Pensata

Marcio Aith

01/04/2002

A ONU desfila sua inutilidade

O Conselho de Segurança da ONU aprovou por unanimidade no sábado uma resolução exortando Israel a retirar suas tropas das cidades palestinas. Os EUA, surpreendentemente, votaram a favor. Jornais em todo o mundo destacaram o fato nas manchetes.

Para as novas gerações, cuja referência bélica mais marcante antes do conflito no Afeganistão fora a Guerra do Golfo, em 1991, ordens do conselho de segurança da ONU devem ser seguidas, sob pena de ataques de aviões invisíveis e armas inteligentes. No entanto, passados dois dias, o primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, nem deu-se ao luxo de responder às Nações Unidas.

Intrigado, um repórter da "Israel Army Radio" decidiu fazer a pergunta óbvia ao embaixador israelense nas Nações Unidas, Yehuda Lancry: "o que Israel pretende fazer com relação à decisão da ONU"? Resposta histórica do embaixador: nada. Ao explicar-se, Yehuda nos deu uma aula de Direito Internacional Público contemporâneo.

Segundo ele, embora o governo norte-americano tenha votado a favor da resolução, os EUA sugeriram privadamente ao governo israelense que a ignorasse, já que seu texto fora propositadamente redigido sem prazo nem sanções. "Todos sabem disso (da inexistência de sanções ou prazo), inclusive os norte-americanos", disse Yehuda. Pela resposta do embaixador israelense percebe-se uma distinção entre decisões unânimes do conselho de segurança da ONU. Algumas devem ser cumpridas. Outras, não.

Ao buscarmos o que diferencia uma da outra, encontramos apenas um único fator: a vontade da Casa Branca. A eficácia de uma decisão unânime do conselho de segurança da ONU depende única e exclusivamente do interesse norte-americano em que ela tenha eficácia. Por que, então, os EUA votaram a favor da resolução se, no fundo, são contra sua eficácia?

Porque sua existência inútil serve aos interesses dos EUA ao aplacar a ira dos países árabes e da União Européia, sugerindo a existência do que já não existe mais: o multilateralismo. Os desdobramentos dos atentados de 11 de setembro estão mudando o mundo mais rápido do que nossas mentes conseguem compreender. O que podemos sentir é que caminhamos para o lugar errado. Errado e perigoso.

Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

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