Pensata

Marcio Aith

16/04/2001

E como fica a questão da mão-de-obra na Alca?

"Será que um dia alguém vai questionar a inclusão da livre circulação de mão de obra nas negociações da Alca?"

O tema desta coluna não foi idéia minha, mas de leitores enraivecidos com jornalistas que escrevem sobre a Alca (a eventual Área de Livre Comércio das Américas) sem tratar do aspecto que lhes interessa mais diretamente.

Nos últimos sete dias, recebi doze mensagens de pessoas que, com abordagens distintas, queriam saber por que a imprensa não debate a possibilidade de os trabalhadores do hemisfério cruzarem legalmente as fronteiras dos 34 países que negociam a Alca em busca de empregos melhores.

Dos que me escreveram, os mais informados disseram saber que o assunto não está sendo debatido nas negociações formais que começaram em 1994. No entanto, viram na omissão dos meios de comunicação uma falta de visão crítica. Haveria, na opinião deles, um elefante no meio da sala e todos estariam fingindo que não o vêem.

Os menos informados (a maioria) queriam simplesmente saber se, com a Alca, seria permitido a eles mudar-se de país e trabalhar, legalmente, nos EUA ou no Canadá.

É constrangedor reconhecer, mas os leitores têm razão. A cobertura jornalística sobre a Alca tratou do assunto somente sob o ponto de vista dos governos que a negociam, e não de suas populações.

Escrevemos sobre prazo, regras de origem, acesso a mercados, mas não soubemos informar os leitores.

É óbvio que não foi a possibilidade da livre circulação de mão de obra que levou os 34 países do hemisfério (excluindo Cuba) a lançarem a Alca em Miami em 1994. O único objetivo de 33 dos 34 governos foi conquistar o mercado norte-americano. E o objetivo dos EUA, o de aprofundar sua participação nas economias dos outros 33 países.

Também seria infantil imaginar que os EUA , depois de resistirem à bala a invasão de seu mercado por mão de obra mexicana (mesmo depois do Nafta), abririam suas fronteiras, de mão beijada, para brasileiros, nicaraguenses, bolivianos e outros americanos.

Mas nem por isso deveríamos deixar de tocar no assunto e de apontar contradições e hipocrisias do processo de integração hemisférica.

Nao se trata de um tema utópico. A União Européia resolveu sua integração de maneira mais humana, menos tarifária. Trabalhadores portugueses podem mudar-se para a França. E vice-versa. Trata-se de uma comparação a ser registrada e exibida às autoridades.

É importante deixar claro que não se trata de reconhecer a legitimidade das manifestações anti-Alca - principalmente porque os sindicatos que as promovem são contrários à importação de mão de obra.

Trata-se apenas de perceber a existência de um déficit de informação e a elitização do debate.

Em algum ponto depois do ano 2005, o hemisfério todo, do Alaska à Terra do Fogo, estará ligado pela maior zona de livre comércio do mundo, com um mercado de mais de 745 milhões de pessoas. Nem todos são empresários, autoridades ou jornalistas.
Marcio Aith é correspondente da Folha em Washington. Escreve para a Folha Online às segundas

E-mail: maith@uol.com.br

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