Pensata

Vaguinaldo Marinheiro

18/08/2002

Bonzinho, destemperado e professor iniciam horário eleitoral para lapidar estereótipo

A corrida eleitoral chega enfim a sua fase decisiva. Com o início do horário eleitoral na rádio e na TV, na terça-feira, não vai dar mais para fazer de conta que o jogo não começou, que até aqui tudo era apenas treino, como insiste o candidato tucano para explicar seu desempenho nas pesquisas.

Muitos já definiram o voto, mas há uma parcela enorme de brasileiros em busca de mais informações sobre os candidatos e suas propostas para de fato tomar a decisão.

Um exemplo disso foi o interesse de internautas pelas sabatinas realizadas pela Folha de S.Paulo na última semana com os quatro principais presidenciáveis. A audiência do canal eleições da Folha Online teve um salto de audiência com a cobertura do evento. No dia em que Ciro Gomes foi sabatinado, os acessos às páginas com notícias sobre eleições subiram 680%, se comparados com a semana anterior. E a matéria mais lida foi justamente a íntegra da sabatina com o candidato.

Isso mostra que o eleitor está buscando informações diretas dos candidatos para fazer uma escolha ou para ratificá-la, daí a importância do horário eleitoral, quando eles terão a chance de falar diretamente ao eleitor.

O programa eleitoral começa com ótimos números para Lula (isolado na primeira colocação, com 37% das intenções de voto, segundo o Datafolha), razoáveis para Ciro (27%) e ruins para José Serra (que aparece com 13%). Mas é bom lembrar que o tucano terá mais tempo na TV que os outros dois juntos.

Os três, e também Garotinho, chegam à essa fase com estereótipos bem definidos e divergentes. Lula é agora o bonzinho que chora de emoção e que não mais esbraveja. Ciro é o destemperado, mas que aparece bem no vídeo. Serra é o professor, que explica tudo, mas que causa sono nos alunos-eleitores. Garotinho é o populista evangélico.

A tarefa dos marqueteiros é tirar desses estereótipos o que há de bom e eliminar o efeito negativo.

Então, para Lula vale enfatizar que ele não é mais o bicho-papão. Que não irá fazer a revolução temida pela classe média e pelas elites. Que não vai colocar sem-teto para morar no quarto vazio de sua casa. Que na verdade é um pai de família, um trabalhador esforçado. Alguém que irá pensar na maioria da população na hora de tomar decisões.

Para Ciro, o desafio dos marqueteiros é deixar claro que ele é enérgico, não destemperado. Que será duro com aqueles que merecem, não com qualquer um que lhe faça uma pergunta, seja eleitor ou jornalista. Que enfim não é mais um Collor de Mello.

Aos marqueteiros de Serra resta a missão de convencer os eleitores que o tucano não passaria os quatro anos de mandato tentando explicar, com toneladas de números e porcentagens, qual o problema e qual seria a solução, em vez de tomar atitudes para resolver esse problema. Porque é isso que muitos vêem no candidato. Aquele que explica, explica, explica, e só.

A vida parece mais fácil para Garotinho. A não ser que essa eleição apresente mais uma reviravolta mirabolante, ele já cumpriu seu papel. Estando num partido pequeno, sem alianças e sem muito dinheiro para a campanha, ele conseguiu ser conhecido fora do Rio de Janeiro e se cacifou para a próxima eleição. Então, vai aproveitar o tempo na TV para suas novas profissões de fé, tentar convencer a todos que é "popular, não populista", que é religioso, mas que não usa isso eleitoralmente.

As pesquisas a serem realizadas depois de uma semana de programa irão mostrar quem está no caminho certo. Ainda haverá tempo para corrigir rumos, mas não muito. Os estereótipos tendem a se cristalizar dia a dia. E, como diria Cassiano Ricardo, em política, como na vida, um minuto "nunca é mais, é sempre menos".

Vaguinaldo Marinheiro é secretário-assistente de Redação da Folha de S.Paulo. Escreve para a Folha Online aos domingos

E-mail: vaguinaldo.marinheiro@folha.com.br

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