Pensata

Marcio Aith

25/02/2002

EUA: Mais poder aos donos da mídia

Aos que se preocupam com o processo veloz de concentração da mídia norte-americana, preparem-se.

Uma corte federal em Washington anulou, na semana passada, dois limites legais, vigentes há duas décadas, que inibiam uma nova (e talvez derradeira) onda de fusões e de aquisições no setor de telecomunicações.

Um desses limites proibia que uma mesma companhia controlasse uma estação de televisão e uma empresa de TV a cabo dentro de uma mesma região ou mercado.

Outro limite jogado no lixo impedia que uma única companhia de controlasse estações de TV com alcance em mais de 35% dos lares norte-americanos.

A decisão pode ser definitiva porque o governo não mostra disposição de recorrer à Suprema Corte.

O processo judicial durava anos. Havia sido movido pela Fox Television (que pertence à News Corp., do empresário australiano-americano Rupert Murdoch), pelas redes de TV aberta NBC (uma das empresas da General Eletric) e CBS (controlada pela Viacom Inc.) e pela Time Warner Entertainment (da AOL-Time Warner).

Essas empresas haviam processado a FCC (Federal Communications Commission), uma agência federal sob controle da Casa Branca, com o objetivo de anular o que sobrara da regulamentação no setor. Outras decisões judiciais podem vir em breve.

Além de beneficiarem-se da decisão com a criação de novas oportunidades de negócios, a Viacom e a News Corp conseguiram, com ela, legalizar retroativamente o fato de já terem acesso a mais de 35% dos lares norte-americanos. Conseguiram isso quando compraram, respectivamente, a CBS e a Chris-Craft Industries.

Já a empresa Time Warner (na verdade, AOL-Time Warner) teria obtido uma vitória particular. Ela pertence ao único dos grandes grupos de comunicação que ainda não detém uma empresa de TV aberta. Essa decisão pode abrir as portas para a compra da NBC ou da ABC (que está nas mãos da Disney).

A briga dessas empresas começara na era do presidente Bill Clinton e só fazia sentido enquanto o governo queria brigar.

Agora, sob o comando republicano de Michael Powell, filho do secretário de Estado dos EUA, Colin Powell, a FCC jogou a toalha.

Usando o mesmo princípio liberal com o qual seu chefe (o presidente George W. Bush) preferiu não intervir na crise da Argentina e retirou-se do processo de paz no Oriente Médio, Powell diz que, na era da tecnologia da informação, esses limites já não protegem o interesse da população nem criam alternativas para os consumidores.

Powell (não confundam, estamos falando do filho do homem) acha que a melhor política é não intervir e deixar o mercado equilibrar-se.

É bem possível que esse equilíbrio seja atingido, mas os poucos críticos norte-americanos que sobraram (ou que conseguem ser ouvidos) questionam seu preço.

Nos EUA, já é quase impossível ler, numa revista, uma crítica positiva sobre um filme sem que a companhia controladora da publicação não seja a mesma dona do estúdio cinematográfico.

Falta pouco para uma mesma empresa deter simultaneamente, num mesmo mercado: o principal jornal, a maior rede de TV aberta, a maior rede de TV a cabo, a empresa de telefonia local e a provedora de Internet.

A mídia nos EUA é tão controlada que, quando o presidente George W. Bush apelou às redes de TV que não divulgassem imagens de vídeos do terrorista Osama bin Laden, bastaram cinco telefonemas.

Sei que parece contra-senso preocupar-se com a mídia norte-americana quando a brasileira está longe de ser livre e diversa. No entanto, como sempre herdamos tendências e sofremos "aftershocks" de fusões nos EUA, vale a pena ficar de olho.
Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

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