Pensata

Vaguinaldo Marinheiro

27/04/2003

O perigo de "prever" o futuro, o Iraque e Bush

O Ministério da Cultura adverte: este texto pode se mostrar equivocado com o passar dos dias.

Todo artigo ou reportagem que contém alguma análise ou projeção de futuro deveria ter essa advertência. Diante da imponderabilidade da história e de componentes ilógicos que rondam muitas das ações humanas, projetar quais serão as conseqüências de determinados fatos é como apostar na roleta de um cassino.

Mesmo assim, o ser humano tem esse vício, de querer antever o futuro. Por isso se avolumam os textos analíticos sobre o pós-guerra no Iraque e no mundo. E muitos analistas vão quebrar a cara, principalmente os que permitem que as ideologias guiem seus raciocínios.

Quando as TVs mostraram bagdalis em festa ao ver os americanos derrubarem a estátua de Saddam Hussein no centro de Bagdá, muitos, "à direita", saíram a escrever que enfim os iraquianos estavam mostrando gratidão às forças que estavam lá para "libertá-los".

Dias depois começaram os protestos contra a ocupação anglo-americana. Na sequência, líderes religiosos reapareceram e cresceram as manifestações por um Estado islâmico.

Foi a hora dos "à esquerda" escreverem que a guerra havia sido ganha, mas que o Iraque continuaria a ser um pesadelo para os EUA.

Mas o que será do Iraque? Vai se transformar numa democracia, como propagandeia a Casa Branca? Virará apenas um protetorado norte-americano? Seguirá o caminho do Irã, rumo a um Estado dominado pelos aiatolás? Façam suas apostas.

Aquele país ficou fechado tempo demais, durante as mais de duas décadas da ditadura Saddam Hussein. As demandas do povo, principalmente da maioria xiita, foram reprimidas por um período muito longo. Tudo isso dificulta ainda mais os exercícios de futurologia.

No outro lado, nos EUA, a imprevisibilidade também se mostra presente quanto ao futuro de um homem, George W. Bush.

Ele já está de olho na eleição do ano que vem e sua luta contra o terrorismo vai ser usada como arma de campanha. Na semana passada, o partido Republicano resolveu adiar sua convenção para que coincida com as solenidades em lembrança dos atentados de 11 de setembro. A convenção será também em Nova York.

Mas, se a luta contra o terror parece ajudar Bush, a economia pode derrubá-lo. Ou indicadores como desemprego, atividade industrial, crescimento do PIB etc. melhoram ou o povo americano vai sentir saudades de Bill Clinton.

As opções para Bush parecem ser duas, e em qualquer uma delas ele vai repetir um presidente também republicano. Na pior opção, para ele, repete o pai: sai vitorioso de uma guerra no Iraque, mas amarga uma recessão interna e perde a eleição para um democrata.

Na melhor (para ele, não necessariamente para o mundo), repete Ronald Reagan. E aí as semelhanças serão ainda maiores. Como o ator norte-americano que governou os EUA de 1981 a 1988, Bush era desacreditado intelectualmente quando assumiu a presidência. Como Reagan, colocou o país numa luta (contra o comunismo um, contra o terrorismo, outro). Ambos representam o pensamento mais conservador norte-americano. Ambos mostravam interesses por intervenções militares no exterior.

Ao olhar para o passado, Reagan tentou a reeleição e venceu. Quando deixou o governo no final do seu segundo mandado, a Guerra Fria havia acabado, o comunismo estava com os dias contados e o mundo logo seria redesenhado.

Bush afirma querer acabar com o terrorismo e redesenhar o mundo? Vai conseguir? Façam as suas apostas.
Vaguinaldo Marinheiro é secretário-assistente de Redação da Folha de S.Paulo. Escreve para a Folha Online aos domingos

E-mail: vaguinaldo.marinheiro@folha.com.br

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