Pensata

Vaguinaldo Marinheiro

31/03/2002

A crítica é uma espécie em risco de extinção

Quando George W. Bush disse no ano passado que quem não estava com os Estados Unidos estava contra os Estados Unidos ele buscava aliados na luta contra o terror, mas acabou sintetizando e explicitando o que antes só era defendido por ditadores. A partir de então, o dogmatismo não assumido passou a ser usado às claras também por "defensores da democracia".

Os exemplos não faltam, todos os que criticaram qualquer ação dos EUA foram acusados de apoiadores do terrorismo. Agora, quando um escritor como o português José Saramago critica a política de Ariel Sharon é chamado de anti-sionista e de anti-semita.

No Brasil também não são poucos os casos. As raras vozes que ousaram duvidar da eficácia e do método aplicado pela Polícia Militar de São Paulo na ação que resultou na morte de 12 criminosos ligados ao PCC na rodovia Castelinho foram imediatamente rotuladas de apoiadoras dos bandidos.

Uma crítica à maneira usada pela CUT para se manifestar contra mudanças na CLT (bloqueios de vias importantes), como a feita nesta coluna na semana passada, foi interpretada por alguns como sendo um apoio à "direita" e um desrespeito à classe trabalhadora.

Na disputa eleitoral então a "patrulha ideológica" é ainda mais ferrenha. Um comentário objetivo sobre Lula é logo entendido como "serrista" por petistas, como "roseanista" por "serristas" e como "lulista" por "roseanistas". A mesma equação vale qualquer que seja o sentido da ciranda.

O que se perde com tudo isso, com essa caça às bruxas da crítica? A possibilidade de crescimento e de aperfeiçoamento das idéias. Pois é a convivência com a crítica que faz pessoas, governos ou associações repensarem seus métodos, sua maneira de agir e até de pensar. É essa mesma crítica, a não-aceitação das coisas como elas são, que gera o desenvolvimento.

Mas o sectarismo ganha mais e mais terreno. Ao colocar tarjas pejorativas em qualquer voz dissonante (seja de apólogo do terrorismo ou de criminosos comuns, seja de anti-semita ou de simples partidário desse ou de outro candidato), evita-se o diálogo e inibe-se a crítica.

No que resultará isso? Na estagnação ou na ditadura do discurso único.
Vaguinaldo Marinheiro é secretário-assistente de Redação da Folha de S.Paulo. Escreve para a Folha Online aos domingos

E-mail: vaguinaldo.marinheiro@folha.com.br

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