Pensata

Vaguinaldo Marinheiro

04/08/2002

Pobre FHC, para ele o mundo enlouqueceu antes do tempo

Há alguns meses, a maioria apostava num final mais glorioso. No dia 1º de janeiro, Fernando Henrique Cardoso, o primeiro presidente democraticamente eleito a terminar o mandato desde Juscelino, entregaria o cargo como o homem que domou a inflação e estabilizou a moeda.

Se o próximo presidente fizesse um mau governo, isso só reforçaria o saudosismo e de novo veríamos circular os adesivos "eu era feliz e não sabia". Se o eleito fosse bem-sucedido, ainda sobraria para FHC o crédito de ter deixado a casa em ordem.

O problema é que esses últimos cinco meses de governo entraram de vez no campo da imprevisibilidade e se mostram pouco favoráveis ao presidente.

Se por um lado parece 100% improvável o que se chamou de "alfonsinização" de FHC (numa alusão ao presidente argentino Raúl Alfonsín, que diante de uma séria crise de governabilidade em 89 teve que entregar o poder ao sucessor seis meses antes do término de seu mandato), por outro a manutenção dos trunfos do presidente também é incerta.

Estará até lá estabilizada a moeda, se o dólar chegou a subir 23% num único mês (julho)? Se num dia a moeda bate nos R$ 3,61, para dois dias depois fechar nos R$ 3,01?

A inflação não está na casa dos 80% ao mês, como no final do governo José Sarney, mas deverá ser pressionada por esse mesmo dólar e fechará o ano bem acima da previsão inicial do próprio governo.

Fernando Henrique atribui esse descontrole a todos, menos a seu governo. Na semana passada, esbravejou que o Brasil fez tudo certo, que na verdade é o mundo que enlouqueceu. "O Brasil já apertou tanto as contas que já não sabe mais onde apertar para se ajustar a um mundo que enlouqueceu", disse num encontro na quinta-feira.

Quando não culpa a loucura do mundo, critica os candidatos de oposição, que estariam assustando o mercado com discursos ambíguos sobre futuras medidas econômicas.

Faz algum sentido o que ele diz, mas onde está a parcela de culpa do próprio FHC e de sua equipe econômica? Não é responsabilidade desse governo o fato de estarmos tão expostos às loucuras do mundo ou ao nervosismo do mercado?

Só falta agora FHC lamentar não ter tido a mesma sorte de um outro presidente que ficou oito anos no poder, o norte-americano Bill Clinton, que saiu do governo com invejáveis números na economia.

A loucura do mundo (ou seja, a descoberta de fraudes em balanços, a perda de confiabilidade dos investidores e todos os processos recessivos) só foi dar as caras para seu sucessor, George W. Bush.

Para FHC, a "loucura" chegou antes do previsto.
Vaguinaldo Marinheiro é secretário-assistente de Redação da Folha de S.Paulo. Escreve para a Folha Online aos domingos

E-mail: vaguinaldo.marinheiro@folha.com.br

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