Pensata

Marcio Aith

19/03/2001

Cáio Fábio, Saddam Hussein e Osama bin Laden

Fico imaginando a cena: escondido nas montanhas do Afeganistão, o milionário saudita Osama bin Laden, a maior ameaça terrorista aos EUA, recebe em seu walkie-talkie um chamado de Sadam Hussen, a segunda maior ameaça à Casa Branca:

- "Osama, aqui fala Sada!"

- "Como vai, velho bigodudo! O que manda?"

Do outro da linha, o pai de todas as guerras repassa ao amigo uma fantástica proposta.

- "Vou bem, querido. O negócio é o seguinte: acabou de me ligar o embaixador iraquiano no Brasil. Ele recebeu uma proposta de uma espécie de padre, bispo ou pastor -na verdade não entendi direito, mas parece que o cara se diz próximo de Deus. O nome do sujeito é Cáio Fábio e ele quer nos vender, por US$ 1 milhão, um dossiê que mudará o resultado das eleições brasileiras. A divulgação do dossiê, que chamam de dossiê Caribe ou dossiê Cayman, provocará a derrota do presidente neoliberal brasileiro nas próximas eleições e a vitória de um socialista anti-EUA e pró-Nós. O que você acha? Tem interesse?"

- "Escuta aqui, Sada, diz pra esse padre que podemos ser extremistas mas não somos burros. Essa história tá estranha. O que tem nesse dossiê pra custar tanto?", pergunta o saudita.

- "Parece que dados sobre contas do presidente entreguista em paraísos fiscais."

- "Pois então diz pra esse padre que, se ele quer tanto a derrota do neoliberal, basta divulgar o dossiê. Esse bispo-padre não precisa de nosso dinheiro para atingir seu objetivo.

Para os que não entenderam o diálogo, esclareço que ele mescla fantasia com (pasmem) um fato real. Na semana passada, o "Jornal do Brasil" publicou a informação de que o pastor presbiteriano Caio Fábio Santos D'Araujo tentou vender o famigerado dossiê Caribe para diplomatas iraquianos. Cáio Fábio é aquele que ficou conhecido por promover obras assistenciais no Rio antes de tornar-se um ícone da malandragem religiosa-empresarial brasileira.

Se confirmada a história do JB -e, em se tratando de Caio Fábio, não há por que não ser verdade-, o pastor adiciona outra história a seu já fantástico currículo religioso.

O pastor-bispo-padre é o exemplo vivo da pilantragem que caracteriza setores religiosos no Brasil. Em 1998, quando foi flagrado tentando vender o dossiê Caribe para políticos, disse que tratava-se de um favor que fazia para um "amigo de fé" que precisava de dinheiro para sobreviver e fazia a denúncia para purificar a política brasileira.

Mais tarde, quando descobrimos que o principal suspeito de ter fabricado o dossiê -o empresário Oscar de Barros- já era rico o suficiente e, entre outras atividades, desenvolvia negócios com o pastor para criar uma TV da pilantragem religiosa, Cáio Fábio sumiu de cena e calou-se. Mais tarde, Barros, milionário, foi condenado por tentar lavar dinheiro do narcotráfico.

Recentemente, o FBI descobriu mais coisas. Foi ele, o pastor-bispo, quem levou a empresa MetroRED, pertencente ao grupo norte-americano Fidelity, ao escritório de Oscar de Barros em Miami. Deste contato surgiu um dos maiores escândalos de corrupção-confessa do mundo corporativo, envolvendo funcionários da prefeitura de São Paulo. Caio Fábio ganhou US$ 100 mil, pagos a ele por Barros por meio de uma empresa nas Bahamas. O dinheiro foi depositado numa conta do pastor nos EUA. Isso é que é amigo de fé...

Qualquer dia destes quero me sentar à frente de Cáio Fábio e bater um papo descontraído, conversar com ele sobre assuntos variados e me instruir. Será que o pastor sofre de arrependimento? Tem remorso? Acredita em Deus? Tem amigos de verdade (fora os de fé)? Será que ele foi sequestrado e algum estelionatário lhe roubou a identidade? Vou esperar que me telefone. Ou que mande uma mensagem.
Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

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