intermédio do Banco Mundial, quer convencer o Brasil a concentrar seus esforços às áreas em que temos vantagem comparativa, como na produção agrícola.

Um relatório antológico (pela hipocrisia e por pitadas neocoloniais) do Banco Mundial chegou a sugerir ao Brasil que desista de exportar aviões (que são comprados nos EUA) e se dedique à produção agrícola.

Ótimo. Mas quem vai querer comprar banana?



Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

Leia as colunas anteriores

//-->

FolhaShop

Digite produto
ou marca